BÓSNIA 96, AS OPINIÕES “PRÓ E CONTRA”, NA IMPRENSA ESCRITA EM 1995
Por Miguel Machado • 13 Jan , 2016 • Categoria: 11. IMPRENSA PrintA participação militar portuguesa nos Balcãs com uma força de combate numerosa, esteve longe de ser consensual quer no panorama político nacional quer na opinião pública. Hoje fazemos uma “resenha” de opiniões, contra e a favor, que foram publicadas em 1995 na imprensa escrita, mesmo nas vésperas da partida do contingente português para a missão IFOR/NATO.
Enquadramento
As Forças Armadas Portuguesas já vinham participando em algumas missões de apoio à paz desde 1991, primeiro na ex-Jugoslávia e depois em África (Moçambique em Angola), mas sem envolver unidades de combate. Monitores/observadores, aeronaves e navios em missões no Adriático, unidades de transmissões e logísticas para África, foram missões sem dúvida importantes, mas com efectivos relativamente reduzidos senão mesmo simbólicos em alguns casos. A política do governo de então (Novembro de 1985 a Outubro de 1995, PSD) era claramente contrária ao empenhamento militar robusto ao lado dos nossos aliados em operações que causavam mortos e custavam muito dinheiro. No entanto era perceptível que Portugal, país da NATO, dificilmente podia “fugir” a empenhar tropas se a Aliança marchasse para a ex-Jugoslávia como se vinha a configurar com os sucessivos fracassos das Nações Unidas nesta região martirizada pela guerra. Foi assim ainda com o governo PSD que as Forças Armadas iniciaram a preparação de uma força para eventual emprego na ex-Jugoslávia, e era voz corrente que esta só avançaria se a missão atribuída fosse “retirar do vespeiro balcânico o acossado contingente das Nações Unidas”.
Acontece que o governo PSD foi substituído em Outubro de 1995 por outro do PS e a decisão política foi a de participar com uma força credível na missão da NATO que se esperava trouxesse finalmente a paz à Bósnia e Herzegovina. Os Acordos de Dayton (Novembro de 1995) e Paris (Dezembro 1995) definiram as novas “regras do jogo” e a NATO decidiu avançar e em força. Foi constituída uma força com 60.000 militares, e Portugal comprometeu-se com mais de 900. Eram da Brigada Aerotransportada Independente, os mesmos que já estavam a treinar para a eventual operação de “extracção” dos militares das Nações Unidas. Passavam agora a ultimar a preparação para rumar à Bósnia, mas para ficar no mínimo um ano. Com o historial de guerra que havia naquela região da Europa, de acordos desrespeitados, o estatuto que a NATO deu à sua Implementation Force (IFOR) foi mesmo desenhado para o emprego da força militar em caso de necessidade com regras de empenhamento “agressivas”.
A opinião publicada em Portugal
Desde 1994 mas com maior incidência em 1995, na imprensa portuguesa contrapunham-se as opiniões politicas contra e a favor desta intervenção da NATO (e de Portugal). Simplificando, pode dizer-se que a extrema-esquerda (MRPP e UDP) e o Partido Comunista eram frontalmente contra, os sectores mais à direita no espectro político (CDS), também, o PSD tinha gente nos dois campos e no PS ou na sua quase totalidade, defendia-se a participação na missão. Se à esquerda se dizia que Portugal ia fazer um favor aos americanos e que nada tínhamos a ver com a Bósnia, à direita, contrapunha-se que nada tínhamos a ver com a Bósnia e que o nosso esforço devia ser canalizado para apoiar o regresso à paz em África (nas antigas colónias). Os intervencionistas defendiam que só assim a paz regressaria à Europa e não podíamos deixar de dar o nosso contributo para esse nobre desiderato.
Do ponto de vista estritamente militar o Exército esforçava-se por mostrar à opinião pública que tinha capacidade, que a reestruturação em curso – “grosso modo” desde 1992/3 e que tinha incluído a transferência das tropas pára-quedistas da Força Aérea para o ramo terrestre, e às quais agora renomeadas de “aerotransportados”, iria precisamente competir esta missão – tinha tornado o ramo mais capaz, afastando-se das dúvidas instaladas na sociedade (e quem sabe nos governos) aquando da não intervenção na “primeira guerra do golfo” (1990/1991).
Foi com este pano de fundo na opinião publicada que os militares se prepararam e partiram para a missão. A influência destas opiniões a nível das chefias militares e da direcção politica do país, não terão sido significativas, mesmo que se admita poderem ter originado alguma ponderação num ou outro caso expresso. Pode-se contudo afirmar hoje com absoluta segurança que estas opiniões não interferiram minimamente no desenrolar das acções de preparação da força. Já a nível familiar é legítimo supor que parte das pressões que muitos sofreram para não integrar a missão, na altura entendida como de elevado risco, daqui e de noticias dos jornais, rádios e televisões podem ter tido origem. Contam-se no entanto pelos dedos de uma mão os militares que desistiram de participar. O factor humano garantido pelos “aerotransportados”, cerca de mil voluntários, nunca esteve em causa, a motivação dos militares manteve-se sempre a nível muito elevado.
Esta resenha que agora recuperamos foi toda publicada em 1995, antes da partida dos militares e recolhe as principais opiniões contra e a favor do envolvimento que se veio a verificar. Logo no inicio da operação, em Janeiro de 1996, o acidente que provocou a morte a dois militares portugueses veio trazer às páginas dos jornais nova “avalanche” de opiniões, as quais, na altura própria, também publicaremos aqui no Operacional.
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