UMA HOMENAGEM
Por Miguel Machado • 2 Jun , 2014 • Categoria: 02. OPINIÃO PrintO Coronel de Infantaria GNR Carlos Gervásio Branco, colaborador do “Operacional” e autor de várias obras dedicadas à Instituição que serve, fez-nos chegar este texto, UMA HOMENAGEM, dedicado ao também nosso colaborador, Inspector-Chefe da Policia Judiciária, João Pedro Figueira, recentemente falecido. Aqui fica, com os nossos agradecimentos, este seu testemunho pessoal que revela facetas pouco conhecidas do Inspector-Chefe João Pedro Figueira.
UMA HOMENAGEM
Sei bem que o “Operacional”, não é um jornal de necrologia, mas sei também que do seu estatuto editorial consta, ser um “site” dedicado a temas relativos à Defesa Nacional, às Forças Armadas e de Segurança e à problemática da guerra e da segurança em Portugal e no estrangeiro.
É pois com fundamento no seu estatuto editorial que me atrevo, a evocar um seu colaborador que prematuramente nos deixou, porque sem margem para qualquer dúvida, o João Pedro Figueira era de entre todos aqueles que têm escrito para o “Operacional”, aquele que melhor se enquadrava no estatuto editorial deste “site”.
Profundo conhecedor dos assuntos militares e da Instituição Militar que tanto admirava, apesar de nunca ter sido militar, profissional experiente e prestigiado da Polícia Judiciária e estudioso dos sistemas policiais, os seus conhecimentos encarnavam a síntese do que o é “Operacional”.
Tive o privilégio de o ter como amigo, conheci-o na Faculdade de Direito de Lisboa, quando ele, simultaneamente frequentava direito na Católica, voltámos a encontrar-nos, com surpresa para ambos, no curso da PJ, onde por pouco tempo, fomos colegas e onde nasceu uma grande amizade.
Ao contrário do que é costume dizer-se quando alguém nos deixa, não seria justo adjectivar o João Pedro como uma boa pessoa, porque isso ficaria muito aquém de quem foi um ser normal, mas com uma inteligência acima da média, com uma memória extraordinária, dotado de uma vasta cultura, de uma educação extrema, com uma forte personalidade, patriota à antiga, verdadeiro defensor da identidade portuguesa e dos valores nacionais, saudosista do Portugal do império e um verdadeiro amigo.
Apesar de nunca ter sido militar, era um profundo conhecedor e estudioso do mundo castrense, com quem muito aprendi. Foi ele que me ensinou o significado e a origem das agulhetas (vulgo cordões), nos uniformes militares.
Também muito me ensinou da história de Portugal.
O seu respeito pelos militares era uma constante, assim como a admiração pelos nossos heróis da guerra do Ultramar.
Em certa ocasião na PJ, apareceu um oficial general para ser ouvido como declarante/testemunha num determinado processo. Na altura, o agente Figueira ficou indignado com a situação, porque bem sabia, ao contrário do que parece ter sucedido com o chefe, que os oficiais generais poderiam, nos termos da lei, ser ouvidos por escrito, escusando o incómodo de uma deslocação à Polícia.
Apesar do processo não lhe estar confiado, nem ter nada com aquela situação, o agente Figueira, foi pedir desculpa ao dito general e fazer as honras da casa enquanto o mesmo permaneceu nas instalações da PJ.
Foi por esta e por outras do género que o inspector-chefe Figueira, passou a ser o contacto privilegiado, entre a PJ e as Forças Armadas ou a GNR.
Menos conhecida era a sua grande habilidade para o desenho, o que aliado aos vastos conhecimentos militares, levaram a que em inícios da década de noventa do século passado, lhe tivesse sido feito o desafio de conceber e desenhar as novas fardas da GNR, o que em poucos dias fez e apresentou.
É certamente de poucos conhecido, que os uniformes azuis da GNR de 1993/4, foram graciosamente, concebidos e desenhados pelo João Pedro Figueira, a par de uns outros para o verão, de cor beije amarelada que por razões puramente económicas, acabaram por ficar pelo caminho.
A doença inesperada levou-o do nosso convívio prematuramente. Não tivemos tempo para celebrar a sua licenciatura em história, como tínhamos combinado e onde mercê da sua modéstia, nunca nos revelou claramente os brilhantes resultados obtidos nas diversas provas e trabalhos que deixaram os professores verdadeiramente surpreendidos e de que a frase “o senhor sabe mais disto do que eu”, é bem elucidativa.
Também não houve tempo para me fazer chegar um texto destinado a uma obra colectiva, sobre o modelo policial português que lhe havia solicitado. Como em tudo, o João Pedro obedecia a um pensamento próprio muito bem estruturado e profusamente fundamentado, defendia para o nosso país um modelo específico português que não era o modelo monista, próprio de alguns países nórdicos, nem era o modelo dual, típico dos países da europa do sul, mas um modelo tripartido com uma força militar, a GNR, uma força civil, a PSP e uma polícia de investigação criminal, altamente especializada, de pequena dimensão, muito centralizada e exclusivamente destinada à criminalidade mais complexa.
Muito mais haveria para dizer deste amigo, mas terminarei com a convicção de que se tivesse sido militar, como ele gostaria, teria uma folha de matrícula recheada de louvores e condecorações, pois a sua honestidade, a lealdade, o espírito de sacrifício e a disponibilidade com que serviu a PJ, não deixam dúvidas de que assim seria.
Lisboa, 1 de Junho de 2014
Carlos Manuel Gervásio Branco
Sobre o Inspector-Chefe João Pedro Figueira, leia também: JOÃO PEDRO DE GÓIS FERNANDES FIGUEIRA, 1958-2014
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