AFEGANISTÃO: OMBRO A OMBRO COM OS “NUESTROS HERMANOS”
Por Miguel Machado • 28 Dez , 2010 • Categoria: 04 . PORTUGAL EM GUERRA - SÉCULO XXI, EM DESTAQUE PrintPortugueses e espanhóis têm uma longa história de cooperação militar, mas nas operações reais, no exterior, tal não acontece. Ninguém o admite mas na realidade sempre que se fala da constituição de uma nova força multinacional para actuar num qualquer ponto do planeta, espanhóis e portugueses acabam sempre por ficar sob comandos diferentes…por “acaso”. Mas “no terreno” as coisas acontecem e aqui fica mais um caso.
Ombro a ombro contra o inimigo comum
Sendo verdade que os militares portugueses e espanhóis têm uma longa história de cooperação, sobretudo em exercícios bilaterais e no âmbito da NATO, e também com a colocação de quadros, alguns de elevada patente, em quartéis-generais da Aliança instalados em ambos os vizinhos Ibéricos, a realidade é que não tem havido nas operações reais no exterior, grande oportunidade para ver espanhóis e portugueses a trabalhar lado a lado. Oficialmente ninguém o admite mas a realidade é que, talvez por “mero acaso”, sempre que se fala da constituição de uma nova força multinacional para actuar num qualquer ponto do planeta, espanhóis e portugueses acabam sempre por ficar sob comandos diferentes…por “acaso”, certamente. Bósnia, Kosovo, Afeganistão e Líbano, são alguns dos exemplos que nos ocorrem.
No entanto, invariavelmente, quando se encontram “no terreno”, as relações e a cooperação, mesmo a entreajuda, decorre não só da melhor forma como se reforçam laços de amizade já existentes ou se criam novos, fruto sem dúvida das muitas afinidades entre os dois povos.
Quem estas linhas escreve foi testemunha directa deste facto, pelo menos em 1996, na Bósnia-Herzegovina, mas em 2007, novas “provas” de uma situação prática foram recolhidas!
Na realidade nesta missão que hoje aqui trazemos, no Afeganistão, pára-quedistas portugueses, frequentemente, utilizaram helicópteros espanhóis. Aqui fica para a história, em síntese, o que portugueses e espanhóis fizeram em conjunto naquelas paragens e que constituiu, esta missão ISAF, sem dúvida, a primeira vez em muitos e muitos anos, na qual militares de ambos os países, porque não dizê-lo, combateram “ombro a ombro” contra um inimigo comum.
A bordo dos Super Puma/Cougar
A QRF (Quick Reaction Force) portuguesa – na altura pertencente ao 1º Batalhão de Infantaria Pára-quedista da Brigada de Reacção Rápida e um Destacamento de Controlo Aéreo Táctico da Força Aérea – foi várias vezes deslocada de Cabul para outras regiões do teatro de operações onde o comandante da ISAF entendia ser necessário reforçar ou substituir as unidades que aí se encontravam. Foi nessas ocasiões que os páras portugueses actuaram com os Super Puma/Cougar espanhóis.
Recebida a ordem para empenhar a companhia portuguesa no então chamado Comando Oeste (Herat e Farah), foi nos hélis espanhóis que os pára-quedistas portugueses fizeram os primeiros reconhecimentos aéreos à área de operações. E as operações nesse comando repetiram-se por três vezes, tendo sempre havido, previamente a cada operação, os necessários reconhecimentos. Diz-nos o major pára-quedista João Bernardino, oficial responsável pelo Centro de Operações da força portuguesa: “…foi um apoio importante porque nos deu uma visão mais esclarecida da área onde íamos actuar… … Os riscos para os hélis era elevado, o terreno tem montanhas de grande elevação sendo necessário contorná-las. O perigo de existirem atiradores nestas montanhas era grande pois os hélis transformam-se em alvos fáceis nestas circunstâncias. As fortes tempestades de areia que se faziam sentir, nesta região desértica, também colocavam em risco as aeronaves, pois a areia entranha-se nos motores e os pilotos ficam sem visibilidade. Existia ainda a ameaça de os insurgentes terem mísseis terra-ar…”
Os portugueses utilizaram os helicópteros espanhóis estacionados na Forward Support Base de Herat, sendo uma das esquadras, a da Força Aérea Espanhola, equipada com meios de suporte de vida para operações de evacuação aérea sanitária (AIR MEDEVAC), e a do Exército Espanhol, pronta para transporte de pessoal e material. Enquanto no primeiro caso a tripulação era composta por 2 pilotos, 1 mecânico, 2 atiradores de metralhadora (um em cada porta lateral) e uma equipa médica (um paramédico e 2 enfermeiros), no segundo era idêntico mas sem a equipa médica.
