“DEEP DIVEX” PELA 1ª VEZ EM PORTUGAL
Por Miguel Machado • 10 Out , 2010 • Categoria: 03. REPORTAGEM PrintOperando a partir do NRP “Almirante Gago Coutinho”, mergulhadores de vários países tendo como denominador comum a utilização do equipamento de mergulho profundo “Viper”, participaram no exercício “Deep Divex 2010” organizado pela Marinha Portuguesa.
Aproveitando esta 1ª vez que o “Deep Divex” se realizou em Portugal, e em simultâneo com as actividades normais do exercício, foi também realizada pelo Centro de Medicina Hiperbárica do Hospital da Marinha, a primeira fase de um estudo clínico pioneiro a nível internacional nesta área da medicina.
O “Operacional” assistiu a este exercício que decorreu a Sul de Portimão entre 27 de Setembro e 8 de Outubro, embarcado no “Almirante Gago Coutinho” numa manhã em que a Marinha mostrou, em síntese para os visitantes, o que se passou durante a semana anterior. Militares da Bélgica, Canadá Estónia, Noruega, Itália (e Portugal), efectuaram centenas de mergulhos a uma profundidade de quase 80 metros. Neste período os mergulhadores foram confrontados com vários cenários, criados em diferentes estações (locais) de mergulho nos quais tinham que actuar perante situações como: reconhecimento, inactivação e recuperação de uma mina, recolha do corpo de um tripulante preso no cockpit de um helicóptero afundado, e outras 3 situações concretas.
Pretendeu-se que o treino durante esta semana correspondesse aos objectivos deste tipo de mergulho de aplicação militar, ou seja, treinar acções típicas da guerra de minas, inactivação de engenhos explosivos, salvamento submarino, mas também missões de Serviço Público, como as levadas a cabo em apoio das Forças e Serviços de Segurança ou de Protecção Civil, nomeadamente no combate ao narcotráfico, operações de busca e salvamento e resolução de acidentes subaquáticos.
Este exercício internacional realiza-se anualmente e a sua 13ª edição reuniu em Portugal um elevado número de mergulhadores, observadores e técnicos, que utilizam o material “Viper” da Carlton Technologies Inc. Foi aliás esta firma que patrocinou o arranque destes exercícios e, ano após ano, os seus técnicos apoiam as marinhas que o usam e naturalmente colhem – para ambas a partes – importantes ilações. No “Deep Divex 2010” participaram equipas de mergulho das seguintes unidades:
Portugal: Destacamento de Mergulhadores Sapadores N.º 1;
Canadá: Fleet Diving Unit Atlantic e Fleet Diving Atlantic Pacific;
Estónia: Estonian Clearance Diving Unit;
Noruega: Norwegian Navy EOD Team;
Bélgica: Belgian EOD Group.
Itália, Holanda, Suécia e Estados Unidos da América participaram com observadores, recolhendo informações para os seus mergulhadores. O Canadá envolveu também uma equipa da Unidade de Mergulho Experimental e a Carlton um técnico que não só colhe dados sobre o desempenho do material como ele próprio, conhecedor profundo deste material – participou em todas as edições do “Deep Divex” – ajuda e muita na resolução de problemas que sempre surgem.
Os mergulhadores da Marinha Portuguesa adquiriram esta qualificação em 2003 (1º curso em Portugal, depois de uma formação inicial de quadros no Canadá), depois de participarem num “Deep Divex”, primeiro como observadores e, mais tarde, com destacamentos de mergulho. A doutrina NATO estabelece que 81m é a profundidade máxima estabelecida para este tipo de tecnologia, e o seu interesse militar reside – entre outros aspectos – no facto das minas fundeadas a maiores profundidades, ao rebentarem, não terem efeito no casco dos navios.
Este tipo de mergulho é uma actividade muito exigente, quer do ponto e vista técnico como físico e psicológico, estando como se compreende o militar completamente dependente do material que utiliza, não só para cumprir a missão como… para se manter vivo!
O exercício é também uma oportunidade de manter as certificações dos mergulhadores (em Portugal os militares têm que as validar de 4 em 4 meses) e tomar contacto com procedimentos e experiências de um enorme grupo de militares altamente especializados de vários países e latitudes.
