SOBRE O SEMINÁRIO “SERVIÇO MILITAR: ESCOLHER UM FUTURO”
Por Miguel Machado • 18 Abr , 2019 • Categoria: 01. NOTÍCIAS, EM DESTAQUE PrintDepois do artigo que publicamos, APRESENTADO O “PLANO DE AÇÃO PARA A PROFISSIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO MILITAR”, hoje vamos abordar de modo tão sintético quanto possível o Seminário “Serviço Militar: Escolher um Futuro” do passado dia 12 de Abril e levantar algumas questões que nos parecem pertinentes. O Ministério da Defesa Nacional acredita que o sistema de serviço militar actual não está esgotado ignorando outras opções mas sim o seu aprofundamento. Apresentamos algumas das possibilidades não consideradas pela tutela política, como o recrutamento de estrangeiros e o recurso a civis.
Um seminário pouco usual
O Seminário só pelo facto de se ter realizado, aberto a todos os interessados no tema, é um facto positivo e pouco vulgar, em Portugal não há o hábito de discutir estes assuntos fora dos círculos militares, mesmo que a maior parte da assistência fossem militares e funcionários do ministério da defesa; a sessão foi bem organizada e disponibilizados os elementos de consulta necessários; a participação da universidade neste projecto é outro aspecto positivo, com pessoas muito ligadas às temáticas da Defesa Nacional e já há bastante tempo, facto que facilita muito a necessária compreensão mútua, pese embora o facto de, naturalmente, estarem condicionadas pelas orientações políticas, afinal de contas a tutela é que define os limites da sua intervenção; e por último nesta introdução ao assunto só posso elogiar aquilo a que assisti e que aqui há uns anos seria muito pouco provável de ver numa sessão deste tipo, a liberdade de opinião mostrada pelos militares presentes, quer no painel “A perspectiva dos Ramos das Forças Armadas e do EMGFA, sobre o Estudo”, quer pelas intervenções dos militares no activo na audiência, muitas das quais não foram exactamente alinhadas com as da tutela política, bem antes pelo contrário.
Não nos vamos referir neste artigo expressamente à apresentação do Ministro da Defesa Nacional porque no fundo ela é a introdução do documento divulgado no nosso outro artigo sobre o Plano de Ação para a Profissionalização do Serviço Militar; nem sobre a excelente e fundamentada apresentação do Professor Bernard Boene, que versou os “casos” da França, Reino Unido e Alemanha, os quais tendo naturalmente muito interesse para situar o problema a nível europeu, são outras realidades que só um estudo comparativo com Portugal poderia contribuir para encontrar as nossas soluções.
Teve lugar também a assinatura de um acordo de cooperação interministerial para a Profissionalização entre os ministérios da Defesa Nacional, do Emprego e da Educação, uma das medidas do Plano: “Criação de programas de reconversão e de consolidação profissional, no âmbito do Acordo de Cooperação Interministerial para as áreas de educação e formação”
Não vamos naturalmente referir tudo o que foi dito nas mais de 7 horas do Seminário, mas abordar os aspectos que os pareceram mais relevantes…e não foram poucos!
Insistir no actual modelo de Serviço Militar
Esta é desde logo a primeira observação que nos surge, não serem consideradas outras opções para aumentar os efectivos militares – todos reconhecem, mesmo o ministro da defesa nacional, que os efectivos actuais estão muito abaixo das necessidades (*) – que não seja insistir no actual modelo. Ficou claro que as medidas que irão ser tomadas não abrangem para já (ou seja, nos próximos 5 anos se esta tutela politica se mantiver) dois aspectos cruciais que são do conhecimento empírico de todos e no estudo apresentado é sem surpresa confirmada pelos dois aspectos mais valorizados pelos inquiridos:
Criar uma carreira de Praças do QP no Exército e na Força Aérea; aumentar o vencimento das Praças.
