O PÁRA-QUEDISMO NAS FORÇAS ESPECIAIS ANGOLANAS
Por Miguel Machado • 12 Fev , 2016 • Categoria: 09. ONTEM FOI NOTÍCIA - HOJE É HISTÓRIA, EM DESTAQUE PrintPassam agora dois anos sobre o levantamento de uma nova capacidade nas Forças Especiais Angolanas: o pára-quedismo. Foi um processo que acompanhamos de muito perto, envolveu militares pára-quedistas portugueses desligados do serviço activo, e constituiu o decisivo passo num caminho que está a ser percorrido. Este artigo pretende mostrar aos nossos leitores aquilo que foi, sem dúvida, um marco na história do pára-quedismo militar em Angola e em especial na Brigada de Forças Especiais. Hoje, em 2016, cerca de 400 militares estão capacitados para saltar em pára-quedas, têm material adequado para o fazer e pessoal capaz de organizar e proceder aos trabalhos necessários a este tipo de actividade.
O aumento da capacidade de projecção e reacção rápida da Brigada de Forças Especiais (BRIFE) das Forças Armadas Angolanas (FAA), era um objectivo antigo mas nunca concretizado por diversas vicissitudes. Começou a ser uma realidade meses antes, mas a 24 de Março de 2014, em Cabo Ledo, base militar onde se encontra a BRIFE e a Escola de Formação de Forças Especiais (EFFE), ficou à vista de todos uma nova realidade: 248 militares da BRIFE terminaram a formação e receberam as suas insígnias de pára-quedista militar angolano. Os novos pára-quedistas eram sobretudo Comandos mas também elementos de Operações Especiais e Fuzileiros.
Foi percorrido um caminho longo e cheio de obstáculos. Ficou não só na memória daqueles que ultrapassaram os obstáculos físicos e psicológicos e saltaram de uma aeronave em voo, juntando-se a essa grande fraternidade pára-quedista de todo o mundo – sentem-se iguais entre si pelos riscos e sentimentos comuns – mas também nos que sentiram a satisfação do dever cumprido por terem contribuído para o sucesso da construção desta capacidade. Foi um processo que exigiu a conjugação de muitos factores, internos e externos, alguns de elevada complexidade. Para quem acompanhou esta realidade, pode-se dizer que depois de anos e anos seguidos de tentativas mal sucedidas, de dúvidas, enganos e mal-entendidos, o desafio era tremendo, os riscos enormes, mas tudo foi vencido!
O pára-quedismo na doutrina actual das forças especiais angolanas
O pára-quedismo militar não sendo novo em Angola, foi até 2004 uma responsabilidade primária da Força Aérea Nacional (FAN) que mantinha um batalhão de pára-quedistas. Além de militares formados no estrangeiro – nomeadamente em Portugal (Tancos – 1991) quando os pára-quedistas ainda integravam a Força Aérea Portuguesa – também na Base Aérea de Luanda se realizaram vários cursos de pára-quedismo ao longo dos anos. As circunstâncias próprias da guerra civil (1975-2001) com um empenhamento operacional disperso por diversos pontos do território e as dificuldades com material proveniente na sua quase totalidade dos antigos “países de Leste”, tornou a actividade pára-quedista pouco regular. Por outro lado, quadros dos “Comandos” e das “Operações Especiais”, foram formados em pára-quedismo em Portugal (Tancos – 1995), e tentou-se depois, sem sucesso, criar uma escola de pára-quedismo em Cabo Ledo base principal das Forças Especiais Angolanas. Foi um processo que decorreu no âmbito da Cooperação Técnico-Militar entre os dois países, esteve muito avançado do ponto de vista do planeamento mas nunca avançou.
Em 2004 o batalhão de pára-quedistas foi extinto na FAN e a maioria dos seus elementos transferidos para uma nova Brigada de Forças Especiais, fruto da extinção da Brigada de Comandos e do Regimento de Operações Especiais. Em 2013, foi decidido ao mais alto nível do Estado angolano, que a criação desta capacidade – que existe em vários países da sub-região – tinha que ser totalmente revista. “Havia que parar para pensar, estruturar bem o que se pretendia atingir, adquirir material moderno, e então avançar com todas as condições, de modo profissional e sustentado, para não voltar a haver retrocessos neste processo, o pára-quedismo veio para ficar”, refereriu-nos o Tenente-General Cruz Fonseca, antigo comandante da BRIFE e em 2013, já como Chefe da Direcção de Forças Especiais do Estado-Maior-General das Forças Armadas, principal impulsionador da introdução desta capacidade nas forças especiais, para o que contou “com o apoio informado, incondicional e o incentivo”, disse-nos, do General Geraldo Sachipengo Nunda, Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas.
