NÃO HÁ MILAGRES!
Por Miguel Machado • 27 Out , 2010 • Categoria: 02. OPINIÃO PrintO “Operacional” publicou uma reportagem sobre o exercício “Deep Divex 2010” mostrando aos leitores, daquilo a que assistimos e do que nos foi dito por alguns intervenientes, o que nos pareceu mais interessante. Isto foi possível, ao nosso site e à generalidade dos Órgãos de Comunicação Social que quiseram, porque a Marinha montou uma “operação mediática” para o efeito.
Isto nada tem de errado, bem antes pelo contrário no nosso entender, e hoje vamos dar aos nossos leitores algumas impressões sobre aquilo a que assistimos, nesta vertente mediática. E porquê? É quase um lugar-comum no meio militar, independentemente do ramo ou da patente do “queixoso”, do soldado ao general, ouvir qualquer coisa do género: estamos nós aqui a fazer este trabalho importantíssimo e ninguém nos liga nenhuma. Tudo e mais alguma coisa aparece no jornal e na televisão, e isto, nada!
O exercício “Deep Divex 2010” por muito importante que fosse, daria origem a este tipo de observações e acabaria desconhecido para quem nele não participou ou, no máximo, passado um mês ou dois, a Revista da Armada falaria do que ali se passou. Ou então, fruto de uma infeliz circunstância, possível mas não prevista, o exercício seria apenas motivo de notícia pelos piores motivos, um acidente grave. Na realidade o acidente aconteceu mas as notícias sobre o mesmo foram perfeitamente normais, sem dramatismo nem – do nosso ponto de vista – beliscar a imagem da Marinha, nem sequer dos militares belgas acidentados. Talvez até pelo contrário, uma vez que um dos acidentados foi apresentado como tendo salvo a vida ao seu camarada.
Aos olhos da opinião pública em geral e mesmo de muitos militares, estou certo que tudo isto lhes “entra em casa” (pela TV, Rádios, Jornais ou Internet), e é consumido sem pensar nem por um instante, porque assim foi?
A finalidade deste artigo é mostrar, muito sinteticamente com texto e imagens, porque é que há assuntos que são “bem cobertos” pela comunicação social e outros não. Este foi e é um bom “caso de estudo”.
Aqui chegados impõem-se duas notas prévias: aborda-se este caso porque foi este o presenciado e por nenhum outro motivo; nada do que a Marinha fez, internamente, antes, durante e depois do exercício, foi do nosso conhecimento, isto é mera observação exterior.
Como começa, para o visitante (jornalista), uma operação destas? É muito simples, a Marinha divulga na sua página na internet (e envia comunicado/convite aos OCS) com antecedência razoável, e não em cima da hora, que vai realizar o exercício. É bem possível ainda que contacte pessoalmente alguns jornalistas que sabe de antemão terem apetência por esta área “da Defesa”, ou que habitualmente trabalham na região do exercício, para lhes dar a informação e convidar. Neste caso como o exercício tinha lugar no Algarve, longe e Lisboa, este último aspecto terá sido bem equacionado.
A chegada ao local, na data acertada, a hora que depois do contacto telefónico feito – para Faro / Capitania – afinal foi ligeiramente rectificada em relação à inicialmente prevista, sabia-se que havia jornalistas presentes! Escrevo isto porque não seria a primeira vez que um jornalista chega a estas “operações” e uma qualquer falha de comunicação o leva a ouvir: quem? Desculpe mas não sei quem seja, e vem fazer o quê? Na dúvida, aliás, o tal contacto telefónico prévio antecipou a hora de chegada ao Ponto de Apoio Naval de Portimão. Imagino que terão pensado, como isto é gente que chega sempre atrasada, há mais convidados – entidades locais a quem a Marinha aproveitou para proporcionar uma visão da importância do seu trabalho – e o navio tem que largar a horas, é melhor antecipar.
Havia um oficial nomeado para acompanhar os jornalistas – o 1º Tenente Madeira, comandante do Destacamento de Mergulhadores Sapadores n.º 2 que não estava directamente empenhado no “Deep Divex”. Os jornalistas puderam andar sem problema por qualquer parte do navio, tanto quanto me tivesse apercebido, e o 1º Tenente Madeira estava mais interessado em explicar, informar do que em controlar ou evitar contactos dos jornalistas com os militares a bordo.