– Sobre a Criação da carreira de praças do Quadro Permanente no Exército e na Força Aérea refere-se no Plano de Ação para a Profissionalização do Serviço Militar (referido a seguir como Plano) apenas “…Apresentar estudo de viabilidade sobre a criação de um QP para a categoria de Praças… (apresentado no 2.º Semestre de 2020)” e nos debates do Seminário este aspecto foi claramente desvalorizado pela tutela;
– Sobre eventual aumento dos vencimentos para valores capazes de atrair mais Praças, no Plano apenas se refere que “…Aumentar a remuneração durante a Instrução Básica para o valor do salário mínimo nacional, em alinhamento com o sistema de remunerações das forças e serviços de segurança…” e foi mesmo dito que para as Praças se pretende “nivelar os vencimentos pelo mínimo da Função Pública ou talvez um pouco acima…”, ou seja, nada que entusiasme. Ainda neste campo foi ainda muito citada pela tutela uma realidade apresentada pelo Professor Bernard Boene (um dos oradores) para os casos do Reino Unido, França e Alemanha, segundo a qual, nestes países, o vencimento não era factor determinante para prestar serviço militar. O estudo português colocou como a segunda melhoria mais desejada no RV/RC pelos próprios, o “vencimento mais elevado”, sendo a primeira “a possibilidade de obter um vínculo permanente às Forças Armadas”.
O actual modelo como todos sabemos só muito marginalmente confere um futuro aos jovens dentro da instituição militar – os números de praças que conseguem seguir uma carreira como Sargentos ou Oficiais dos Quadros Permanentes são naturalmente mínimos. Em nossa opinião para se poder falar em Futuro nas Forças Armadas para os jovens voluntários teria que haver, como das diversas forças e serviços de segurança em Portugal, uma carreira até à idade de aposentação.
Mesmo não sendo exaustivo, em Portugal, isto acontece na Guarda Nacional Republicana (acesso com 12.º Ano de Escolaridade ou equivalente), Polícia de Segurança Pública (12.º Ano de Escolaridade ou equivalente), Polícia Marítima (9.º Ano de Escolaridade ou equivalente), Corpo de Guarda Prisional (12.º Ano de Escolaridade ou equivalente), Policia Judiciária (Licenciatura), Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (Licenciatura), Serviços de Informações da República (Licenciatura).
Ou seja, para a generalidade dos Praças que cumprem o serviço militar o seu futuro terá que ser sempre fora das Forças Armadas, optando depois da vida militar por tentar a entrada nas Forças e Serviços de Segurança ou rumar ao mercado de trabalho civil.
Por isso muitos acham, e nós também, que a designação de “profissional” ou “profissionalização” para Praças devia mesmo ser abandonada, é enganadora, na realidade eles são realmente “contratados a prazo”, ainda que possam ser – e são na generalidade das vezes – tão profissionais como os dos Quadros Permanentes mas no sentido que cumprem bem a sua missão!
Optimismo versus Prudência
O Plano foi apresentado com uma grande dose de optimismo – leia-se, pelo ministério da defesa nacional – e recebido com prudência pelos responsáveis militares das áreas do pessoal da Marinha, Exército e Força Aérea que participaram num dos painéis. E isto é desde logo curioso porque várias vezes foi repetido que “os ramos colaboraram nos trabalhos”, não sendo o resultado final apenas devido ao ministério. Ficou a sensação que parte do trabalho e/ou das conclusões não teriam sido debatidas em conjunto.
Não deixando de salientar e elogiar a importância da “radiografia” feita pelo Estudo – Militares RV/RC: Características e Percepções (a seguir apenas Estudo) – que serviu de base ao Plano, e a “sistematização de problemas” que apresenta, os três ramos fizeram questão de salientar alguns aspectos que o trabalho apresentado não considera ou considerando já estão em execução.
No caso da Marinha foi desde logo referido a sua pouca relevância para o Ramo porque os efectivos em praças RV/RC são apenas 22% do total (menos de 200 militares contratados), as restantes são QP; que o recrutamento para praças ter atingido os 99% do autorizado, por outras palavras não recrutaram mais porque a isso não foram autorizados, tinham muitos candidatos; a retenção é o seu principal problema e a reinserção na óptica da Marinha é muito diferente dos outros ramos porque para eles o principal objectivo é fazer com que as praças RC passem ao QP e não que saiam para a vida civil. Na Marinha o número de mulheres tem aumentado, são 19 % do pessoal em Contrato e 12% do total. A Marinha vê ainda o novo Regime de Contrato Especial – ainda não implementado – com muito cuidado para não colidir com as condições que actualmente estão em vigor para as Praças do QP.