Note-se no entanto que ao invés de alguns países, em Angola, a doutrina actual das forças especiais não prevê a existência de unidades pára-quedistas, mas sim qualificar com a especialidade de pára-quedismo os militares da BRIFE, sejam eles Comandos, Operações Especiais ou Fuzileiros. Estes últimos, mantendo-se a sua Brigada de Fuzileiros (BrigFuz, localizada no Ambriz, 170 km ao norte de Luanda) na Marinha de Guerra Angolana, estão na dependência operacional da Direcção de Forças Especiais do EMGFA e são empregues em algumas missões como os outros militares das BRIFE.
Uma nota para os antigos pára-quedistas da FAN que foram integrados na BRIFE em 2004. Uma vintena fez uma “reciclagem de pára-quedismo” em Fevereiro e Março de 2014 para voltar a saltar em pára-quedas e assim foram qualificados nos novos equipamentos e procedimentos. Estão agora no desempenho de funções ligadas à instrução de pára-quedismo e à manutenção do equipamento aéreo em Cabo Ledo.
Os cursos de pára-quedismo na Brigada de Forças Especiais
Depois de avaliadas várias possibilidades, como o apoio de países amigos ou o recurso a firmas estrangeiras privadas especializadas – que aliás propuseram soluções diversas, a concretizar em Angola ou no estrangeiro – a opção do Estado angolano recaiu na contratação de uma firma portuguesa, o Grupo Milícia, para, em conjunto com quadros superiores da Direcção de Forças Especiais, da BRIFE e da EFFE, planearem primeiro a escolha e aquisição dos novos pára-quedas – recaiu no material CIMSA idêntico do usado pela Brigada Paracaidista de Espanha – e depois o formato dos novos cursos de pára-quedismo militar, adequados à realidade da doutrina de forças especiais angolanas e a realizar em Angola (Cabo Ledo). A empresa portuguesa escolheu para este projecto um grupo de formadores, pára-quedistas militares portugueses desligados do serviço activo, com elevadas qualificações nas diversas áreas do conhecimento desta actividade, pessoas com muitos anos de serviço no desempenho de tarefas semelhantes às que iriam realizar em África.
Material
A selecção do material começou naturalmente pelos pára-quedas automáticos(1) e manuais(2)para as diferentes fases da formação, a qual recaiu na firma “CIMSA, Ingenieria de Sistemas”, a mesma que fornece, entre muitos outros clientes, a brigada pára-quedista espanhola. Avaliada nas suas instalações fabris de Barcelona, quer em termos de qualidade quer de capacidade para respeitar prazos de entrega, a Direcção de Forças Especiais adquiriu os seguintes pára-quedas:
Dorsal de abertura automática TP 2Z Orientável e TP 2Z Direcionável; ventral de abertura manual (Reserva) RTP 26Z; dorsal de abertura manual (Largadores) SE-150; dorsal para infiltração táctica HALO-HAHO, JANUS-300.
A firma portuguesa forneceu capacetes de salto, balísticos, com interior estudado para salto em pára-quedas, mochilas tácticas especialmente adaptadas para salto em pára-quedas e material diverso para operar zonas de lançamento.
Ficava assim completa a panóplia de pára-quedas, outros materiais dedicados e respectivos acessórios necessários para as diferentes fases da formação contratada, a qual está neste momento na sua segunda fase como veremos.
Formação
Tendo em consideração aquilo que a BRIFE pretendia em termos da “capacidade pára-quedismo” foram elaborados os programas dos diferentes cursos, os quais em linhas gerais foram agrupados em duas fases para os pára-quedas de abertura automática:
1.ª fase: reciclagem de pára-quedismo; 2 cursos de pára-quedismo; curso de dobradores de pára-quedas;
2.ª fase: curso de instrutores de pára-quedismo (que inclui uma fase de largadores e outra de operadores de zonas de lançamento, além da utilização de pára-quedas fendados direcionáveis).
