NO AFEGANISTÃO POR PORTUGAL
Por Miguel Machado • 12 Mai , 2013 • Categoria: 02. OPINIÃO PrintRegressam hoje a Portugal militares que estiveram a cumprir uma missão de 6 meses no Afeganistão. Certamente terão à chegada muitos familiares, chefes militares e, talvez, representantes do poder político. Receberão abraços emocionados e os tradicionais agradecimentos. Com sorte algum canal de televisão fará um apontamento de reportagem e no dia seguinte uma ou outra foto será publicada num jornal diário.
Estiveram no Afeganistão a fazer exactamente o quê? Alguém sabe? Sabemos que lá estão em nome de Portugal por decisão de sucessivos governos legítimos, com a concordância do Conselho Superior de Defesa Nacional. Agora, em concreto, o que fizeram? Quantos representantes do povo português – deputados à Assembleia da República – os visitaram para ver com os seus próprios olhos o que ali se passa? Zero. Quantos governantes lá foram nos últimos seis meses? Zero. Quantos jornalistas acompanharam os militares no terreno? Zero.
200 portugueses no pior cenário de guerra dos nossos dias, onde este ano já morreram 56 militares da coligação a que pertencemos – Portugal já lá perdeu dois militares e vários feridos em anos anteriores –, e o que sabemos do seu trabalho é pouco mais que nada. Dizem-me alguns no meio militar que não é relevante a divulgação do trabalho feito, basta cumprir bem, receber as recompensas castrenses e o pagamento devido, e o assunto está encerrado. Os louvores e as medalhas atribuídas são aliás publicadas em Diário da República, meses depois, e aí sim se descrevem factos das missões – mas quem lê o Diário da República? E estes relatos oficiais, muito adjectivados, sobre uma minoria de militares que se distinguiram aos olhos dos seus chefes, dão a noção do que os restantes ali fizeram?
Há quem acredite piamente que este apagamento das missões militares é propositado, tratar-se-á de uma política deliberada para tornar mais fácil a aceitação pela opinião pública das decisões sobre as Forças Armadas em geral e os militares em particular: “se nada fazem de relevo, para quê sequer a sua existência?”, seria o fim último deste procedimento. Não partilho esta opinião, recuso-me a acreditar nisto, mas custa-me a aceitar que os próprios militares teimem em não tomar nas suas mãos a divulgação da sua acção. Procedimento aliás normalíssimo em todos os países ocidentais. Os motivos reais transcendem-me mas inclino-me por um lado para dogmas do passado que continuam enraizados em diferentes patamares de decisão que não só nos mais elevados como por vezes se julga, e por outro, para a preocupação em que a opinião pública não saiba as limitações com que as forças portuguesas se vão confrontado em algumas destas missões. Sem jornalistas no terreno, a pressão pública para resolver lacunas que se prolongam anos seguidos é nula.
Os militares no terreno cumprem como podem, passam umas vergonhas, mas no fim, o esforço, a dedicação, a sorte e o brio profissional acabam por superar a maioria dos problemas. Não todos infelizmente, mas esses por lá ficam enterrados para sempre e na memória de quem os passou. Mas afinal de contas quem se preocupa com isso? Outros já lá estão, tudo decorre com normalidade.
Sobre esta problemática da comunicação leia também no Operacional:
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