UM DIA EM VISEU COM A “INFANTARIA DA BEIRA” (II)
Por Miguel Machado • 14 Jun , 2010 • Categoria: 03. REPORTAGEM PrintDepois de no artigo inicial desta reportagem termos falado de Viseu, unidade de preferência; VBR 8X8 Pandur II, factor da mudança; Organização e Novas missões, terminamos hoje com a Doutrina de emprego, Transmissões e simuladores, Manutenção, Conclusões e “Viriatos”.
Doutrina de emprego
Este tipo de unidades, infantaria ligeira blindada, com as missões e capacidades acima referidas, não tem precedentes no Exército. É uma “coisa nova” que necessita de doutrina de emprego adaptada ao tipo de viatura que foi adquirida. É isso que também está em curso. Diz-nos o capitão Jorge Louro, 28 anos de idade, 11 de serviço, “Já elaboramos na Escola Prática de Infantaria, com a colaboração do Regimento de Infantaria N.º 13 e do Regimento de Cavalaria n.º 6, o manual de Secção/Pelotão, seguem-se – neste momento – o de Companhia/Batalhão“. Jorge Louro que esteve na Bósnia em 2005 e dali não trouxe grandes recordações da “Chaimite”, lembra que “temos a referência da doutrina americana da chamada «Stryker Brigade Combat Team», apenas como referência uma vez que há muitas diferenças em relação à nossa; a experiência dos Batalhões de Infantaria Mecanizados de Santa Margarida; e a nossa própria dos Pelotões de Infantaria“. Neste momento a documentação produzida está no Comando da Doutrina do Exército para aprovação, de onde sairá para as unidades. João Godinho lembra, entre outras, duas diferenças entre a estrutura da «Stryker» e a Nacional, “As companhias de atiradores US têm 3 Pelotões de Atiradores e 1 Pelotão de Autometralhadoras, as nossas 3 Pelotões de Atiradores e uma Secção Canhão (2 viaturas). A «Stryker» tem um Grupo (escalão batalhão) de Reconhecimento e a BrigInt 1 Esquadrão (escalão companhia), logo é muito diferente“.
Transmissões e simuladores
As Pandur estão equipadas com o rádio de fabrico nacional (EID/EMPORDEF – em parceria com Rohde Schwarz) P/PRC 525 (além do sistema de intercomunicação, com terminais para condutor, apontador e compartimento/secção) que tem capacidade para integrar o Sistema de Informação e Comunicações Tácticas (SIC-T), com módulos para companhia, batalhão e brigada. Serão instalados terminais nas viaturas (o rádio incorpora um sistema GPS), simplificando, “computadores portáteis robustecidos”, para visualizar o terreno digitalizado, permitindo a chamada “visão comum da situação operacional” e a ligação segura ao Sistema de Informação para o Comando e Controlo do Exército (SICCE). Assim, à semelhança de sistemas idênticos que as nossas forças já utilizam no Kosovo e Afeganistão (por cedência das forças multinacionais), também aqui as viaturas com o sistema instalado terão uma panorâmica do campo de batalha – com a localização de grande quantidade de elementos de informação – comum com o comando das operações em curso.
Já em funcionamento no RI 13 em Vila Real, a “sala de simulação” Pandur, que permite ao pessoal das várias “unidades Pandur” do Exército o treino simulado quer em áreas urbanas que rurais de acções tácticas até pelotão e ainda, na guarnição da VBR Pandur II, o chefe de viatura, condutor e apontador. Mesmo sabendo-se que não substitui totalmente o treino no terreno, trará poupanças substanciais em determinadas fases da instrução e aqui como em outras áreas este é o caminho a seguir.