Depois da saída dos instrutores portugueses a BRIFE ficou com capacidade autónoma não só de ministrar os seus próprios cursos de pára-quedismo como de efectuar lançamentos em pára-quedas, o que fizeram por várias vezes. Em Setembro de 2014 por exemplo, aproveitando a realização em Angola de um exercício multinacional de forças especiais da SADC –Southern African Development Community, a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, a BRIFE deslocou para o Waku-Kungo meios materiais e humanos para realizar várias sessões de lançamento (pára-quedas automáticos), com o apoio do Regimento Aéreo de Helicópteros da FAN.
Numa 3.º fase seria dada formação para utilização dos pára-quedas de abertura manual, com vários patamares de especialização, acções que a Direcção de Forças Especiais acabou por optar realizar, em parte, em Portugal no âmbito da Cooperação Técnico-Militar com o Regimento de Paraquedistas. Na realidade, além de questões de outras ordens, a indisponibilidade em Angola de meios aéreos adequados a estas especializações ligadas aos saltos de abertura manual, facto que não está ultrapassado, levou as FAA a optar pela solução actual tendo em vista conseguir formar saltadores operacionais a grande altitude, ainda que em número reduzido (até ao momento dois militares angolanos completaram com sucesso o “curso SOGA” em Tancos).
Meios aéreos
Depois de avaliação aos meios aéreos disponíveis na Base Aérea de Luanda para apoiar os cursos de pára-quedismo, não só pelas suas características – devido ao tipo de pára-quedas a usar – mas também pela disponibilidade, tendo em conta as muitas missões que a FAN cumpre, não só estritamente militares como em proveito das populações, a escolha recaiu na aeronave MI 17. Este processo teve acompanhamento directo da FAN desde os operadores das aeronaves até ao seu comandante, General General Francisco Afonso, e também o empenhamento directo do Chefe-Adjunto da Direcção de Forças Especiais, Brigadeiro Agostinho Tomás.
Durante a chamada “fase ar” dos cursos de pára-quedismo, ou seja, a componente que se segue à instrução teórica e prática “em terra”, foram usados dois helicópteros MI 17 do Regimento Aéreo de Helicópteros. Estas aeronaves foram destacadas de Luanda para Cabo Ledo com as suas tripulações, adaptadas para o lançamento de pára-quedistas em salto automático pelos formadores portugueses, engenheiros de voo e mecânicos. A principal modificação consistiu na instalação de um “cabo de ancoragem” que permitisse o salto pela retaguarda da aeronave e tivesse a resistência adequada ao tipo de pára-quedas a usar, e bem assim como a retirada dos “batentes” (portas da retaguarda), tendo os MI-17 voado sempre nestas condições. A FAN e a BRIFE providenciaram ainda a deslocação para Cabo Ledo dos materiais e combustíveis necessários ao reabastecimento no local destes meios aéreos evitando-se gastos de tempo e recursos financeiros com deslocações a Luanda para essa finalidade.
Zonas de Lançamento
Foram reconhecidas várias áreas junto (e mesmo dentro) ao quartel de Cabo Ledo que permitissem o lançamento de pára-quedistas, com as dimensões adequadas e ausência de obstáculos. Estes podem ser árvores ou arbustos de médio porte, valas profundas no terreno, construções em alvenaria, fios de alta tensão, entre outros, que não só podem ferir um pára-quedista na aterragem, impossibilitando-o de continuar a instrução, como danificar severamente os pára-quedas, equipamentos que são dispendiosos e carecem de cuidados rigorosos para funcionarem em boas condições. Foi escolhida para o curso a Zona de Lançamento (ZL) de “Cabo Ledo 1”, a norte do quartel, junto à vedação, o que permitiu uma grande rapidez no desenrolar das sessões de saltos, quer por causa dos tempos de voo mínimos quer para as deslocações em viaturas dos pára-quedistas após os saltos.
Neste período foram ainda reconhecidas, com os formadores portugueses, possíveis zonas de lançamento em outras regiões de Angola, para a eventual realização de saltos no decurso de exercícios das FAA, tendo havido, mais tarde, a concretização de saltos em parte destes locais.
Montagem e dobragem de pára-quedas
Em simultâneo com as outras acções de preparação do curso foram montados em Cabo Ledo os pára-quedas adquiridos pela BRIFE, os quais haviam sido importados desmontados por questões de segurança e verificação do material, tendo nesta acção sido empenhados quer os formadores ligados a esta área de actividade (a “dobragem”) quer os militares da brigada que foram nomeados para virem a ser os futuros dobradores de pára-quedas. Não havendo construídas as infra-estruras definitivas foi necessário algum grau de improvisação mas sempre garantindo a total segurança no manuseamento e guarda dos equipamentos, em instalações seguras e com ar-condicionado garantido as temperaturas ideais para guarda prolongada destes equipamentos. Nestas condições o material tem um ciclo de vida muito superior ao que teria em situação diferente.