Esta actividade acarreta uma enorme panóplia de equipamentos individuais e colectivos, operacionais e de apoio, sendo de realçar o embarque no “Almirante Gago Coutinho” de duas câmaras hiperbáricas, sendo uma da Marinha Portuguesa e outra da Real Marinha Norueguesa. Estes equipamentos revelaram-se aliás fundamentais para salvar a vida a dois mergulhadores belgas que sofreram um acidente a grande profundidade. O equipamento de um dos militares teve uma falha mecânica numa das válvulas, a mais de 70 metros de profundidade, o que deu origem à libertação de oxigénio em grande quantidade (o mergulhador respira uma mistura de hélio e oxigénio), intoxicando-o, provocando-lhe a perda de sentidos tendo libertado a máscara e inalado água. O 2º mergulhador – mergulham sempre dois militares e, em princípio, fica ainda um à superfície equipado e pronto para qualquer eventualidade – trouxe-o rapidamente para cima (sabendo claro que iria ele próprio sofrer uma grave doença de descompressão). Isto porque a pressão a que o corpo está sujeito àquelas profundidades diminui muito rapidamente numa subida destas, originando que as bolhas de gás inerte que temos no organismo aumentem de dimensões, originando efeitos físicos e químicos. Os militares foram colocados nas câmaras hiperbáricas e, seis horas depois, a rapidez do salvamento, a actuação dos médicos e enfermeiros navais a bordo e a tecnologia disponível, permitiram o salvamento de duas vidas. Em estado grave mas sem risco de vida, os militares belgas foram depois desta primeira acção a bordo, colocados no Ponto de Apoio Naval da Marinha em Portimão e transportados num helicóptero do INEM para o Hospital da Marinha onde permaneceram hospitalizados vários dias.
O “Deep Divex 2010” foi aproveitado para realizar um estudo clínico pioneiro a nível mundial nesta área do mergulho profundo. Com a estadia em Portugal de um tão grande número de mergulhadores, de países diferentes, a mergulhar “in vivo” (e não em mergulho simulado em câmaras hiperbáricas) mais do que uma vez ao dia, médicos e enfermeiros navais lançaram mãos à obra, embarcaram no “Almirante Gago Coutinho” com os seus equipamentos e recolheram dados que agora estão a ser tratados e deverão dar origem a uma publicação científica sobre os efeitos no corpo humano deste tipo de actividade. Além da parte objectiva que consiste na recolha de dados no corpo humano, o estudo também contempla uma parte subjectiva com base em questionários respondidos pelos mergulhadores.
O “Deep Divex 2010” mostrou a capacidade da Marinha Portuguesa e do seu Agrupamento de Mergulhadores para organizar este tipo de actividades, testou-a e aos seus militares e meios numa situação de emergência bem real e ainda soube aproveitar esta oportunidade para lançar uma “primeira pedra” a nível internacional com o um estudo clínico na área da medicina hiperbárica.
Mergulhadores Sapadores da Marinha Portuguesa (fonte Marinha Portuguesa)
Os Destacamentos de Mergulhadores Sapadores foram criados e activados em finais de 1972, por imperativos operacionais da actividade do Comando de Defesa Marítima da Guiné, tendo sido desactivados em 1975 após a extinção deste comando, passando a actividade operacional dos mergulhadores a ser assegurada pela Escola de Mergulhadores.
O Destacamento de Mergulhadores Sapadores Nº1 foi reactivado em 1 de Junho de 1988, dada a necessidade de existir uma unidade operacional especialmente vocacionada para a área do mergulho militar. As actividades de interesse público, designadamente as relativas à salvação marítima (“salvage diving”) e ao socorro a náufragos (“search and rescue”) continuaram a ser asseguradas pela Escola de Mergulhadores.
Quando, em 1 de Janeiro de 1995, o Destacamento de Mergulhadores Sapadores Nº2 foi reactivado (com uma nova constituição de vinte elementos em vez de treze), toda a actividade operacional foi retomada pelos destacamentos, ficando cometidas à Escola de Mergulhadores, exclusivamente tarefas de instrução.
Estas unidades estão sedeadas em edifício da Esquadrilha de Submarinos na Base Naval no Alfeite, estão sob o Comando Administrativo dessa Esquadrilha e sob o Comando Operacional do Comando Naval em Oeiras.
As missões das Unidades de mergulhadores situam-se nos âmbitos das operações navais de guerra de minas, ofensivas, de inactivação de engenhos explosivos e das missões de interesse público, compreendendo as seguintes acções:
• Operações de minas.
• Reconhecimento táctico de costa e limpeza de obstáculos para desembarque de forças anfíbias.
• Operações ofensivas submarinas, no mar, na orla marítima, nos acessos fluviais e nas instalações portuárias.
• Inactivação de engenhos explosivos.
• Operações de salvação marítima, nomeadamente vistoria, reparação e recuperação de unidades navais.
• Operações de salvamento marítimo de socorro a náufragos.
• Colaborar na fiscalização das actividades ligadas ao leito do mar.
• Colaborar no estudo científico do meio aquático.
Missões de Realce
Destacam-se algumas missões, que embora traduzam a rotina habitual destas Unidades, foram destacadas pela sua recente mediatização:
1. Inspecção ao túnel do metro na Praça do Comércio.
2. Recuperação de corpos em Entre os Rios em 2001.
3. Exercícios de Operações anfíbias nos exercícios nacionais CONTEX.
4. A recente certificação para mergulho profundo a 81 mts.
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