A FRAGATA “ORP GEN. T. KOSCIUZKO” EM LISBOA
Por Miguel Machado • 14 Set , 2016 • Categoria: 03. REPORTAGEM, 07. TECNOLOGIA, EM DESTAQUE
Não sendo vulgar a passagem por Lisboa de navios de guerra da República da Polónia, a possibilidade de visitar a fragata ORP Gen.T.Kosciuszko despertou-nos a curiosidade, e já agora, também porque se tratava de uma Oliver Perry, a classe de navios que em 2003 Portugal esteve para adquirir aos EUA, tendo depois optado pelas holandesas Karel Doorman.
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A ORP General Tadeusz Kosciuszko, na Rocha do Conde de Óbidos, em Lisboa, no passado dia 8 de Setembro. Entrou ao serviço da US Navy em 1980 como USS Wadsworth (FFG-9) e na Polónia em 2002.
Relações públicas cuidadas
A visita à fragata ORP General Tadeusz Kosciuszko decorreu no dia 8 de Setembro e teve lugar na Rocha do Conde Óbidos em Lisboa. Após uma verificação de segurança muito ligeira, os poucos visitantes foram agrupados em pequenos grupos, acompanhados por um marinheiro – no nosso caso uma militar – que num inglês muito razoável deu as boas-vindas a bordo e fez uma explicação básica sobre o navio e os seus sistemas de armas, bem assim como a missão em curso. O ORP Gen.T.Kosciuszko esteve em Lisboa integrado no Standing NATO Maritime Group 2 (SNMG 2), força à qual se juntou em Julho e que em breve deixaria com o regresso ao seu porto de partida, em Gdynia, no Mar Báltico, a principal base naval da Marinha de Guerra da Polónia, a Marynarka Wojenna.
A visita embora limitada – no interior, apenas os hangares dos helicópteros e um dos corredores de passagem, constava do circuito – permitia ficar com uma ideia dos principais sistemas de armas do navio (com excepção do canhão 76mm), e não houve qualquer limitação à recolha de imagens. Também a disponibilidade da guia para responder a questões era total e procederam à distribuição de algum merchandising e de material impresso de muito boa qualidade (em português) sobre a Polónia, e sobre a NATO (em polaco), e em suporte papel de grande qualidade e também suporte digital, sobre as suas Forças Armadas (em polaco, inglês e francês).
Como a guia teve o cuidado de referir logo no inicio, a fragata não é um navio recente, embora esteja aparentemente bem mantida e cuidada. Entrou ao serviço da US Navy em 1980 como USS Wadsworth (FFG-9) e na Polónia em 2002 como ORP Gen.T.Kosciuszko (FrR 273). O general Tadeusz Kosciuzko (1746-1817) foi um “…herói de ambas as nações – Polónia e EUA, tem mesmo uma ponte em Nova Iorque com o seu nome – que participou na Guerra da Independência americana, aliás deixou como seu executor testamental Thomas Jefferson (terceiro presidente dos EUA), mas também combateu na Polónia contra o Império Russo e contra o Reino da Prússia, como comandante supremo das forças polacas…”, segundo informação disponibilizada a bordo e que termina da seguinte maneira “…ele deixou o seu dinheiro e prosperidade na América para comprar a liberdade de escravos negros, incluindo os de Jefferson, para os educar no sentido de serem autónomos na vida e no trabalho”. O general é na realidade um herói nacional e o seu nome está ligado também a várias unidades do Exército, como patrono.
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Em primeiro plano, ao centro, o principal sistema de armas no navio e o que em boa verdade lhe dá a classificação de “lança-mísseis”, o GMLS (guided missile launching system ), Mk 13 Mod 4.
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O GMLS Mk 13 Mod 4, aqui sem qualquer míssil acoplado, pode disparar quer os SSM Harpoon quer os SAM SM-1MR.
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Integrada no Standing NATO Maritime Group 2, ostenta a insígnia da Aliança Atlântica. Por cima da ponte de comando uma das 4 WKM-B 12.7mm que equipam o navio.
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Um dos dois reparos triplos MK 32 para torpedos, e a embarcação semi-rígida que permite, por exemplo, a fiscalização a outras embarcações.
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A heráldica oficial do navio, idêntica à usada pela família Kosciuszko, e logo ali ao lado, duas figuras, um urso polar que simboliza a passagem do navio pelo Ártico e o carneiro (?) que…não nos souberam explicar.