No caso do Exército alertou-se para o facto dos indicadores apresentados terem sido recolhidos em 2016 (estamos em meados de 2019) tendo sido dito que nos últimos dois anos muito mudou no Exército nesta área, várias medidas foram entretanto implementadas e algumas – referidas as relativas às incorporações – até com resultados que dão alguma pequena esperança na área do recrutamento, mas não da retenção que continua muito difícil e aí a “radiografia” feita pelo estudo foi levada muito a sério pelo Ramo. O Exército como medidas que estão para ser implementadas neste âmbito, referiu, entre outras, a melhoria no fardamento acabando com a diferença entre RV/RC e QP a este nível, a nomeação de pessoal feminino para muito mais missões e cargos do que até agora, e melhorar o recrutamento local, isto é, recrutar pessoas nas localidades onde há quartéis e alterar definitivamente a cultura interna do ramo – “terminar com a cultura de serviço militar obrigatório “– a qual se pretende a de um exército moderno, dos dias de hoje.
Quanto à Força Aérea reiterando as vantagens do estudo já referidas, também foi dito que o Ramo não se revê em muitas das conclusões. Para a FAP o problema do recrutamento não é a quantidade – se quiserem voluntários não faltam – mas a qualidade de base desses candidatos. Foi mesmo dito que o elevado nível de tecnologia que se incorpora nas missões obriga a uma formação que confira elevadas capacidades aos militares e depois a sua retenção em concorrência com o mercado civil é impossível. Casos como os “mecânicos e avião” e os “bombeiros”, entre outros, são exemplos de profissões muito mais bem pagas do que Força Aérea pode fazer. Perante o que é oferecido aos voluntários teme-se neste ramo o relegar da sua base de recrutamento para extractos da sociedade com muito baixas qualificações. As medidas que têm que ser tomadas não estão referidas no estudo segundo a Força Aérea. Outro problema da FAP também referido não é a certificação nem a qualificação dos militares para poderem ser inseridos no mercado de trabalho, mas o facto dos militares rescindirem os contratos antes do seu termo por já estarem qualificados e arranjarem empregos. Em relação ao pessoal feminino o ramo disse que a integração corre sem problemas e está a ser sempre aprofundada, mesmo que não considerem medidas especificas, apenas atendem às qualidades e capacidades de cada um ou uma.
Todos os ramos abordaram a tremenda sobrecarga de horas/dias de serviço a que o pessoal está sujeito, facto decorrente da falta de efectivos, mantendo-se ou mesmo aumentando as missões, factor por todos considerado um dos que mais prejudicam a retenção dos efectivos. O impacto deste excesso de missões foi mesmo considerado “devastador” para a retenção dos militares porque a sua realidade no serviço é de constante sobrecarga de trabalho sem tempo para uma vida familiar normal e ainda para conseguir melhorar a sua formação. O passa-palavra dos amigos e familiares sobre o “que foi a tua tropa” neste campo é absolutamente crítico e aquilo que os militares mais valorizam, o que aliás é confirmado pelo estudo estando muito acima de formas de comunicação institucional por mais modernas que sejam.
O EMGFA embora não tenha directamente a ver com o recrutamento também participou no painel por ser um “utilizador” do capital humano das Forças Armadas, nomeadamente por ter o comando das Forças Nacionais Destacadas. Não havendo efectivos a disponibilidade de forças prontas naturalmente diminui, logo a participação em missões exteriores também. Aqui foi relevado a importância da componente humana que lida com as questões como a Cyberdefesa, no fundo em tudo semelhantes com os problemas referidos pela Força Aérea. Uma nota também para o impacto positivo que a participação nacional nas missões exteriores tem no recrutamento, o qual também é reconhecido e referido no Estudo. Os níveis de exiguidade de recursos são preocupantes, estão ao nível do “alerta”, de um momento para o outro “podemos bater no fundo” segundo o representante do EMGFA. A comparação dos militares com outros órgãos do Estado é um assunto que tem que ser olhando de modo muito atento pelo nível político e para isso o dito Observatório pode e deve ter um papel importante.
