OS MILITARES & O COMBATE A INCÊNDIOS FLORESTAIS
Por Miguel Machado • 21 Out , 2012 • Categoria: 01. NOTÍCIAS PrintTodos os anos muitos militares e meios das Forças Armadas são empregues no combate a incêndios florestais, nos termos do que a lei determina para este apoio. Raramente no entanto este contributo passa pelo conhecimento do público, pelas noticias das 20H00!
Seja como for, ele tem lugar e hoje apresentamos um texto que disso mesmo dá conta. O autor, Rui Pais dos Santos, é Major de Infantaria, com a especialidade de pára-quedista. Com 20 anos de serviço e seis missões cumpridas no estrangeiro (uma em Timor-Leste, duas na Bósnia-e-Herzegovina, uma no Kosovo e duas no Afeganistão). Pais dos Santos ingressou na Academia Militar em 1992, tem o Curso de Estado-Maior e o de Estado-Maior Conjunto, e concluiu em 2011-12 a Pós-Graduação em Ciências Militares – Segurança e Defesa, no Instituto de Estudos Superiores Militares. Actualmente é Doutorando em Relações Internacionais – Especialidade de Estudos de Segurança e Estratégia, na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, da Universidade Nova de Lisboa.
O “Operacional” agradece esta colaboração de Pais dos Santos que nos dá o conhecimento directo sobre aquilo que o Exército vem fazendo no âmbito do combate a incêndios florestais – sobretudo com dados numéricos – e mostra bem, embora este artigo apenas incida sobre o trabalho de uma das brigadas, que o esforço do ramo abrange todo o território nacional.
Importante ainda quanto a nós as referências à legislação que suporta estas missões, provando afinal que quando se quer, o emprego dos militares em território nacional, que tantos detractores tem, não só é possível e legal como muito útil, e, dizemos nós, desejável.
Participação da Brigada de Reacção Rápida no combate aos incêndios florestais em 2012
A BrigRR empenhou, ao abrigo do Dispositivo Especial para o Combate aos Incêndios Florestais (DECIF) para o ano de 2012, trinta e dois pelotões, num total de 733 militares e 92 viaturas.
De norte a sul de Portugal
O primeiro empenhamento de meios da Brigada de Reação Rápida (BrigRR), ocorreu em março. Fruto das condições atmosféricas anormais para a altura do ano, eclodiu na região de Castro Daire um incêndio, para o qual, foi mobilizado um pelotão do Centro de Tropas de Operações Especiais (CTOE – Lamego), de 29 a 30 de março. Sensivelmente no mesmo período, de 29 a 31 de Março, o Regimento de Artilharia 4 (RA4 – Leiria) participou com dois pelotões e o Regimento de Infantaria 15 (RI15 – Tomar) com um pelotão no combate a um incêndio na região de Penela.
No grande do incêndio de S. Brás de Alportel – Tavira, a BrigRR empenhou 10 pelotões. A participação da brigada iniciou-se a 19 de julho, com a projeção de um pelotão do Centro de Tropas Comando (CTC – Serra da Carregueira) e um do Regimento de Infantaria 3 (RI3 – Beja). Por este incêndio passaram, ainda, dois pelotões da Escola de Tropas Paraquedistas (ETP – Tancos), dois pelotões da Unidade de Aviação Ligeira do Exército (UALE – Tancos), dois pelotões do RA4, e, mais dois pelotões do RI3, tendo a brigada terminado o seu empenhamento neste incêndio no dia 25 julho.
No dia 19 de julho, o Regimento de Infantaria 15 (RI15) mobilizou um pelotão para um incêndio que lavrava na região de Tomar. Ainda no mês de julho, nos dias 29 e 30, o Regimento de Infantaria 10 (RI10 – S. Jacinto / Aveiro) participou com um pelotão nas operações de rescaldo de um incêndio ocorrido na região de Tondela.
Nos dias 3 e 4 de agosto, o RI3 foi participou novamente numa ação de rescaldo, desta vez na região de Penela, tendo para isso empenhado um pelotão. O CTOE, em 12 e 13 de Agosto, empenhou um pelotão, no rescaldo de um incêndio que deflagrou na região de Chaves.