Missão e características
A missão desta fragata, classificada como “lança-mísseis”, é a de patrulhar as linhas de comunicações navais usadas pela marinha mercante e proceder a escoltas. Tem capacidade para luta anti-aérea, anti-submarina e de superfície. Desde que acompanhada por navios de reabastecimento pode desempenhar a sua missão em qualquer parte do mundo.
A FrR 273 tem as seguintes características principais:
Comprimento: 135,6m (a título de comparação as “Vasco da Gama” 115,9m e as “Bartolomeu Dias” 122,25m)
Deslocamento: 3.650 toneladas
Velocidade máxima: 29 nós e velocidade de cruzeiro de 20 nós, tendo a esta última velocidade um “alcance” de 4500 milhas náuticas (8.334 km)
Propulsão: 2 turbinas de 29,828 kW
Armamento:
– Mísseis SSM (surface-to-surface missile) Harpoon capazes de atingir alvos a 95km de distância;
– Mísseis SAM (surface-to-air missile), SM-1MR (Standard Missile Medium Range), capazes de atingir alvos a 38 km de distância:
– Ambos os tipos de mísseis podem ser lançados do mesmo GMLS (Guided Missile Launching System), o Mk 13 Mod 4.
– Canhão 76 mm Oto Melara Mk 75, que pode fazer fogo anti-aéreo (até aos 12 km) e anti-superfície (até aos 16km), com uma cadência de 80 tiros por minuto;
– Canhão 20 mm Mk 15 Vulcan Phalanx, Close-In Weapon System, de 6 canos com uma cadência de 3.000 tpm;
– 4 metralhadoras pesadas WKM-Bm calibre 12,7×99 NATO;
2 lançadores triplos Mk 32, calibre 324mm, para torpedos Eurotorp UM-90, capazes de atingir alvos a 25km de distância, com uma velocidade de 29 a 50 nós.
O navio pode embarcar 2 helicópteros Kaman SH-2G Super Seasprite (neste caso apenas um estava a bordo), os quais têm como missão primária a luta anti-submarina, mas desempenham várias outras como busca e salvamento, luta anti-navio, transporte de pessoal e operações especiais.
O ORP (Okręt Rzeczypospolitej Polskiej – Navio da República da Polónia) Gen.T.Kosciuszko, tem uma guarnição de 17 oficiais e 198 sargentos e praças.
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A metralhadora pesada WKM-B 12.7 mm x 99 NATO (.50 BMG), para bater alvos a muito curta distância. Pode ser usada por exemplo no âmbito das missões anti-pirataria ou para defesa contra ataques com pequenas embarcações no âmbito da luta contra o terrorismo. A arma estava sem o sistema de pontaria acoplado.
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A peça 76 mm Oto Melara Mk 75, que pode fazer fogo anti-aéreo (até aos 12 km) e anti-superfície (até aos 16km), com uma cadência de 80 tiros por minuto. Não deixa de ser curiosa a localização escolhida para instalar este armamento.
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Esta foto ilustra bem aquilo que não se vê nos modernos navios de guerra: uma parafernália de equipamento! e estruturas! O desenho dos actuais navios de guerra, “fechados”, diminui drasticamente a sua assinatura radar/infra-vermelha/acústica, melhorando a sua capacidade de sobrevivência face aos modernos sistemas de armas, por dificultar a sua localização.

A fragata pode transportar 2 Kaman SH-2G Super Seasprite tendo para isso dois hangares (um tem a porta aberta), com acesso directo ao convés de voo. Note-se ainda o Vulcan Phalanx com a sua silhueta característica por cima dos hangares. A bandeira à popa é a Bandera Wojenna (a Bandeira de Guerra da Marinha).

20 mm Close-In Weapon System Mk 15 Vulcan Phalanx, capaz de disparar 3.000 tpm. Trata-se de uma arma concebida para destruir alvos aéreos, como misseis, aviões ou helicópteros que consigam chegar a curtas distâncias.