Foram instaladas na área da EFFE mesas de dobragem (4 linhas, o que permitia a dobragem de 4 pára-quedas em simultâneo, num total conseguido de 72 pára-quedas/dia), em área coberta e arejada e ali se realizaram todas as dobragem de pára-quedas, dorsais e reservas, actividade que decorreu com perfeita normalidade como se veio a constatar nos saltos.
Testes ao material (aeronaves e pára-quedas) e início da formação
Adaptadas as aeronaves, montados e dobrados os primeiros pára-quedas havia que se proceder aos competentes testes. No pára-quedismo tudo tem que funcionar bem, um erro, por vezes aparentemente simples, pode originar a morte de um militar. Nesta actividade mesmo nos saltos de treino, as condições técnicas são exactamente idênticas às de operações reais, os saltos são sempre a sério!
Em 19 de Fevereiro efectuaram-se com sucesso os testes de lançamento, validando o sistema de ancoragem ao MI-17. Do mesmo modo se testaram com sucesso os procedimentos acordados entre tripulações e largadores a bordo e bem assim como os efectuados entre a tripulação e os precursores que operavam ZL, tudo de acordo com as normas de segurança internacionais usadas na generalidade dos países que operam este tipo de pára-quedas.
Reciclagem, I e II Cursos de Pára-quedismo da Brigada de Forças Especiais
Seguindo um formato que teve em linha de conta a condição dos alunos, alguns já com cursos de pára-quedismo mas há mais de uma década sem saltar, e outros (a maioria) que vinham do Curso Avançado de Forças Especiais, muito bem preparados física e tacticamente, realizaram-se assim, em simultâneo, dois cursos: a chamada “Reciclagem” para os primeiros (22 militares) e o I Curso de Pára-quedismo das Forças Especiais das FAA (111 militares). Seguiu-se de imediato o II Curso, este com 115 militares.
Assim, entre Fevereiro e Março, 248 militares(3) terminaram com aproveitamento a sua formação em pára-quedismo militar, e 22 de dobradores de pára-quedas.
Os cursos iniciaram-se com a formação técnica de pára-quedismo “em terra” que abrangeu matérias como: Técnica de aterragem; Material; Técnica de descida; Técnica de embarque e saída de aeronaves; Técnica de reorganização. Os militares já pára-quedistas ao mesmo tempo que recebiam alguma actualização na sua formação – nomeadamente no material e técnica de embarque e saída de aeronaves – apoiaram os instrutores como monitores, melhorando assim o rácio instrutor/monitor – aluno, com naturais reflexos positivos na aprendizagem dos alunos.
A 21 de Fevereiro, os 22 militares da Reciclagem realizaram cada um dois saltos e ficaram assim qualificados para este conjunto de pára-quedas e aeronave; a 25 de Fevereiro de 2104, iniciaram-se os saltos do I Curso com 111 militares a saltarem, em vagas sucessivas, ininterruptas, sem incidentes com o material ou acidentes com o pessoal – todos os pára-quedas foram dobrados pelos elementos do Curso de Dobragem. Nos dias e semanas subsequentes todos os militares deste curso e depois do 2.º, efectuaram cada um 6 saltos em pára-quedas, totalizando 1.400 saltos em pára-quedas.
Passou a ser frequente sobre Cabo Ledo, bem cedo, ao raiar do dia para aproveitar as condições atmosféricas favoráveis a presença das calotes abertas a descer sobre a ZL de Cabo Ledo.
Aquilo que durante anos, décadas, parecia uma impossibilidade, era agora uma realidade. A capacidade de um militar angolano efectuar saltos em pára-quedas de abertura automática a partir de aeronaves em voo, armado e equipado para combate, estava concretizada.
O Brigadeiro João Baptista Paulo, Comandante da BRIFE, referiu-se em cerimónia militar interna ao desafio que se colocava à sua unidade “…as FAA em geral e as Forças Especiais em particular estão a operar no seu seio mudanças significativas adequadas à conjuntura da reedificação em curso, onde tem procurado conformar as suas estruturas militares em função das características geográficas e geoestratégicas que o nosso país apresenta. Na ótica desta ideia a chefia do comando superior das FAA, entendeu introduzir a valência pára-quedismo militar, para conferir maior capacidade interventiva no teatro de operações às forças especiais. Esta realidade, vai redimensionar estas forças noutros patamares a par das suas congéneres estrangeiras…”.
