PÁRA-QUEDISMO DESPORTIVO NA ORGANIZAÇÃO NACIONAL MOCIDADE PORTUGUESA (ONMP)
Por Antonio Carmo • 6 Set , 2009 • Categoria: 09. ONTEM FOI NOTÍCIA - HOJE É HISTÓRIA PrintINTRODUÇÃO / ENQUADRAMENTO HISTÓRICO
É geralmente aceite pela maioria dos historiadores que o pára-quedismo, como actividade desportiva foi, na esmagadora maioria dos países, fomentado e desenvolvido pela instituição militar, resultando do interesse desta em, através da sua prática, aumentar as possibilidades de recrutamento e mobilização.
Por outro lado, é também indesmentível a utilidade do pára-quedismo, enquanto prática desportiva, como elemento cooperante na formação integral da juventude. O seu exercício proporciona ao praticante um domínio maior de si próprio, pela educação e melhoria constantes das suas qualidades e aptidões psico-físicas, tais como: coragem, decisão, autoconfiança, coordenação neuro-muscular e responsabilidade, para só citar as mais importantes.
Em Portugal a génese do pára-quedismo desportivo civil está, também, profundamente ligada à iniciativa militar, tendo a FORÇA AÉREA PORTUGUESA liderado o seu fomento e desenvolvimento, por razões nacionais e outras muito específicas facilitando, assim, a sua integração e aceitação no seio da comunidade civil.
Embora o pára-quedismo desportivo civil tenha sido legalmente espevitado em 1957, foram necessários esperar alguns anos para ter início a sua prática efectiva, tendo sido em Angola (ex-Província Ultramarina Portuguesa) que o pára-quedismo desportivo civil deu os primeiros passos: em 1965 realizou-se na cidade de Luanda, com o apoio do BATALHÃO DE CAÇADORES PÁRA-QUEDISTAS Nº 21, aquele que é considerado, unanimemente, o primeiro curso desportivo civil português.
Dois anos depois (1967), naquela que era considerada a cidade “mais portuguesa” do ex-Ultramar Português, Beira (Moçambique), tem início, também, a prática do pára-quedismo como actividade desportiva.
Estes dois exemplos funcionaram como referência e, em 1968, a Associação Académica do Instituto Superior Técnico de Lisboa, com o apoio da Força Aérea Portuguesa, leva a efeito o primeiro curso de pára-quedismo desportivo civil na então “Metrópole”. Sob total responsabilidade técnica e material do antigo Regimento de Caçadores Pára-quedistas (hoje Escola de Tropas Pára-quedistas – ETP) foram “brevetados” 28 dos 36 alunos iniciados.
Desde então, e apesar de algumas vicissitudes, o desenvolvimento e prática do pára-quedismo desportivo civil foi crescendo, apesar da ausência de sensibilidade da Direcção Geral de Aviação Civil (DGAC) para aquele tipo de actividade aeronáutica. Só em 1970 e, ainda no âmbito da DGAC, se conseguiu elaborar o Regulamento Nacional de Pára-quedismo Civil.
Por uma questão de rigor histórico, e independente de qualquer análise de cariz político ou social, uma organização nacional existiu que muito contribuiu para incentivar o desenvolvimento desta modalidade no seio da juventude portuguesa: a Organização Nacional Mocidade portuguesa (ONMP).
Não é intenção deste modesto escrito, denunciar os objectivos políticos e/ou outros que nortearam a criação desta organização. Porém, seria demasiado difícil e erro crasso, abordar o desenvolvimento do pára-quedismo desportivo civil português, omitindo o papel desempenhado por esta organização, criada em 1936, sucedânea da Acção Escolar Vanguarda, e que nos seus primeiros tempos de vida, obrigava todos os portugueses dos 7 aos 14 anos, estudantes ou não, e todos os que frequentavam os dois primeiros anos do ensino liceal, a integrá-la.
Assim, com a intenção única de fazer submergir alguns lampejos históricos, aqui deixo este pequeno e modesto registo, fruto de alguns anos de alguma curiosidade compulsiva, mas apaixonada, sobre a história de uma modalidade desportiva que chegou a ter, no princípio dos anos setenta, centenas de alunos e consequentemente praticantes apaixonados: o pára-quedismo desportivo ministrado pelas escolas e apoio da Organização Nacional Mocidade Portuguesa (ONMP).
A preparação pré-militar da juventude portuguesa, através de cuidadas manifestações culturais, físicas e desportivas patrocinadas pela Organização Nacional Mocidade Portuguesa(1), foi uma constante e uma preocupação dos dirigentes políticos do Estado Novo, com a intenção de «… a tornar cada vez mais apta, mais consciente e mais capaz de, quando incorporada nas Forças Armadas, desempenhar o seu dever na defesa da integridade da Pátria.»
