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MORREU YVES DEBAY, REPÓRTER DE GUERRA

Por • 18 Jan , 2013 • Categoria: 11. IMPRENSA Print Print

Esta quinta-feira, 17 de Janeiro de 2013, morreu em Alep (Síria) Yves Debay, 58 anos de idade, um dos verdadeiros repórteres de guerra que, mês após mês, mostrava aos leitores da revista que dirigia, a “Assaut”, aquilo que os apaixonados da temática gostam de ver: o seu olhar sobre a realidade militar com belas fotografias e textos “terra-a-terra”.

Yves Debay (1954-2012), aqui em Kukavici na Bósnia-Herzegovina em 1996.

Yves Debay (1954-2012), aqui em Kukavici na Bósnia-Herzegovina em 1996.

Yves Debay cuja vida foi em muitos casos uma sucessão de incríveis aventuras, nem todas agradáveis, terá sido abatido pelos próprios rebeldes, uma das suas facções (*), quando cobria este conflito. Pelo que sabe através de diversas agências internacionais e do Observatório Sírio dos Direitos do Homem, Yves terá sido atingido na cabeça, numa rua de Alepo onde se travavam combates entre as duas facções em conflito. O seu corpo terá sido identificado no hospital da cidade pela documentação que transportava e transferido para a fronteira com a Turquia.

Com os pára-quedistas portugueses do 2.º Batalhão de Infantaria Aerotransportado na Bósnia em 1996. Desta reportagem, muitos anos depois, Yves recordava "arrepiado" a viagem de Chaimite com temperaturas negativas!

Com os pára-quedistas portugueses do 2.º Batalhão de Infantaria Aerotransportado na Bósnia em 1996. Desta reportagem, muitos anos depois, Yves recordava "arrepiado" a viagem de Chaimite com temperaturas negativas!

O “curriculum” de Yves Debay é longo e perde-se a conta aos conflitos ou simples operações militares que cobriu para revistas da especialidade. Yves não era um repórter da imprensa generalista nem das grandes cadeias noticiosas – que frequentemente “atacava” nos seus textos pelo modo como cobriam as guerras – era um antigo militar (nasceu no Congo Belga e terá servido depois nas forças de segurança da Rodésia), que dedicou a vida a fazer reportagens sobre temas militares. Tendo-se distinguido na revista “Raids” que ajudou a fundar e da qual foi um dos principais repórteres de 1986 a 2008, quando abandonou esta revista do Grupo Histoire & Collections e fundou a “Assaut“.

Durante mais de 20 anos publicou vários livros e escreveu milhares de artigos em inúmeras revistas, sempre sobre aquilo que via não só nos conflitos que cobriu – praticamente todos neste período – mas também e muito, pelas reportagens em unidades militares, sobretudo em França mas também um pouco por todo o mundo.
Depois de ter saído da “Raids”, onde as suas foto-reportagens deliciaram milhares de leitores em todo o mundo – nesta revista os artigos são essencialmente técnicos e não havia possibilidade de inserir grande opinião – a sua faceta mais “politica” levou-o a sair e a fundar a “Assaut”, à sua medida. Assumindo ele próprio os custos da publicação, manteve-se até agora com pouca publicidade e muito baseado nas vendas e assinantes, tendo este mês sido publicado o n.º 80. Numa idade e com um estatuto em que muitos procuram cargos de direcção ou trabalhos mais apoiados e seguros, Yves continuava, como sempre, na linha da frente, à sua maneira. Muito experiente nestas situações, não é difícil prever que aquela malfadada percentagem de possibilidades que sempre há de as coisas correrem mal,  mesmo quando se fazem as coisas bem, aconteceu mesmo. A seu tempo poderemos vir a saber.

Sendo uma pessoa amável e bem-disposta, aquilo que em português podemos designar por “um tipo porreiro”, sempre disposto a beber uma belas cervejas com a tropa, não fugia a uma boa (ou má!) polémica. Politicamente incorrecto não perdia uma oportunidade nos seus editoriais na “Assaut” para desancar nos políticos dos nossos dias, na excessiva protecção (em França) aos marginais e aos parasitas, e a perseguição que as autoridades fazem ao cidadão normal, pagador de impostos, quando “bebe uma cerveja a mais ou excede um pouco o limite de velocidade para ir trabalhar”.

Viu-se ao longo das reportagens que fez, envolvido em vários incidentes e detalhes pouco claros, quer durante a guerra civil na antiga Jugoslávia, quer no Iraque, tendo em ambos os casos sido preso e mais tarde libertado. Tinha muitos defensores e admiradores mas também quem o detestava e o acusava de ser mais militante de extrema-direita e militar que jornalista!

A defesa dos soldados de França era para Yves ponto de honra e mesmo que por vezes criticasse a instituição militar e chegasse até a ridicularizá-la em determinados aspectos, nunca o fazia em relação aos soldados, aos militares que andam com a “botas no chão”. As últimas boas festas da “Assaut”, por exemplo, estão dedicadas a: “88 de nos soldats sont morts pour la France en Afghanistan“. Todos os soldados franceses que morriam em operações tinham referência na revista.


Por fim uma nota pessoal. Conheci Yves Debay na Bósnia em 1996 quando prestava serviço no Bureau Communication Information da Division “Salamandre” e me coube acompanhá-lo ao sector do 2.º Batalhão de Infantaria Aerotransportado. A ideia com que fiquei foi a que acima transcrevi, “um tipo porreiro”. Era um amigo de Portugal, onde aliás ainda recentemente esteve a cobrir o “Hotblade 2012”, e em 1996 ainda voltamos a almoçar juntos em Sarajevo e a trocar películas 35mm/slides! Depois disso mantivemos correspondência, sempre que tinha necessidade de alguns dados sobre Portugal e as nossas Forças Armadas. A última vez que o vi, foi na TV, durante o conflito na Líbia.

Não só a ele, bem entendido, mas muito a Yves Debay se deve um certo estilo na reportagem sobre forças militares, quer nas fotos quer no texto. É para muitos, e também para nós, a visão ao “nível do terreno” aquilo que realmente interessa, aquilo que Yves Debay nos mostrava.

Vai fazer falta!

Deixo aqui partes de reportagens de Yves Debay, na RAIDS (Bósnia 1996) e na ASSAUT (Afeganistão 2006), em que os portugueses, pára-quedistas e comandos, são referenciados. O pessoal, o armamento e equipamento, as viaturas, a organização, tudo isto era sempre parte importante nos artigos de Yves. Depois da Raids, também considerações de ordem politica e geoestratégia e das suas apreciações pessoais, passaram a constar dos textos. Era ainda um observador atento da problemática da relação entre jornalistas e a instituição militar.

Bósnia 1996

Bósnia 1996 - RAIDS

Bósnia 1996 (RAIDS)

Bósnia 1996 (RAIDS)

Bósnia 1996 (Raids)

Bósnia 1996 (Raids)

Afeganistão 2006 (ASSAUT)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Afeganistão 2006 (Assaut)

Leia aqui sobre a morte de Yves Debay, em dois blogues em língua francesa:

La mort d’Yves Debay, reporter de guerre

Le Wildcat tué à Alep ?

Comunicado do Presidente da Republica de França sobre a morte de Yves DEBAY.

(*) Esta parte do texto foi alterada em 01MAR2013 pelas novas informações que nos chegaram via publicação do n.º 81 da Assaut e que abaixo deixamos cópia.

Yves Debay terá sido assim friamente assassinado e não vitima de um sniper sírio.

Yves Debay terá sido assim friamente assassinado e não vitima de um sniper sírio.


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