Dia das Forças Especiais, 5 de Maio de 2014
Neste dia, perante o Ministro da Defesa Nacional, João Manuel Gonçalves Lourenço, utilizado helicópteros MI-17 e pela primeira vez um recentemente adaptado Bell 212, vinte pára-quedistas saltaram, também pela primeira vez, com pára-quedas automáticos direcionais, e conseguiram, apesar das condições atmosféricas não serem as ideais, aterrar numa ZL marcada no interior da base de Cabo Ledo.
Este destacamento de 20 militares representou assim mais uma evolução no uso dos pára-quedas adquiridos pela BRIFE. Até esta data os militares apenas haviam sido treinados para saltar com os pára-quedas “orientáveis”, ou seja os mais básicos em que o pára-quedista pode rodar sobre si próprio, e orientar o pára-quedas para o momento da aterragem, embora não tendo grande capacidade de aumentar ou diminuir a sua velocidade. Os “direcionais” já permitem ao pára-quedista alterar a velocidade e direcção do pára-quedas, dando-lhe assim capacidade acrescida para evitar obstáculos e permite também efectuar saltos em segurança com velocidade do vento muito superior, o que realmente se verificava neste dia.
Curso de instrutores de pára-quedismo
Logo após o Dia das Forças Especiais iniciou-se o Curso de Instrutores de Pára-quedismo, também sob responsabilidade da mesma firma privada portuguesa, o mesmo instrutor-chefe e novo grupo de instrutores, parte dos quais provenientes do “destacamento” inicial. Novo curso de dobradores teve também inicio, capacidade exigente e sem dúvida imprescindível ao bom funcionamento de toda a actividade aeroterrestre. Esta actividade, critica no pára-quedismo, a dobragem, tem funcionado bem em Angola, durante e depois da permanência no país dos formadores portugueses, provando-se a qualidade do pessoal, da instrução ministrada e do material adquirido.
Em Junho de 2014 os formadores do Grupo Milícia deram por terminada a instrução “em terra” das 3 componentes do Curso de Instrutores “desenhado” para as Forças Especiais Angolanas: a Instrução de Pára-quedismo propriamente dita, em que o aluno foi ensinado a ser instrutor, a ministrar todas as matérias de um curso de pára-quedismo; a instrução de Largadores, na qual aprenderam todos os procedimentos em terra e na aeronave para lançar pára-quedistas, coordenar as acções a bordo com as tripulações quer em situação normal quer em emergências e resolver incidentes que possam acontecer a bordo; a Operação de Zonas de Lançamento onde ficaram a saber a escolher uma ZL, manusear os instrumentos que permitem determinar as condições atmosféricas e calcular os elementos necessários para marcar a zona e que dados transmitir aos pilotos e apoiar as actividades de reorganização, incluindo emergências, incidente e acidentes.No total foram formados 16 instrutores (de 32 candidatos), 12 operadores de zona e mais 25 dobradores.
Estes cursos de instrutores significaram um avanço substancial no nível de exigência das técnicas relativas ao pára-quedismo. Enquanto antes todos os militares concluíram com êxito a sua formação – todos saltaram – agora, na formação para instrutores, cerca de 50% dos alunos foram eliminados. Os exames destas áreas são particularmente exigentes. Aqui não podia haver a mínima falha, essencialmente na instruções de inspecção de pessoal e aeronaves. Os exames destas áreas são sempre particularmente exigentes. O aluno tem que ultrapassar com sucesso 5 estações, cada uma com 1 militar equipado para salto, uns sem material (mochila), outros com material, com armamento, só com armamento e com pára-quedas direcionáveis. Em cada uma das estações os militares apresentam erros no equipamento e alguns destes são considerados “mortais”. Se o aluno não os detecta, é eliminado. Os alunos que ultrapassaram com sucesso esta fase, iniciaram a “fase ar” do curso de instrutores, com treinos de lançamento a partir dos MI-17 da FAN.
Num novo curso de dobragem, os dobradores receberam formação para os pára-quedas automáticos direcionáveis e para os manuais SE 150 usados pelos largadores.