A viagem iniciou-se com os jornalistas a assistirem ao briefing inicial do dia – claro, não haja aqui inocências, nada de problemático foi abordado (não estamos a dizer que havia e foi omitido, mas certamente que se houvesse, seria deixado para outra altura), o que não quer dizer que o acidente do dia anterior não tivesse sido referido, foi, por um dos médicos navais presentes.
Durante a viagem até ao local de mergulho, os jornalistas aproveitaram para, literalmente, meter o nariz em tudo o que quiseram e obter imagens e declarações dos militares evolvidos e dos responsáveis pelo exercício. A bordo também o oficial de relações públicas da Marinha – Capitão-de-Fragata Maurício Barbosa – e o comandante da Esquadrilha de Submarinos – Capitão de Mar-e-Guerra, Gouveia e Melo – de quem dependem os Mergulhadores, o qual, por coincidência, foi também ele oficial de Relações Públicas da Marinha. O Comandante Gouveia e Melo – oficial mais graduado a bordo – além de acompanhar naturalmente as altas entidades civis a bordo, não deixou de falar com vários jornalistas e assumir as declarações oficiais sobre o acidente e mesmo sobre o exercício em si. Os médicos a bordo também estiveram sempre disponíveis para prestar informação sobre os assuntos que se prendiam com o acidente dos militares belgas e sobre um estudo que o Centro de Medicina Hiperbárica do Hospital da Marinha está a efectuar nesta área do mergulho profundo.
Ainda de realçar a presença a bordo – durante o exercício e não apenas neste dia – de dois militares do Gabinete de Imagem da Marinha com a missão, um de recolher fotografias (Cabo Joaquim Figueiredo) e outro de filmar (Cabo José Chorão): este material serviria para o ramo divulgar o exercício – o Youtube por exemplo quase de imediato – mas também para ceder aos jornalistas em caso de necessidade. Aconteceu com imagens/filme subaquático e da situação de emergência real.
Ou seja, até aqui, não faltou informação nem liberdade de movimentos. E assim iria continuar.
Chegados ao local dos mergulhos estava previsto, em duas viagens, a deslocação dos jornalistas bem junto aos mergulhadores – tanto quanto possível – a fim de facilitar a recolha de imagens. Note-se bem que sem isto, o impacto/qualidade das imagens recolhidas seria muito inferior. Isto é daqueles “detalhes” fundamentais para que se consigam boas imagens de uma situação que foge àquilo que acontece (inexplicavelmente e muitas vezes), que é os militares convidarem os jornalistas e depois (só no local), dizerem qualquer coisa do género: não têm tele-objectivas? Lamentamos mas não se podem aproximar!
Claro que há situações, por exemplo cerimónias militares, em que estas limitações são perfeitamente admissíveis senão mesmo desejáveis do nosso ponto de vista.
Neste dia os mergulhos foram claramente “dimensionados” para esta visita e cumpriram a sua obrigação: mostrar em pouco tempo e numa área limitada o que os mergulhadores de vários países podiam fazer. Houve ainda oportunidade de assistir a um treino de emergência num mergulho profundo a exigir o uso de uma câmara hiperbárica embarcada. Esta foi a “desculpa” para se falar do acidente e de explicar – senão tudo o que se passou, desconhecemos – pelo menos o essencial para não restarem dúvidas aos jornalistas presentes e satisfazer as suas perguntas, todas. A mensagem foi, em linhas gerais – e resultou, certamente por ser verdadeira, mesmo que eventualmente incompleta – a de que tudo está previsto, temos os meios, sabemos o que fazer, fizemos, isto é uma actividade arriscada, um mergulhador salvou o outro, vão ficar bem, o exercício continua.
Depois do trabalho, uma pausa para almoço, com os jornalista a comer o mesmo que “a tropa” (uma ração fria com sandes, fruta e sumo), regresso a Portimão com mais entrevistas a bordo onde oficiais com responsabilidade no exercício estavam disponíveis para falar.
Em conclusão, a Marinha em geral e os Mergulhadores em particular, passaram uma boa imagem da instituição e das suas capacidades, mesmo com um acidente pelo meio (o que não é assunto fácil de se lidar). Prepararam-se para isso, alocaram meios e pessoas a esta finalidade, criaram condições para os jornalistas fazerem o seu trabalho.
Apetece terminar a dizer, pois é, não há milagres! O que, infelizmente, nesta área da comunicação, ainda não é verdadeiramente aceite por todos.
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