DEFESA: POOLING & SHARING IBÉRICO
Por Miguel Machado • 6 Set , 2012 • Categoria: 02. OPINIÃO PrintFoi sugerida publicamente pelo Ministro da Defesa Nacional, em 5 de Setembro último, uma nova abordagem da cooperação militar que já existe entre Portugal e Espanha. Aguiar Branco terá dito que poderíamos, os dois países, “edificar capacidades militares“, justificando que “não podemos ter a ilusão de que, sozinhos, vamos ter força para poder ser atores de segurança, já não secundários mas irrelevantes, como é exigível em termos de defesa nacional“.
Este assunto pode ser abordado por vários ângulos, do histórico ao económico, do diplomático ao cultural, do estratégico ao estritamente militar. Vou-me cingir a uma parte deste último.
Portugal e Espanha são aliados e amigos, temos inúmeras actividades de cooperação, nomeadamente exercícios e cursos, há inclusive militares portugueses integrados em Espanha (Valência) numa unidade multinacional de comando espanhol (Cuartel General de Cuerpo de Despliegue Rápido de la Alianza Atlántica), já tivemos militares espanhóis sob comando português e vice-versa, por exemplo na EUROFOR em Itália (o comando era rotativo – Itália, França, Espanha e Portugal), temos militares de ambos os países a trabalhar em conjunto em vários quartéis-generais multinacionais, mas, quanto a operações reais nas missões expedicionárias, Portugal nunca aceitou colocar unidades nacionais sobre comando espanhol directo.
Foram várias as operações em que participamos lado-a-lado, mas a realidade é que as nossas pequenas forças (batalhões ou companhias), nunca integraram as brigadas espanholas, da Bósnia ao Líbano, passando pelo Kosovo, uma vez que, regra geral, o país vizinho entra nestas operações com efectivos muito superiores aos nossos. Não raras vezes esta dependência das unidades portuguesas terá sido mesmo um dos aspectos mais delicados nas negociações que sempre antecedem a constituição das forças multinacionais.
Nada de mal-entendidos, no terreno há bom ambiente e colaboração entre os militares dos dois países. Mas também não há dúvida que, apesar da já aludida diferença de dimensão e capacidade militar envolvida em operações, olhamos sempre para os nossos vizinhos, aliados e amigos, como iguais. Mesmo que, “uma vez ou outra”, lá temos que lhes pedir ajuda: assim ao correr da pena recordo apoio pedido na Croácia, para descarregar um navio, tarefa para a qual não tínhamos equipamento; a nossa primeira missão no Afeganistão (Destacamento Sanitário Português, alguém se lembra?) chegou ao país em avião militar espanhol; no mesmo Afeganistão, tivemos que alugar viaturas ao “Ejército de Tierra” espanhol durante um ano porque as nossas estavam “a blindar” em Israel e não chegaram a tempo da missão; e, ainda nesta missão, uma multinacional espanhola fornecia alimentos aos nossos militares. Contra pagamento, claro.
A questão das parcerias coloca-se sempre na igualdade. E é assim que se passa por exemplo com franceses e ingleses, ou franceses e alemães, ou belgas e holandeses e por aí adiante. E quando a reciprocidade não existe, quem recebe algo e nada dá em troca, o que recebe paga em dinheiro. Fora disto, só “acordos de cavalheiros” que se conseguem quando algum de nós – invariavelmente o mais fraco – está aflito e pede ajuda.
Assim sendo, esta espécie de aprofundamento do “Pacto Ibérico”, não sendo uma impossibilidade deverá desde logo assentar nisto: igualdade.
O que não vai ser fácil. Teremos que identificar as capacidades militares que faltam ao país vizinho e que nós tenhamos; em troca, o que terão as Forças Armadas de S. Majestade o Rei D. Carlos que Portugal necessite? Ou, então, o que faltará a ambos que possamos edificar em conjunto?
Olhando para as Forças Armadas Espanholas e para o complexo militar-industrial de Espanha, parece-me que este Pooling & Sharing Ibérico, não sendo impossível, não se afigura nada fácil…para Portugal.
Miguel Machado é
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