Todos os ramos manifestaram interesse na criação do Observatório do serviço militar o qual permitirá monitorizar e aperfeiçoar o sistema que vai ser aplicado. Não se levantaram dificuldades na aplicação do Plano mas perguntado sobre os objectivos que esperam atingir, todos os ramos mostraram muita prudência. Evitaram concretizar qualquer número porque consideram de difícil previsão, se estas e apenas estas medidas agora propostas do Plano vão ter resultados claros.
Suporte financeiro
As medidas e acções previstas no Plano não têm um orçamento específico, mas em resposta a questões quer sobre aumentos de vencimentos quer sobre a implementação do Plano foi dito pelo Director-Geral de Recursos da Defesa Nacional e depois no encerramento pela Secretária de Estado da Defesa Nacional, de modo muito vago, que os custos vão ser suportados de acordo com a tipologia das medidas pelo Orçamento da Defesa, pela Lei de Programação Militar e pela Lei de Programação de Infraestruras Militares.
Avaliação final da tutela
Na conclusão a Secretária de Estado da Defesa relevou do serviço militar não ser só uma profissão é muito mais do que isso e dos problemas em discussão não serem exclusivos de Portugal, mas uma tendência europeia. Mostrou-se muito sensível à precariedade no emprego em geral e dos jovens hoje não terem “um emprego para a vida”. Considerou também que a dimensão salarial sendo importante mas não é na sua opinião a única e até nos pareceu que dava mais importância à dimensão social para os militares e família, as condições trabalho, a perspectiva de desenvolvimento de carreira. Frisou que a estabilidade que uma pessoa consegue estando no quadro permanente é completamente diferente dos que não estão. Disse ainda que o Plano inclui a possibilidade de revisão da estrutura remuneratória porque de outro modo não se consegue competir com o mercado.
Deu ainda importância aos esforços em termos de comunicação quer pelos ramos quer ao novo portal da Defesa Nacional dedicado a esta área e insistiu na questão das certificações, frisou depois não haver nenhuma medida concreta relativa às remunerações.
Impressão geral
Pareceu-nos que enquanto os serviços do ministério, nomeadamente a entidade coordenadora, o Director-Geral de Recursos da Defesa Nacional, valorizaram extraordinariamente o Estudo e Plano apresentados – aliás o Dr. Alberto Coelho disse expressamente que tudo o que agora seja dito e não decorra do estudo cai no campo da cartomancia e deve ser desvalorizado – e em face das respostas dos RV/RC aos inquéritos, ficaram com uma imagem da situação nas Forças Armadas nem sempre coincidente com a que os ramos transmitiram no Seminário, por vezes mesmo muito diferente.
A nós, depois de ouvir os oficiais generais responsáveis pelo pessoal nos ramos, ficou-nos a convicção que as realidades dos três Ramos são diferentes e o “amalgamento” de alguns aspectos e medidas no Estudo e Plano serão aspectos a corrigir.
Considerando os três vectores do Plano – Recrutar, Reter, Reinserir – enquanto no primeiro, Marinha e Força Aérea dizem que o problema serão os tectos legais impostos e que nos últimos anos se mais pudessem mais incorporavam e também, no caso da Força Aérea, a sua grande preocupação é a qualidade dos voluntários, no respeitante à Reinserção, enquanto a Marinha pretende sobretudo alimentar o seu Quadro Permanente de Praças (desvalorizando de certo modo a reinserção no mercado de trabalho civil) a Força Aérea pretende condições concorrenciais – leia-se de vencimentos – com o mercado civil para que os militares não rescindam os Contratos antes do tempo, uma vez que a maioria das especialidades não parece ter problema em se reinserir na vida civil. O Plano neste campo dá importância capital à Certificação das Qualificações que os militares obtenham durante os anos de serviço em RC como o factor-chave que lhes abrirá as portas do mercado de trabalho, algo que como se vê não parece ser a realidade pelo menos da Marinha e Força Aérea. A Retenção será assim o grande problema comum aos três ramos, e como aliás foi dito pelos intervenientes militares – e o Estudo comprova – este aspecto beneficiaria muito havendo Carreira de Praças do QP no Exército e na Força Aérea e melhores vencimentos para Praças em todos os Ramos.