Pára-quedismo militar, uma realidade em Angola
O Pára-quedismo em Angola é um caminho que já se iniciou. As novas capacidades que se pretendem desenvolver vão conferir autonomia à BRIFE para lançamentos em massa de unidades operacionais. Estão em curso os estudos necessários à adaptação das aeronaves de asa fixa disponíveis na Força Aérea Nacional, para transporte aéreo táctico e estratégico e ainda os que permitam a capacidade de infiltração a grande altitude destinada a destacamentos especiais. Há lacunas identificadas, além do já referido para os meios aéreos, falta por exemplo terminar o projecto para a “área da dobragem e armazenamento de pára-quedas”, que se espera sejam resolvidas.
Em Setembro de 2014, na região do Waku-Kungo (Cela/ Cuanza Sul), a BRIFE deslocou para a região material e dobradores e foi em condições de campanha que montaram uma sala de dobragem que permitiu a realização de muitos saltos automáticos durante o exercício, mostrando aos países da região, parceiros por excelência de Angola, esta nova capacidade a funcionar. Depois da saída dos formadores portugueses quer em Cabo Ledo quer nesta zona do Waku-Kungo, A BRIFE realizou mais de 3 centenas de saltos automáticos de modo absolutamente autónomo.
A Cooperação Técnico-Militar com o Regimento de Paraquedistas da Brigada de Reação Rápida do Exército Português, agora que foi desbloqueada e se iniciou com carácter temporário em 2015, quer em Cabo Ledo, quer em Tancos, pode dar um contributo muito importante para a consolidação e desenvolvimento do pára-quedismo militar em Angola, assim haja vontade política em ambos os países.
Passados dois anos sobre os principais factos aqui relatados, este artigo pretendeu mostrar aos nossos leitores aquilo que foi, sem dúvida, um marco na história do pára-quedismo militar em Angola e em especial na Brigada de Forças Especiais. Hoje, em 2016, cerca de 400 militares estão capacitados para saltar em pára-quedas, têm material adequado para o fazer e pessoal capaz de organizar e proceder aos trabalhos necessários a este tipo de actividade. É um caminho que pode ser longo, mas depois deste “arranque” inicial – em Portugal o célebre “curso de Espanha” (1955) que permitiu o desenvolvimento do pára-quedismo no nosso país, foi terminado por menos de 200 militares – só podemos desejar que os esforços e dedicação de angolanos e portugueses neste projecto, se desenvolva com passos seguros e o entusiasmo que sempre caracteriza os militares um pouco por todo o mundo saltam de aeronaves em vôo.
O que somos?… Amigos!
O que queremos?… Alvorada!
O que amamos?… O perigo!
O que tememos?… Nada!
Em posição!… Já!
(1) Designa-se por “automático” ou “abertura automática” aquele pára-quedas no qual o militar apenas tem que saltar da aeronave sem tomar qualquer acção na sua abertura. É uma tira extractora que liga o pára-quedas à aeronave que o aciona. Neste caso os militares saltam com mais um pára-quedas, o ventral, “reserva”, que para abrir, em caso de emergência, tem que ser o pára-quedista a acionar, aterrando depois com as duas calotes abertas.
(2) Designa-se por “manual” ou “abertura manual” aquele pára-quedas em que após o salto da aeronave, tem que ser o militar a acionar um punho para abrir o pára-quedas. Nestes equipamentos o “reserva” também ele manual, é dorsal, tendo o saltador que libertar a calote do principal em caso de mau funcionamento para abrir então o “reserva” e aterrar apenas com a calote do “reserva”.
(3)17 Oficiais, 57 Sargentos e 74 Cabos e Soldados.
(*) Este curso destina-se a formar uma unidade especializada dentro da BRIFE, o Grupo de Acções Especiais que foi desactivado em 2005, e agora, mais robusto, foi de novo constituído.
DISTINTIVO DE QUALIFICAÇÃO PÁRA-QUEDISTA DA REPÚBLICA DE ANGOLA
ANGOLA: EXERCÍCIO DE FORÇAS ESPECIAIS, “VALE DO KEVE 2014” (I)
ANGOLA: EXERCICIO DE FORÇAS ESPECIAIS, “VALE DO KEVE 2014” (Conclusão)
“GAE”, A ELITE DOS COMANDOS ANGOLANOS
MUSEU NACIONAL DE HISTÓRIA MILITAR – ANGOLA
GRUPO MILÍCIA, 20 ANOS DE ACTIVIDADE
37.º ANIVERSÁRIO DAS FORÇAS ESPECIAIS ANGOLANAS
CURSO DE PÁRA-QUEDISMO DAS FORÇAS ESPECIAIS ANGOLANAS (C/ Vídeo)
Miguel Machado é
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