100.º ANIVERSÁRIO: O OLHAR DE UM PILÃO
Por Miguel Machado • 26 Mai , 2011 • Categoria: 03. REPORTAGEM Print
Os Pupilos do Exército e o seu centenário são o tema desta reflexão que Ernani Balsa nos apresenta, bem enquadrada por fotografias da sua autoria. Novo colaborador do “Operacional”, Ernani Balsa é Sargento-Mor de Transmissões do Exército, na situação de Reforma depois de ter cumprido 36 anos de serviço efectivo. Ex-aluno do Instituto dos Pupilos do Exército (1960 – 1969), ali se formou com o Curso Técnico de Electrónica. Ernani Balsa ao longo da sua carreira militar cumpriu uma comissão de serviço em Angola, esteve em Cabo Verde em serviço e desempenhou vários cargos em Portugal e no estrangeiro ligados à sua área de especialização. Foi radio-montador e instrutor na Escola Militar de Electromecânica, Técnico de Comunicações de Satélite na Escola de Comunicações NATO – Latina, Itália, na Estação Ibéria NATO –Fonte da Telha e no Centro de Controle do sistema SATCOM da NATO – Bélgica. Prestou ainda serviço no Gabinete do Representante Militar Nacional no SHAPE – Mons, Bélgica e terminou a sua carreira no Gabinete do CEMGFA em Lisboa. Ernani Balsa esteve ainda muito ligado ao associativismo militar tendo desempenhado cargos de relevo na Associação Nacional de Sargentos, de que foi Vice-Presidente, e na Organização Europeia das Associações Militares (EUROMIL)à qual foi delegado e membro do Board of Directors (BOD).
Aqui fica pela pena de um “Pilão” este olhar sobre a história dos Pupilos e também sobre a sua actualidade com os desafios de hoje e dos anos que se avizinham.
Instituto dos Pupilos do Exército (IPE) – 100º Aniversário: o olhar de um Pilão
Os Pupilos do Exército comemoram este ano o seu 1º Centenário. Foi a 25 de Maio de 1911, no alvorecer da 1ª República que, no rescaldo da sua implantação, e como gesto de homenagem e apoio aos valorosos militares que encarnaram esta mudança histórica de regime, nasce esta “casa tão bela e tão ridente”, com o intuito de proporcionar aos filhos dos militares, nomeadamente aqueles de patente mais baixa e consequente maior fragilidade económica, terem acesso a estudos de incontestável qualidade, num regime de internato, apoiados nos princípios e valores da instituição militar. O IPE surge como fazendo parte da reestruturação do Exército, levada a cabo pelo General Xavier Correia Barreto, Ministro da Guerra saído do 5 de Outubro de 1910. Correia Barreto, figura algo controversa associada à implantação da República, que aparece nomeado Ministro da Guerra algo inesperadamente, quando parece que o que estava previsto seria que este cargo deveria caber a Machado Santos, fica assim a ser considerado como o fundador do IPE, que adopta como patrono, D. João de Castro.
Durante estes 100 anos de existência, muitas mudanças foram acontecendo desde a génese do “Pilão”, designação popular e carinhosa como o IPE foi sendo conhecido a partir de certa altura, e estas mudanças tiveram quase sempre como objectivo adaptar a sua existência à evolução dos tempos e também às necessidades, vicissitudes e princípios do Estado Novo. Não pretendo agora, até porque não sou especialista na matéria, abordar todas estas mudanças e o seu impacto na vida interna e no papel que o IPE foi tendo na sociedade portuguesa. O período que melhor conheço, porque coincidiu com o meu internato de 9 anos, foi como se torna evidente, fortemente influenciado pelo esforço de guerra durante o conflito no Ultramar, época durante a qual, era nos seus cursos, nomeadamente os técnicos, que as Forças Armadas encontravam a alimentação necessária para os seus efectivos ao nível de graduados, principalmente sargentos, para os diversos quadros técnicos, com especial relevo para a área de Transmissões e Serviço de Material do Exército e também outras áreas técnicas da Força Aérea. Muitos dos finalista da área de Contabilidade, rumavam também para as Academias Militar e da Força Aérea, para preencherem, como oficiais, cargos de responsabilidade nos serviços de Administração Militar destes dois ramos. Mas na Marinha também se podiam encontrar, depois de frequência da Escola Naval, muitos ex-alunos naquela área ou na de Electrotecnia e Máquinas.