Portugal e as Oliver Perry
Em 2003 com Paulo Portas a Ministro da Defesa, estava prevista e foi amplamente divulgada a intenção de substituir as fragatas da classe “Comandante João Belo” por 2 navios provenientes dos EUA. A FFG 12 USS George Philip e a FFG 14 USS Sides, da classe Oliver Hazard Perry, chegariam a “custo zero”, mas com a condição imposta pelos EUA da sua reparação e modernização ser feita em estaleiros deste país. Eram navios construídos nos finais dos anos 70 e entregues à US Navy em 1980 e 1981 e por volta de 2003, parados à espera de comprador. O ministro português chegou mesmo a referir à imprensa que “embora o nosso País faça parte de um conjunto de dez Estados candidatos às fragatas ‘Perry’, o processo está bem encaminhado”. Oficiais portugueses visitaram os navios nos EUA, mas cedo se percebeu que a Marinha não via como vantajoso para a Armada a integração destes navios. Além da sua idade tinham a nível dos censores muito pouco em comum com as fragatas da Classe “Vasco da Gama”, além de necessitarem de uma guarnição mais numerosa. Como se sabe a Marinha, já no governo seguinte, acabou por receber em 2009 e 2010 duas fragatas de origem holandesa, da classe Karel Doorman, as actuais “Bartolomeu Dias” e “D. Francisco de Almeida”. Lançadas à água em 1992 têm vários componentes tecnológicos em comum com as “Vasco da Gama”, as quais por sua vez servem na Marinha Portuguesa desde 1991.
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As duas fragatas US destinadas a Portugal chegaram a ser visitadas por oficiais da Marinha Portuguesa. Segundo a maior parte dos observadores, ainda bem que o negócio não avançou!
A fragata Gen. T. Kosciuszko na SNMG 2
A ORP Gen. T. Kosciuszko esteve no Mar Egeu para apoiar forças da Grécia e da Turquia e ainda as da Agência Frontex da União Europeia, no âmbito dos seus esforços para controlar a chamada crise dos refugiados. Do ponto de vista operacional a fragata efectuou missões de reconhecimento, monitorização e vigilância e providenciou, como parte da SNMG 2 informação em “tempo-real” às guardas costeiras e outras autoridades nacionais na região.
Esta foi a terceira vez que a Marinha da Polónia integrou uma força da NATO deste tipo. A ORP Generał Kazimierz Pułaski, a outra fragata da Classe Oliver Perry que a Polónia recebeu, serviu na SNMG 1 durante a operação Active Endeavour e desde 2002 que a Marynarka Wojenna participa regularmente com “caça-minas” no Standing NATO Mine Countermeasures Group One (SNMCMG1). Em 2010 e 2013, coube-lhe o comando de forças navais da NATO.
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O Kaman SH-2G Super Seasprite que estava embarcado. A Marynarki Wojennej (Marinha de Guerra) dispõe de 4 destes aparelhos, 2 para cada uma das fragatas recebidas dos EUA. Entraram ao serviço na US Navy em 1991 e foram retirados em 2004. Continuam a voar em vários países como na Nova Zelândia, Perú, Egipto e Polónia.

Tem uma tripulação de 3 militares, piloto, co-piloto e operador de sistemas. O compartimento de carga pode ser configurado de acordo com a missão: luta anti-submarina, detecção de minas, transporte de carga (interior ou suspensa) ou pessoal, busca e salvamento (com guincho) e operações especiais.
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Estes 4 helicópteros integram a Gdyńskiej Brygady Lotnictwa Marynarki Wojennej – Brigada de Aviação Naval de Gdynia, a qual depende da 3 Flotylla Okrętów (3.ª Flotilha Naval), a mais importante força naval da Polónia.
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Imagem de arquivo com o processo de colocação na água do (MAD) AN/ASQ-81(V) 2, o detector magnético que permite localizar alvos submersos.
A base naval de Gdynia
O ORP Gen. T. Kosciuszko, tem a sua base em Gdynia no Mar Báltico, perto de Gdansk, que alberga a 3 Flotylla Okrętów (3.ª Flotilha Naval), a mais importante unidade operacional da Marinha da Polónia. Cerca de 3.000 militares estão estacionados naquela que é a maior base naval do país, Gdynia, também com quartéis na península de Hel e em Ustka (na região de Gdansk), e as suas forças operacionais têm sido empregues em missões da NATO nomeadamente nas NATO Response Forces. É também em Gdynia que estão as “operações especiais” da Marinha, a JWF – Jednostka Wojskowa „Formoza”, Unidade Militar Formoza – , com missões expedicionárias cumpridas no Iraque e Afeganistão. Também aqui que se encontra a Gdyńskiej Brygady Lotnictwa Marynarki Wojennej – Brigada de Aviação Naval de Gdynia, que tem várias subunidades e dispõe de aviões An-28 Bryza e Mi-14 helicópteros (versão luta anti-submarina), os SH-2HG embarcados e os helicópteros W-3 SAR e MI 2.

O Proporzec marynarki wojennej (Jaque) da Marynarki Wojennej a Marinha de Guerra da Polónia içado na proa do ORP Gen. T. Kosciuszko em Lisboa.
Miguel Machado é
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