MORREU JEAN LARTÉGUY
Por Miguel Machado • 25 Fev , 2011 • Categoria: 01. NOTÍCIAS PrintMorreu no passado dia 23 de Fevereiro de 2011, o escritor e jornalista francês Jean Pierre Lucién Osty, conhecido mundialmente pelo pseudónimo de Jean Lartéguy. Mais de 50 obras publicadas entre 1960 e 1996, algumas grandes sucessos, tornaram este antigo militar e jornalista num dos melhores escritores de “romances de guerra” deste período.
Jean Lartéguy contava 90 anos de idade e estava hospitalizado numa instituição militar francesa (Les Invalides), um “Lar de Veteranos Militares”, que o havia acolhido mesmo não sendo militar. Mas havia sido e por várias vezes. No inicio da 2ª guerra mundial alistou-se na infantaria francesas mas foi desmobilizado depois da derrota. Fugiu da França ocupada em 1942 e rumou ao Marrocos onde se voltou a alistar e desembarcou em França, na Provença em 1944, integrando os “Commandos d’Afrique” das Forças Francesas Livres. Desmobilizado em 1945 como Alferes volta a alistar-se no Batalhão de Voluntários Franceses que vão combater na Coreia (1950-1953). Regressa como Capitão e ferido em combate (em 1951) e abandona o Exército.
Iniciou de seguida uma carreira como jornalista, cobrindo para a Paris-Press e depois para o Paris-Match vários conflitos como as guerras da Palestina, Indochina e da Argélia. Licenciado em História foi premiado pelas suas qualidades como jornalista (com o prémio Albert Londres para jornalistas francófonos em 1955) como também já havia sido condecorado pela sua acção quer na Resistência à ocupação quer na guerra. Era Cavaleiro da Legião de Honra. Dos trabalhos como jornalista destaca-se uma série no Paris-Match designada “Notre Indochine 10 ans après“, onde acompanha a guerra do Vietname com os militares americanos. Sem dúvida desta estadia saiu também a inspiração para o seu romance “Un Million de dollars le Viet“.
Os seus livros, sobretudo os publicados nos anos 60 marcaram uma geração em França mas também um pouco por todo o Ocidente. Jean Lartéguy descreveu como ninguém os conflitos da Indochina e da Argélia, vistos sob o prisma dos combatentes, a visão daqueles que enfrentavam o inimigo na selva ou no deserto. Seguiram-se obras também marcantes passadas nas guerrilhas sul-americanas ou com os mercenários em África. É bem verdade que Lartéguy apresentava de algum modo uma visão romântica da guerra mas também politicamente incorrecta. Ele havia-a conhecido e sabia escrever sobre ela e sobre o muito desencanto que havia em gerações de oficiais que combatiam e morriam pelas colónias, quase e sempre “atraiçoados” pelos “homens do Estado-Maior”, os carreiristas e pelos políticos. Regra geral também as relações amorosas destes militares tinham um lugar no enredo, nem sempre com final feliz.
Embora Lartéguy referisse sempre que os seus personagens eram imaginários, logo em “Os Centuriões” era evidente ter um dos seus personagens sido “decalcado” de Marcel Bigeard. Este romance foi depois adaptado para o cinema num filme que foi interpretado por Antonhy Quinn e Alain Delon.
“Os Centuriões” e outros livros desta época foram de tal modo considerados que em Portugal a sua leitura era aconselhada aos militares que partiam para África. Os seus textos mesmo que ficcionados, tinham uma enorme e motivadora força.
Segundo o próprio estava assim dividida a sua relação com a guerra: (em tradução livre), “A guerra que me contaram” (o pai e o tio que haviam combatido na 1.ª Guerra Mundial), “A guerra que eu combati” (a 2.ª Guerra Mundial e a Guerra da Coreia) e a “A guerra sobre a qual escrevi” (em que ele relata o que viu como repórter um pouco por todo o mundo em guerras e revoluções mas também os romances baseando-se na sua experiência pessoal e nestas reportagens e paragens).
Das muitas obras editadas em português algumas com edições sucessivas até finais dos anos 80, podemos citar, “Os Centuriões“, “Os Pretorianos“, “Tambores de Bronze“, “As Quimeras Negras“, “Os Mercenários“, “Guerrilheiros“, “Libertadores“, “Cidade Estrangulada“, “Inquérito a uma Crucificação“, “As Muralhas de Israel“, “Todo o Homem é uma Guerra Civil“, “O Comandante do Norte” ou “Marco Polo, Espião de Veneza“.
O seu primeiro romance em 1954, “Sangue Sobre as Colinas” (passado na guerra da Coreia) passou despercebido e mais tarde, já depois de vários êxitos, voltou a ser publicado com o nome “Mercenários“.
Em “Os Centuriões“, antes do romance começar, Jean Lartéguy escreveu :
“Conheci muito bem os centuriões das guerras da Indochina e da Argélia. Durante algum tempo, fiz parte deles, depois, jornalista, tornei-me sua testemunha, por vezes seu confidente.
Sentir-me-ei para sempre ligado a estes homens, mesmo que um dia deixe de estar de acordo com eles quanto ao caminho que seguirem, mas não me sinto de forma alguma obrigado a deles dar uma imagem convencional e embelezada.
Este livro é acima de tudo um romance, cujas personagens são imaginárias. Elas poderão, acidentalmente, por qualquer feição ou qualquer aventura, recordar este ou aquele dos meus antigos camaradas tornado célebre ou morto incógnito. Mas não há nenhuma destas personagens à qual se pudesse, sem logro, dar um nome. Em contra-partida, os factos, as situações, os cenários são quase todos extraídos da realidade e fiz o possível por me cingir às datas verdadeiras.
Dedico este livro à memória de todos os centuriões que pereceram para que Roma sobreviva”.
Miguel Machado é
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