O mês de setembro foi profícuo no número de incidentes que implicaram o empenhamento de meios da BrigRR em ações de rescaldo. Este mês iniciou-se com a participação de um pelotão do CTOE num incêndio deflagrado na região de Sernancelhe. Seguindo-se, nos dias 2 e 3, o emprego de um pelotão da UALE e de um pelotão da ETP na região de Óbidos. A 3 de setembro, o RA4 participou com um pelotão no combate a um incêndio no Bombarral. De 3 a 4 de setembro, o RI15 cooperou nas operações de rescaldo de um incêndio em Ourém, com o efetivo de um pelotão. No mesmo período, o RI3 enviou um pelotão, em igual tarefa, para a Vidigueira. De 3 a 5 setembro, o RI10 regressou à região de Tondela, com um efetivo de um pelotão. Por sua vez, o CTOE empregou um pelotão, de 5 a 7 de Setembro, em tarefa semelhante, na região de Viseu. O período de 9 e 10 de Setembro foi de elevada atividade com o emprego simultâneo de meios da BrigRR em dois incêndios: um pelotão da UALE em Arganil e quatro pelotões (RI10, RI15, ETP e RA4) na região de Viseu. O último empenhamento ocorreu na região de Bragança com o emprego de um pelotão do CTOE, de 16 a 17 de setembro.
Aos meios anteriormente referidos acresce a participação de Equipas de Ligação, a cargo das Unidades que projetam os pelotões. Estas equipas, enviadas em simultâneo com os pelotões, asseguram a ligação entre as forças militares e o Posto de Comando Operacional, da Autoridade Nacional de Proteção Civil.
Além das ações de rescaldo e de vigilância pós-rescaldo, a BrigRR, através do CTC, participou em ações de vigilância da Serra de Sintra, com um efetivo de 25 militares, divididos em cinco equipas de vigilância. A participação das equipas do CTC foi efetuada de acordo com um Protocolo firmado com a Câmara Municipal de Sintra, que suportou uma parte significativa dos custos.
Enquadramento legal
A participação da BrigRR no combate aos incêndios florestais decorre da legislação enquadrante das Forças Armadas e da Proteção Civil. A moldura legal aplicável às Forças Armadas inicia-se com a Constituição da República Portuguesa, sendo secundada pela Lei de Defesa Nacional (1) e pela Lei Orgânica de Bases da Organização da Forças Armadas (2) , repercutindo-se no Decreto-Lei que regula a Organização do Exército. Esta legislação identifica, entre as missões das Forças Armadas, a colaboração em missões de protecção civil e em tarefas relacionadas com a satisfação das necessidades básicas e a melhoria da qualidade de vida das populações.
Por sua vez, a Lei de Bases da Proteção Civil (3) impõe às Forças Armadas, enquanto agente de proteção civil, a responsabilidade de colaborar com a Autoridade Nacional de Proteção Civil. O Artigo 54.º desta Lei, clarifica o papel das Forças Armadas, referindo que entre as formas colaboração das Forças Armadas com a Autoridade Nacional de Proteção Civil inclui-se as “acções de prevenção, auxílio no combate e rescaldo em incêndios”.
Decorrentes da legislação são desenvolvidos Planos que definem as formas de cooperação entre as Forças Armadas e a ANPC. Neste âmbito surge a Diretiva Operacional Nº 006/CEMGFA/2010, que pormenoriza a forma como as Forças Armadas se articulam com a estrutura de proteção civil e de que forma colaboram com esta.
Planos do Exército – “Lira” e “Braseiro”
Especificamente para o combate aos incêndios florestais, o Exército desenvolveu o Plano Lira 2012, que por sua vez, originou no Comando das Forças Terrestres, o Plano Lira Operacional. Subsequentemente, a BrigRR implementou o Plano Braseiro, que define a forma como as unidades da BrigRR se articulam no DECIF 2012 e participam no combate aos incêndios florestais. Este Plano determina que cada uma das oito unidades territoriais apronte e mantenha em prontidão um pelotão e uma equipa de ligação, num efetivo mínimo de 22 e de 2 militares, respetivamente. Ou seja, a BrigRR disponibiliza em permanência um efetivo mínimo de 192 militares para operações de rescaldo e de vigilância ativa pós-rescaldo. Os pelotões aprontados para o DECIF são auto-sustentáveis por um período mínimo de 48 horas, estão dotados de meios de comunicação que permitem a ligação permanente e equipados com material para combater o fogo na fase de rescaldo, tais como: abafadores, motobombas, motosserras, lanternas, pás, enxadas, abafadores, picaretas e ancinhos.
Além do apoio em ações de rescaldo, a BrigRR tem capacidade para colaborar com a ANPC através do fornecimento de apoio logístico. Este pode incluir apoio de alimentação, o abastecimento de água, apoio de transporte, apoio sanitário de emergência, apoio em material diverso (material de aquartelamento, tendas de campanha, geradores, depósitos de águia, entre outros), disponibilização de infra-estruturas para apoio a unidades terrestres ou aéreas de combate aos fogos, e, abastecimento de água às aeronaves no Aeródromo Militar de Tancos (na UALE) e no Aeródromo Militar de São Jacinto (no RI10).
(1) Lei Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de Julho
(2) Lei Orgânica n.º 1-A/2009, de 7 de Julho
(3) Lei n.º 27/2006, de 3 de Julho
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