Com o advento do 25 de Abril, o fim da Guerra Colonial e todas as consequentes alterações da sociedade portuguesa, os Pupilos do Exército têm vivido décadas de incertezas, excessivas e inconsequentes mudanças, bem assim como uma certa instabilidade no seu corpo docente, o que não facilita o almejar de metas de excelência no ensino e uma certa estabilidade nos cursos e saídas profissionais e académicas dos alunos. Os novos paradigmas da sociedade actual, com novas bases de valores, mesmo que não sejam os mais desejáveis, mas que são aqueles que o frenesim dum novo estilo de vida e de obtenção do sucesso ditam a todos os níveis, um incontestado declíneo do papel e consideração pelas Forças Armadas e nos gastos que a sua existência implicam, numa época de crise, que já não é de agora, tudo isto, aliado a uma evidente falta de orientação, objectivos e conceito estratégico nacional, com grande evidência para o sector da formação e educação, têm levado a que a própria continuidade e existência de escolas como o IPE, e mesmo, talvez em menor grau, do Colégio Militar (CM) e Instituto de Odivelas (IO), venha sendo posta em causa.
Os ex-alunos, movidos pela força dos laços inalienáveis que sempre foram apanágio da camaradagem e vivência em comum, resultantes dos anos de internato, mas também dos fortes princípios e valores cultivados desde sempre no “Pilão”, têm-se movimentado com grande dedicação, no sentido de encontrarem os novos desígnios do IPE neste século XXI, de forma a evitar uma indesejável morte lenta ou um doloroso declíneo da qualidade de ensino e consequente banalização e inevitável extinção da casa que, durante um século os acolheu, os preparou e os lançou nas mais diversas áreas de actividade profissional, com êxito e valor, ao mesmo tempo que os moldou pessoas de excelsos valores sociais e humanos, reconhecidos por todos com quem eles se cruzam. A busca não é fácil porque as circunstâncias são por demais adversas, quer a nível institucional, quer da própria sociedade, pouco receptiva a ter que aceitar sustentar instituições que não compreende e que lhe soam a privilégios que apenas servem alguns poucos de entre o todo que é o país…
Entre as tradições e os modelos, a única saída é encontrar um equilíbrio razoavelmente sustentável pela massa indistinta que é a sociedade em geral, não os confundindo, antes aproveitado as virtudes de cada uma delas, a saber, a importância cultural e comportamental que as tradições nos podem transmitir e o desafio de encontrar novos modelos que sirvam os novos desafios da sociedade actual e possam ser considerados uma mais-valia de que o país possa beneficiar e não apenas alguns cidadãos.
No cumprimento do Primeiro Centenário e dealbar do Segundo, mais uma vez temos que continuar a acreditar que “Querer é Poder”, e mais ainda, sermos tão convictos e exigentes, que possamos também fazer os outros acreditar neste nosso lema de vida!…
Lisboa, 25 Maio 2011
Ernani Balsa
Nota1: Nos eventos desta comemoração, tomam parte os elementos duma delegação do Colégio Militar de Porto Alegre (CMPA) – Brasil, que para o ano comemorarão igualmente o seu 1º Centenário e que assim se associaram à efeméride do IPE, para assinalarem a assinatura duma geminação entre as duas escolas.
Nota 2: As fotografias reportam-se aos actos comemorativos que tiveram lugar em 22 de Maio de 2011. Estes decorreram em Lisboa, na Praça dos Restauradores, na Igreja de S. Domingos e nas instalações do IPE em S. Domingos de Benfica.
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99º ANIVERSÁRIO DO INSTITUTO MILITAR DOS PUPILOS DO EXÉRCITO (IMPE)
INSTITUTO DOS PUPILOS DO EXÉRCITO 1911-2011
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