Por outro lado, e embora nos primeiros tempos de vida da Mocidade Portuguesa (MP) os desportos favorecidos(2) tenham sido a esgrima, o remo, o hipismo, a vela, o voo sem motor (foram muitos os pilotos formados na conhecidíssima “Granja de Alpriate”, localizada perto da cidade de Lisboa e no Aeródromo de Évora) e o voo com motor (a instrução prática era realizada no Aeródromo de Alverca, e as aulas teóricas na Rua dos Anjos, 77-2º, em Lisboa), a partir de 1971, o pára-quedismo desportivo começa a revelar-se e a implantar-se, com relativo sucesso, no seio da juventude portuguesa.
Para este facto muito contribuiu a Força Aérea Portuguesa (sem a qual a prática do pára-quedismo desportivo civil não teria sido possível) aliado ao inestimável e imprescindível apoio técnico e material dado pelos Batalhões de Caçadores Pára-quedistas nos ex-territórios ultramarinos da África Portuguesa, e pelo Regimento de Caçadores Pára-quedistas, em Tancos – Portugal.
É neste cenário que entre Maio e Junho de 1971, na cidade de Lourenço Marques (hoje rebaptizada de Maputo), com o apoio prestado por militares do Batalhão de Caçadores Pára-quedistas N.º31/BCP31 (sediado na cidade da Beira), é ministrado o primeiro curso de pára-quedismo desportivo da Organização Nacional Mocidade Portuguesa.
Posteriormente, a formação de novos pára-quedistas desportivos através de cursos ministrados pelo Centro Especial de Pára-quedismo da Mocidade Portuguesa vulgarizou-se, tendo este Centro, tutelado pelo organizado e poderoso “Gabinete de Actividades Desportivas e Ar Livre” da MP patrocinado vários cursos e formado, ao longo dos anos(3), centenas de jovens em Alverca (Aeródromo), Pupilos do Exército (ITMPE), Regimento de Caçadores Pára-quedistas (Tancos), Centro Especial de Pára-quedismo de Aveiro (CEPA) e Escola de Pára-quedismo de Lisboa (EPL) para só citar os locais de formação de maior actividade e notoriedade.
Geralmente, o encerramento destes cursos terminavam com um festival aéreo, quase sempre realizado em datas especiais da Mocidade Portuguesa (1º de Dezembro, por exemplo), e com a significativa e singular cerimónia de imposição do distintivo de qualificação pára-quedista(4) (vulgo “brevê pára-quedista”) especifico e privativo da Organização Nacional Mocidade Portuguesa aos novos jovens pára-quedistas.
O DISTINTIVO DE QUALIFICAÇÃO PÁRA-QUEDISTA PRIVATIVO DA ONMP
O distintivo de qualificação pára-quedista privativo da ONMP, metálico, com as asas e calote do pára-quedas prateadas, apresenta no seu interior por cima do escudo de fundo azul em esmalte uma letra (A, B, C), ou um número (1, 2, 3), com carácter amovível, atribuído de acordo com o grau de evolução atingido pelo seu detentor.
Fixado por um alfinete de segurança no reverso, detém as seguintes medidas: 7,5 cm X 4,3 cm.
Sem qualquer suporte oficial, alguns alunos mandaram bordar, nas casas da especialidade, este mesmo distintivo em fio dourado que usavam fixados nos blusões dos fatos de treino e/ou em outros equipamentos/vestuário usados na execução dos saltos.
Mais recentemente, alguns coleccionadores mandaram “bordar” alguns exemplares, inspirados no modelo metálico, para preencherem as lacunas das suas colecções privadas.
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O PRIMEIRO CURSO DE PÁRA-QUEDISMO DA ONMP NOS “PUPILOS DO EXÉRCITO”
O pára-quedismo desportivo invadiu a população escolar “pilónica” em 1972, ano em que o Centro Especial de Pára-quedismo da Mocidade Portuguesa (CEPMP) promoveu um curso.
Apesar de ser novidade, os “pilões” aderiram e, lá começaram a sua instrução técnica no solo. Terminada esta primeira fase, por diversos motivos, não foi possível a passagem à fase seguinte – a execução dos saltos – tendo os futuros pára-quedistas ocupado o tempo a executar algumas descidas em “slide”.
Mas a hora do salto haveria de chegar.
O voo de adaptação realizou-se em Sintra e cada elemento, equipado a rigor, efectuou todas as fases para a execução do salto, até à ambicionada “posição de saída” na porta da aeronave de serviço.