Durante as operações na região de Farah alguns helicópteros deslocaram-se mesmo da sua base e ficaram estacionados do PRT (Provincial Reconstruction Team)(1) de Farah de modo a melhor apoiar os páras portugueses.
Continua o major Bernardino “…Durante as operações desencadeadas pela nossa força na região de Farah, tivemos sempre o apoio destas duas esquadras, quer para fazer face a uma possível AIR MEDEVAC ou para apoiarem transportando sobressalentes e alimentos. Chegaram inclusive a transportar as nossas equipas avançadas de mecânicos para, no meio de nada, reparar viaturas….”
Embora o transporte de meios pesados e viaturas desde Cabul tenha sido naturalmente assegurado por aeronaves C-130, por exemplo italianos o transporte de pequenos destacamentos da companhia e cargas críticas, como munições, na área de operações Oeste, também foi várias vezes assegurado pelos Super Puma/Cougar.
E termina o major Bernardino com autoridade que lhe conferiam duas missões na Bósnia, uma em Timor-Leste, e 6 meses de Afeganistão (e em 2010 no Kosovo) “…O planeamento era executado entre as tripulações e o nosso pessoal no dia anterior à missão. No dia da operação, um dos tripulantes fazia um brieifng de segurança e íamos para o ar. O relacionamento foi sempre excepcional, o que por vezes contribuiu para ultrapassar problemas burocráticos e outros. Os militares espanhóis tinham um excelente relacionamento com o nosso pessoal e mostravam-se sempre disponíveis para nos ajudar. Cumprimos muitas missões em zonas inóspitas, em pleno deserto de vastas regiões do Afeganistão, e sabíamos que em caso de necessidade podíamos contar com os HELIS das esquadras espanholas…“.
Os pára-quedistas terminaram o seu período de 6 meses ininterruptos no Afeganistão em Março de 2007, tendo executando dezenas de operações quer na área do Comando Regional de Cabul quer nos Comandos Regionais Oeste (Herat e Farah) e Sul (Kandahar). Falando com alguns dos envolvidos nessa operação anti-subversiva não é difícil perceber que das muitas recordações que trouxeram, e das experiências que acumularam, algumas das mais marcantes foram certamente as recolhidas “ombro a ombro” com os aviadores do exército e da força aérea espanholas.
(1)Podemos dizer que os PRT são “unidades” (com forças de um ou mais países da NATO e onde se encontram outras organizações internacionais) que estão numa povoação a ajudar a reconstruir as suas infra-estruturas básicas e a providenciar segurança.
Quer ler mais sobre os militares portugueses no Afeganistão? Clique em:
AFEGANISTÃO: INTERNATIONAL CIVILIAN CONSULTANT
NOVA MISSÃO NACIONAL NA ISAF/NATO
NOVOS CONTINGENTES PARA KOSOVO E AFEGANISTÃO
AFEGANISTÃO: O QUE ESTÃO LÁ A FAZER?
AFEGANISTÃO: UNIDADE DE PROTECÇÃO DA FORÇA EM OPERAÇÕES
NATO TV FAZ REPORTAGEM COM PORTUGUESES
“PROTEGER A POPULAÇÃO É A MISSÃO”
A TP9/MP9 À EXPERIÊNCIA NO AFEGANISTÃO
MAIS MILITARES PORTUGUESES PARA O AFEGANISTÃO
CONTROLADORES AÉREOS AVANÇADOS EM COMBATE
MILITARES PORTUGUESES MORTOS EM MISSÕES DE PAZ
Miguel Machado é
Email deste autor | Todos os posts de Miguel Machado