Manutenção
Numa viatura nova, onde tudo está a ser feito pela primeira vez, que incorpora as mais recentes tecnologias e que ainda está ligada ao fabricante em termos contratuais, os cuidados com a manutenção são mais do que evidentes. Também aqui, “nada é como dantes”! O Sargento-Ajudante Paulo Monteiro, 44 anos de idade, 23 dos quais no Serviço de Material, apresenta-nos o sistema informático que opera nesta área. “Trata-se do programa de gestão de manutenção ManWinWin 2.03, adaptado a esta realidade, que nos permite controlar todos os aspectos técnicos de cada uma das viaturas que nos estão atribuídas.” Paulo Monteiro mostra-nos o sistema e funcionar e o detalhe de informação que ali está espelhado. Explica ainda que “além da manutenção mensal que é feita no batalhão (a do utilizador), há ainda a semestral, anual e bianual que é feita pela Companhia de Manutenção da BrigInt, no Entroncamento, ou aqui mesmo por equipas de contacto que cá vêem“. Frisa também que o apoio das firmas fornecedoras (a austríaca Steyr e a portuguesa Fabrequipa) tem sido sempre pronto e eficaz. “Qualquer anomalia que lançamos no sistema e é da responsabilidade do fabricante, origina quase e sempre a deslocação muito rápida de equipas de contacto de uma ou outra destas firmas“. O comandante de batalhão aliás já nos havia referido que no decurso do último exercício “Dragão” da BrigInt, na região de Celorico da Beira/Trancoso, a Steyr fez deslocar uma equipa de contacto para a região, onde permaneceram “de prevenção”, sem no entanto terem sido necessários. E note-se, ao contrário do que por vezes se faz crer, que estas viaturas têm milhares de quilómetros feitos. Têm-se verificado avarias em alguns sistemas, deficiências, há detalhes que já foram corrigidos outros serão, mas nada que preocupe quem lida com o material. Este é um caminho que tem que ser percorrido em qualquer viatura nova. Nova no sentido em que Portugal foi o primeiro país a adquirir este tipo específico de blindado o qual, naturalmente, nunca havia sido testado. Se a opção tivesse sido uma viatura já testada em combate, esta fase seria certamente muito mais abreviada, mas não foi. Neste como em outros casos, em qualquer dos ramos ou épocas, os militares que lidam com um novo equipamento sabem que têm quase e sempre esta ingrata fase inicial para ultrapassar. Aqui, parece-nos, o fundamental será garantir que tudo seja bem recepcionado, e que eventuais defeitos sejam corrigidos.
Conclusão
As VBR 8X8 TP Pandur II nada têm a ver com a sua antecessora “Chaimite” (que ainda opera no Kosovo!). O salto tecnológico é brutal, exige condutores muito mais habilitados e manutenção significativamente mais cuidada e dispendiosa. Só que as suas capacidades operacionais são também muitíssimo maiores e a sua entrada ao serviço já obrigou a mudanças de vulto no Exército.
O tenente-coronel João Godinho é um comandante confiante, satisfeito com o ambiente que se vive no Regimento de Infantaria n.º 14 e que lhe permite desenvolver sem entraves a actividade de treino operacional do 2º BI. Sabe que o batalhão tem um caminho a percorrer mas já não está no seu início, tem muitos aspectos consolidados. A nível de pessoal, o 2ºBI está numa fase de renovação com nova gente a chegar mas ainda assim 32% do efectivo já esteve em missões exteriores.
Parecendo certo que estas viaturas conferem a quem as utiliza, confiança, aquela agradável e motivadora sensação de ter à sua disposição material de última geração, achamos nós que o grande teste, a “prova de fogo” para as Pandur II, será o emprego num teatro de operações exterior.
Viriatos
“Infantes de Viriato“, ou apenas “Viriatos“, é a denominação tradicional dos seus militares (do RI 14), Viriato é o seu patrono e o lema do Regimento é um verso dos Lusíadas relativos ao pastor guerreiro:
“Desta o Pastor nasceu, que nos eu nome
se vê que de homem forte aos feitos teve;
cuja fama ninguém virá que dome,
pois a grande Roma não se atreve.”
(Lusíadas, canto III, est. XXII)
Por despacho de 8 de Setembro de 2006 foi institucionalizado pelo Chefe do Estado-Maior do Exército de então, General Luís Valença Pinto, a “figura histórica de Viriato como patrono do Regimento de Infantaria N.º14“, com vários considerandos nomeadamente que “é uma das figuras relevantes da história de Portugal e do Exército que, desde sempre, esteve fortemente ligado à cidade de Viseu e ao RI 14 (Viseu), como comprova a simbologia deste Regimento de Infantaria, que lhe é alusiva“.
In “O 14 de Infantaria” (clique para ver comentário ao livro)
Nota: O “Operacional” agradece a todos os militares que nelas participaram o apoio prestado na realização deste conjunto de reportagens em Viseu, e em particular ao Coronel de Infantaria João da Cunha Porto, a quem cabe desde 2009 comandar os “Viriatos”.
Em «UM DIA EM VISEU COM A “INFANTARIA DA BEIRA“» (I), leia: Viseu, unidade de preferência; VBR 8X8 Pandur II, factor da mudança; Organização e Novas missões
Em «A NOVA “INFANTARIA BLINDADA“, veja o vídeo com a Pandur II em acção.
Em «A VBR 8X8 TP Pandur II DO EXÉRCITO PORTUGUÊS», veja detalhes técnicos da viatura, imagem panorâmica, e detalhes organizacionais.
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