Chegado o “dia D”, lá foram os 21 novos futuros pára-quedistas rumo ao Regimento de Caçadores Pára-quedistas (RCP) e, dali para a vizinha Base Aérea N.º 3 (BA-3/Tancos) onde, um possante «Dakota» acabava de aterrar com mais alunos do Colégio Militar e do Aero Clube Universitário.
Após curta confraternização, os “pára-quedistas desportivos pilónicos” logo impuseram a sua presença, graças ao seu garbo envergando combinações de saltos de cor alaranjada e capacetes brancos.
Dos grupos presentes na BA-3 foram os últimos a saltar. Mas ao fim de algumas horas, os 21 candidatos do 1º Curso de Pára-quedismo dos «Pupilos do Exército» patrocinado pela ONMP, cujo lema adoptado foi «É Só Sair», terminavam em apoteose uma meta que se tinham proposto atingir: concluir com aproveitamento um curso de pára-quedismo desportivo.
O primeiro salto dos “pilões” foi realizado em 3 de Junho de 1972.
Para que a história não apague este feito inédito do pára-quedismo desportivo civil, protagonizado por jovens de um estabelecimento militar de ensino, com mais de 90 anos (comemorará o seu 100º aniversário em 2011) de serviços prestados à Nação Portuguesa, e recorde com orgulho o seu passado, aqui deixo registados os seus nomes, sem esquecer os dois instrutores responsáveis pelo acompanhamento de toda a instrução:
4-Barbosa; 24-Barreiros; 38-Ferreira; 60-Pasadas; 100-Bravo; 152-Tolentino; 155-Piteira; 165-Aleixo; 185-Silva; 199-Correia; 238-Caracol; 246-Marcha; 260-Ramalho; 268-Boa-Ventura; 286-Moura; 305-Henriques; 315-Aduíno; 325-Mendes; 377-C. Martins (actualmente é oficial-general pára-quedista); 386-Teixeira; 150-Teixeira; Capitão Vicente e Alferes Mendes.
NOTAS
1 – A Organização Nacional Mocidade Portuguesa (ONMP), criada por força do Decreto N.º 26611 de 19MAI1936, manteve relações estreitas com as suas congéneres alemã (Juventude Hitleriana – HJ), italiana (Ballilas e Avanguardisti) e espanhola (Frente de Juventude Falange Espanhola Tradicionalista), apesar de o Estado Novo ter omitido (após 1945) este relacionamento com os regimes fascistas e nacional-socialista. Dotada de um hino, o seu emblema e Estandarte foi inspirado na bandeira d’El Rei D.João I.
2 – Curiosamente a ONMP chegou a ter ao seu serviço uma velha glória do boxe britânico: o campeão George Goday.
3 – O Regulamento da ONMP foi aprovado pelo Decreto N.º 27301 de 04DEZ1936. Foi reorganizada pelo Decreto-Lei Nº 47311 de 12NOV66 e transformada em associação nacional de juventude através do Decreto-Lei Nº 486 de 8NOV71. Foi extinta pelo Art.º 3º do Decreto-Lei N.º 171 de 25ABR1974.
4 – O desenho do distintivo de qualificação pára-quedista privativo da ONMP foi concebido por um oficial do Exército Português (coronel tirocinado) que embora identificado, em 1986, solicitou a omissão da sua identidade e que o autor respeita escrupulosamente. Actualmente, os alunos do IMPE habilitados com o Curso de Pára-quedismo Desportivo Civil usam o distintivo de qualificação pára-quedista civil, semelhante ao militar no seu desenho, porém, com a “cruz de Cristo” ao centro.
SUPORTE DOCUMENTAL
– MACHADO, Miguel António G. Silva e Carmo, António E. Sucena do – «Tropas Pára-quedistas Portuguesas – 1956-1993», Edição dos Autores, Lisboa, 1993 – ISBN 972-9584-0-2
– Jornal “Participação” N.º 3 e N.º 6 – ITMPE – Ano I – Março e Junho 1972 (edição policopiada), Pág. 5-6; Pág.12 – Artigo da autoria do Major António dos Santos Boavida Pinheiro (foi Director da Manutenção Militar de Nov85 a Jul88 com o posto de Coronel Tirocinado).
– Boletim da Mocidade Portuguesa, Nº1 (5ªSérie) – Junho de 1973.
(*) O texto deste artigo baseia-se em outros da mesma temática que foram publicados em diversas publicações periódicas (revista BOINA VERDE e QUERER É PODER) pelo autor (António E. S. Carmo), em diferentes datas.
(*) Todos os distintivos de qualificação pára-quedista da ONMP são da colecção privada de António E. S. Carmo.
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