Aqui aliás foi também referido que nas respostas aos inquéritos no respeitante aos vencimentos a situação será ainda mais negativa para as Praças do que o apresentado, uma vez que os resultados foram obtidos juntando oficiais, sargentos e praças, categorias que como se sabe têm vencimentos muito diferentes.
Foi até referido por um dos intervenientes que sem carreira QP e melhores vencimentos “tudo o resto são paliativos”.
Outras soluções
Como é sabido olhando para outros países europeus que têm os mesmos problemas, há mais soluções que não foram consideradas neste estudo. A orientação política, já acima foi referida: aprofundar o actual sistema de serviço militar.
O que ficou então de fora, mesmo que um ou outro interveniente da plateia nas perguntas /respostas tenha alvitrado sem tempo para aprofundar?
Desde logo o Serviço Militar Obrigatório, solução que quanto a nós se esgotou e só voltará em caso de conflito generalizado na Europa ou nem assim, como teria duvidosa vantagem operacional para as missões de hoje. Já elaboramos sobre isso no artigo: O SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO ESTARÁ MESMO DE VOLTA? mas não quer dizer que não se estudasse esta possibilidade que também alguns países europeus, em diferentes formatos, consideram.
Países europeus, aliados na NATO, têm introduzido outras soluções que aqui e ali produzem resultados e que em síntese vamos apresentar:
Recrutar estrangeiros
França, Espanha, Reino Unido são três casos com longa experiência nesta área, mesmo que com soluções diferenciadas estando pelo menos França e Reino Unido a aumentar o seu número. No caso de Espanha desconhecemos a evolução, mas este ano as Forças Armadas Espanholas estão autorizadas pelo respectivo Ministério da Defesa a manter 7.110 estrangeiros, ou seja, mais de metade do total de efectivos do Exército Português e um número semelhante a toda a Força Aérea Portuguesa.
França concentra-os numa unidade, a Legião Estrangeira, que actualmente tem efectivos que se aproximam dos 8.900 militares, estando previsto só em 2019, recrutarem 1.245 novos militares. O enquadramento é feito por oficiais do Exército Francês, todos os sargentos são oriundos de legionários e muitos ascendem a oficiais. Ao contrário do que que aconteceu durante a maior parte da história da Legião, que só admitia candidatos a legionários (soldados) estrangeiros, hoje um cidadão francês também se pode candidatar. Mais de 160 nacionalidades estão presentes na Legião, muitos portugueses, e nos últimos anos um grande número de brasileiros alistaram-se.
O Reino Unido aceita nacionais, cidadãos da República da Irlanda que vivam no Reino Unido e recentemente começaram também a admitir cidadãos de países da Commonwealth que em determinadas circunstâncias podem servirem no Exército Britânico. São os seguintes os países cujos nacionais podem candidatar-se ao Exercito Britânico, não necessitando de residir no Reino Unido: Antigua & Barbuda, Australia, The Bahamas, Bangladesh, Barbados, Belize, Botswana, Brunei Darussalem, Cameroon, Canada, Cyprus, Dominica, Fiji, Gambia, Ghana, Grenada, Guyana, India, Jamaica, Kenya, Lesotho, Malawi, Malaysia, Maldives, Malta, Mauritius, Mozambique, Namibia, Nauru, New Zealand, Nigeria, Pakistan, Papua New Guinea, Rwanda, Saint Lucia, Samoa, Seychelles, Sierra Leone, Singapore, Solomon Islands, South Africa, Sri Lanka, St Kitts and Nevis, St Vincent and the Grenadines, Swaziland (eSwatini), Tonga, Trinidad and Tobago, Tuvalu, Uganda, United Republic of Tanzania, Vanuatu, Zambia.
