VISITA AO HMS BELFAST
Por Miguel Machado • 19 Fev , 2015 • Categoria: 07. TECNOLOGIA, 14.TURISMO MILITAR PrintO “HMS Belfast” é um cruzador que serviu 24 anos na Royal Navy (1939-1963) e em 1971 abriu ao público como museu, ancorado no Tamisa, bem próximo de alguns dos locais mais visitados de Londres. O Operacional propõe-lhe uma visita a este navio de guerra – que esteve destinado à sucata por motivos económicos – mostrando aquilo que um dia poderá ser – quem sabe? – replicado em Portugal com umas das nossas corvetas.
«Não há outro navio como o HMS Belfast, nenhum outro navio retirado do serviço e actualmente visitável tem a história deste. Tomou parte num dos maiores combates navais da segunda guerra mundial; sobreviveu nas condições do Árctico ao apoio que a Grã-Bretanha prestou ao seu aliado, a União Soviética; foi um dos navios que iniciou a barragem de fogo prévia ao desembarque da Normandia; teve um papel importante no apoio à força das Nações Unidas durante a guerra da Coreia.
Não há também outro museu como este, nenhum outro oferece uma experiência tão ligada fisicamente à realidade, porque o visitante desloca-se nos mesmos espaços em que os marinheiros andaram durante a sua vida no activo».
Em tradução livre é assim que se inicia uma visita ao navio nas páginas do seu “guidebook”.
Vamos agora à visita pelos olhos do Operacional!
O “HMS Belfast” (*), classificado pela marinha britânica como “cruzador ligeiro” cumpriu 4 campanhas em combate – Cabo Norte e Árctico em 1943, Normandia em 1944 e Coreia em 1950-52 – e constitui hoje um dos 5 museus da rede oficial “Imperial War Museums”. Note-se que todos estes museus, embora oficiais, têm forte investimento privado, de associações, empresas e mesmo indivíduos. É um navio de guerra com 187m de comprimento (a título de comparação, as nossas fragatas “Vasco da Gama” têm 118m e o “Bérrio” 140m), estava fortemente armado com 12 peças de 6 polegadas (152,4mm) que atingiam alvos a mais de 23.000m, além de vário outro armamento como torpedos de 21 polegadas (dois lançadores triplos, retirados no final da 2.ª Guerra Mundial) e peças de vários calibres, nomeadamente as 6 torres de 2 canhões de tiro rápido de 4 polegadas (101,6mm), destinadas a atingir alvos de superfície e aéreos e as 12 peças anti-aéreas Bofors 40mm, instaladas após a 2.ª Guerra Mundial, em substituição de outras, podendo ser usadas em tiro “à vista” ou ligadas a um sistema de controlo de tiro com radar. Quer as peças de 6 polegadas quer as de 4, foram “standart” nos navios britânicos e da “Commonwealth” no período do segundo conflito mundial, com os primeiros a equiparem 35 navios, tendo depois, com a venda de navios a outras marinhas, servido um pouco por todo o mundo durante muitos mais anos.
O modo como o navio foi preparado para a finalidade actual pode-se dizer que abrange 3 vertentes principais:
– O navio em si ao longo dos seus 9 “decks” (com armamento, máquinas, os inúmeros compartimentos, da ponte de comando à prisão de bordo, no que se inclui monitores com animações explicativas);
– O modo como ali se vivia, trabalhava, combatia (com muitos e esclarecedores manequins e artefactos da época criando situações “reais” e bem assim como monitores que projectam filmes dos tempos em que o navio navegava e combatia), o que inclui por exemplo, a “gun turret experience”, na qual se simula com recurso a sons, filmes, vozes e alguns artifícios nomeadamente movimentos das peças, como se desenrolava a actividade da guarnição de uma torre com 3 peças de 6 polegadas;
– Um pequeno museu “HMS Belfast in war and peace”, onde se conta a história do navio e as principais batalhas em que participou. Este espaço tem vários mapas, obras de arte, “croquis” e objectos pessoais ou capturados, vários são dedicados aos combates que levaram ao afundamento do navio alemão “Scharnhorst” em 1943. Inclui também modelos que mostram com detalhe o navio, partes deste e outros, uniformes, fotografias e diversos artigos que ajudam a contar a história desta unidade naval que acabou, em boa hora e fruto do esforço de muitos, por escapar ao fim da esmagadora maioria dos navios de guerra: a sucata!
Em vários pontos do navio podemos tomar contacto, sobretudo via audio, com aquilo que os ingleses denominam “In their own words”, ou seja, sintéticas histórias sobre o local/equipamento/situação contadas por quem as viveu. Do mesmo modo o livro Guia do Museu, insere muitas dessas passagens, história viva longe da história apenas de reis, presidentes, generais ou almirantes e grandes personalidades.
O navio, depois de abatido ao serviço esteve destinado à sucata por desinteresse do governo em investir na sua musealização, prevendo-se apenas a salvação de uma torre tripla para o Imperial War Museum, Londres. Um conjunto de entidades privadas, muitos antigos militares, deputados e gente anónima, lançaram uma campanha de angariação de fundos e de vontades que conseguiu colocar o assunto no Parlamento. Estava criada uma associação que acabou por receber o navio das mãos do governo, salvar o navio e transformá-lo em museu. Esta associação abriu o HMS Belfast ao público em 1971 e assim o manteve até 1978 ano em que o Secretário de Estado da Educação e Ciência o integrou nos Imperial War Museums.
Como acontece em muitos museus no Reino Unido a sua manutenção é garantida quer pelas entradas cobradas – e o preço deste não é barato, 14,5£ para um adulto e 7,25£ para criança, preços básicos, há preços “com doação” – quer pelos lucros das lojas (este tem loja, bar/restaurante) – e muitos pelos mecenas que podem ser empresas, privados ou mesmo países! No HMS Belfast a Federação Russa – e isso está bem assinalado no navio – pagou parte da recuperação, em 2010, como forma de agradecer e honrar o esforço dos que participaram na campanha que permitiu manter a funcionar as linhas de comunicação naval entre os EUA e a União Soviética, a “artic supply route”, lutando em condições muito rigorosas “contra os ataques dos submarinos alemães, a sua aviação e, o pior inimigo de todos, o mar”.
A visita (para quem queira, naturalmente) decorre num circuito assinalado com vários pontos de interesse, todos eles com legendas afixadas e por vezes filmes ou projecções de animações alusivas e o bilhete de entrada permite o uso de um áudio-guia que debita muita mas mesmo muita informação.
(*) HMS, significa His ou Her Majesty’s Shyps, consoante o monarca britânico seja do género masculino ou feminino. É o correspondente ao nosso NRP (Navio da República Portuguesa), ou ao USS (United States Ship) entre muitos outros exemplos.
Miguel Machado é
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