O Exército Britânico dispõe também de uma “Brigade of Gurkhas” com cerca de 4.000 efectivos recrutados directamente no Nepal (270 novos por ano até 2018 que passaram a 432 por ano em 2019 e nos próximos anos), a qual este ano está a aumentar os efectivos com um novo batalhão. É enquadrada por oficiais britânicos, mas os Gurkhas que entram todos como soldados têm a possibilidade de ascender na carreira, mesmo até oficiais. Para se ter uma ideia, no ano passado concorreram 10.000 indivíduos para as vagas existentes.
Em Espanha a antiga Legião Estrangeira, originalmente designada “Tercio de Extranjeros” passou a designar-se apenas La Legion Española e deixou de recrutar estrangeiros de todo o mundo como o fazia a sua congénere francesa, é uma força do Exército Espanhol: Brigada de Infantería Ligera “Rey Alfonso XIII”, II de La Legión (com mais de 2.000 militares) dois “Tércios” (regimentos) independentes, aquartelados nos territórios espanhóis do Norte de África, o Tercio Gran Capitan” 1º de La Légion, em Melilla e o Tercio Duque de Alba 2º de La Legión, em Ceuta. Actualmente podem alistar-se na Legião cidadãos espanhóis e determinadas nacionalidades “hispânicas”. Como curiosidade os militares por estarem na Legião recebem, além do vencimento, um suplemento remuneratório mensal (88,00€), e outro suplemento remuneratório, este diário (22,57€), quando estão em exercícios no campo.
De assinalar que em Espanha os estrangeiros, ao contrário de França, podem ser destinados às várias unidades das Forças Armadas e não apenas à Legião.
Espanha espera conseguir este ano de 2019 dispor de 79.000 praças, dos quais 7.110 podem ser estrangeiros. Este ano podem concorrer nacionais dos seguintes países: Argentina, Bolívia, Costa Rica, Colômbia, Chile, Equador, El Salvador, Guatemala, Guiné Equatorial, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela.
Em Espanha os contratos são de 2 ou 3 anos iniciais, renováveis, até aos 6 anos, mas a partir do 5.º ano podem fazer um contrato de longa duração até aos 45 anos de idade, quer espanhóis quer os estrangeiros que pela via militar adquiriram nacionalidade espanhola.
Estrangeiros nas Forças Armadas Portuguesas?
Parece-nos que a possibilidade de recrutar estrangeiros deve ser estudada. Outros países europeus estão a considerar essa opção, por exemplo a Alemanha embora apenas em circunstâncias muito especiais, técnicos que façam falta, e se queremos realmente resolver o problema da falta de efectivos rapidamente e não empurrar o assunto para a distância de anos, décadas (como aliás tem acontecido), esta pode bem ser a forma mais rápida.
Basicamente podiam ser seguidas duas opções ou um misto destas: criar uma unidade só de estrangeiros, enquadrada por oficiais e sargentos portugueses – no fundo um pouco o que acontecia em diversas forças especiais de recrutamento local durante a guerra do Ultramar, uma experiência que muitos ainda recordam e está relativamente bem documentada; permitir o acesso a todas as unidades no fundo como fazem os nossos vizinhos espanhóis e agora também os britânicos, embora estes mantenham as unidades de Gurkhas.
Haveria naturalmente que optar por abrir a qualquer nacionalidade ou seleccionar os países que poderiam fornecer voluntários, por exemplo, os de língua oficial portuguesa o que naturalmente facilitava a integração.
Esta solução naturalmente que não terá só vantagens. Um estudo sério, até com o apoio dos países da NATO referidos que ainda por cima são nossos aliados, amigos e daqueles com os quais temos excelentes relações a nível militar e aliás participamos em muitas operações multinacionais em conjunto, poderia fazer luz sobre esta matéria que tem estado envolta em grandes preconceitos entre nós. Pensar “fora da caixa” como foi referido no Seminário não é insistir no mesmo, é fazer diferente…ou pelo mesmos estudar opções.
Recurso a pessoal civil
É sempre muito falado mas nunca concretizado o aumento do número de civis nas Forças Armadas para substituir militares em determinadas funções. Quem dispõe de muitos civis é o Ministério da Defesa Nacional, mas nas bases e quartéis rareiam! Também este aspecto deve ser avaliado e certamente haverá funções que podem ser desempenhadas por funcionários civis nos três ramos das Forças Armadas para libertar militares.
Mas mais, devia-se permitir ou mesmo estimular a criação de empresas que pudessem prestar serviços às Forças Armadas, quer em Portugal quer no estrangeiro – a custo inferior ao dos militares – para garantir determinadas actividades hoje desempenhadas com limitações ou mesmo não desempenhadas por falta de capacidade. Na área da logística, da formação, da segurança, há um pouco por todo o mundo cada vez mais exemplos desta realidade. Bem sei que o “trauma blackwater” está no imaginário de muita gente, mas isso são realidades passadas e estranhas ao momento presente. Cada vez mais empresas privadas fornecem, a custos inferiores ao que as estruturas militares conseguem, uma enorme panóplia de serviços a muitos países nas mais diferentes latitudes. É um mundo do qual estamos arredados e que vai do fornecimento de meios aéreos de asa fixa e móvel para as mais diferenciadas missões, ao emprego de técnicos para montar e manter sistemas logísticos a funcionar, passando pela área da formação sendo possível garantir uma continuidade que por exemplo a nossa cooperação técnico-militar dificilmente consegue, ou até da protecção da natureza, da fauna e flora de países amigos para os quais a falta de capacidade anti-caçadores furtivos é um drama e um prejuízo incalculável . Estas empresas são, sem dúvida, um importante multiplicador de força para os países que as têm!
Além do preço – reduz custos às operações militares, por isso os países a estas empresas recorrem e cada vez mais – tem ainda a vantagem de absorver antigos militares contratados que assim encontravam um emprego que aproveitava a sua experiência de anos. E tem outras dimensões que não vamos desenvolver mas passam pela colaboração de empresas portuguesas fornecedoras de equipamento militar, sempre travadas no seu desenvolvimento pelas pequeníssimas quantidades que as Forças Armadas Portuguesas hoje compram e que inviabilizam muitas empresas de fazer fornecimentos (não é economicamente rentável vender “meia dúzia” de botas ou de capacetes ou de camuflados), que assim poderiam ver os seus produtos promovidos e adquiridos no estrangeiro. Isto só será possível com uma boa articulação do Estado com o tecido empresarial, quer as firmas que podem fornecer equipamentos quer as que se viessem a ser formadas para prestar serviços na área da segurança. É mais um assunto que devia ser estudado sem complexos e que pode trazer benefícios ao país em diferentes áreas, parte nem aqui as referi mas são óbvias.
Lei aqui o artigo que apresenta os documentos oficiais sobre este tema:
APRESENTADO O “PLANO DE AÇÃO PARA A PROFISSIONALIZAÇÃO DO SERVIÇO MILITAR”
Leia aqui artigos anteriores no Operacional sobre esta temática:
06MAR2016 – O SERVIÇO MILITAR OBRIGATÓRIO ESTARÁ MESMO DE VOLTA?
19JUL2018 – FORÇAS ARMADAS PROFISSIONAIS, SOLUÇÃO PARA PORTUGAL
28SET2009 – EFECTIVOS MILITARES
27FEV2011 – NOVA REDUÇÃO DOS EFECTIVOS MILITARES
22SET2012 – EFECTIVOS MILITARES DAS FORÇAS ARMADAS EM 31DEZ2013
04MAR2015 – EFECTIVOS MILITARES AUTORIZADOS PARA 2015
21DEZ2016 – ESTAGNAÇÃO NOS EFECTIVOS MILITARES PARA 2017
Descarregue aqui os documentos oficiais:
Plano de Ação Para a Profissionalização Militar
Militares RV/RC: Características e Percepções
Dia da Defesa Nacional, Os Jovens e as Forças Armadas
(*) No dia do Seminário, 14ABR2019, o ministro João Cravinho citado pela agência Lusa, afirmou: “O plano está pensado para cinco anos porque se funcionar como queremos teremos, ao fim de cinco anos, um nível de efetivos nas Forças Armadas que corresponde ao desejável, que é na ordem dos 32 mil, e nós atualmente estamos nos 26 mil”. Seria portanto um aumento anual de mais de 1.000 efectivos.
Miguel Machado é
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