“TRIDENT JUNCTURE 2015” – ASPECTOS GERAIS
Por Miguel Machado • 5 Jul , 2015 • Categoria: 03. REPORTAGEM, EM DESTAQUE PrintEste artigo destina-se a explicar em termos simples aspectos gerais deste exercício, ao qual a NATO pretende dar grande visibilidade, os locais onde vai decorrer em Portugal, Espanha e Itália, quais os objectivos que pretende alcançar e algumas questões quanto à participação nacional. Tentaremos ir acompanhando o seu desenvolvimento.
A NATO no momento actual
Depois dos anos da Guerra-Fria, “oficialmente” encerrada em 1989, a NATO adaptou-se às novas realidades e iniciou, em 1995, uma nova fase que a levou intervenções militares primeiro na Europa e depois de 2001, em teatros de operações distantes, já com novos membros, nomeadamente no Afeganistão e no Índico. Em anos mais recentes, a Aliança actuou na Líbia, encerrou a missão no Afeganistão, embora muitos países entre os quais Portugal lá se mantenham com novas responsabilidades, e…está de volta à Europa, com as atenções viradas para Leste e Sul (Mediterrâneo), com a expressão “defesa colectiva”, caída em desuso, de novo na ordem do dia.
Esta postura da NATO decorre da Cimeira da NATO no UK (País de Gales) em Setembro de 2014, onde foi aprovado o chamado “NATO’s Readiness Action Plan”, com dois tipos de medidas que estão a ser postas em prática, as:
Assurance Measures (Medidas de Tranquilização), incrementando a presença militar em países da Aliança para garantir capacidade acrescida de dissuasão;
Adaptation Measures (Medidas de Adaptação), introduzindo mudanças que aumentem a capacidade militar da Aliança.
É portanto aqui que estamos, numa altura de reforço dos meios militares de alguns membros da NATO (já este ano Portugal por exemplo foi chamado a enviar uma Companhia de Reconhecimento para a Lituânia e um Destacamento Aéreo F-16 para a Roménia), e na execução de uma enorme série de exercícios por toda a Europa, havendo mesmo colocação de material pesado e aviões de combate na “frente leste”. Vários países da Aliança estão também a dar apoio militar à Ucrânia, nomeadamente a nível da formação e algum tipo de equipamento.
A Força Naval de Reação da NATO, Standing NATO Maritime Group 1 (SNMG1) está actualmente sob comando do Contra-Almirante Alberto Manuel Silvestre Correia, integra como navio-almirante o NRP D. Francisco de Almeida, e segundo o EMGFA «...a SNMG1 participará ativamente na Operação “ACTIVE ENDEAVOUR”, no Mediterrâneo Oriental, integrando o esforço internacional contra o terrorismo. A Força irá também realizar operações e exercícios aeronavais de alta intensidade no Mar Negro e no Mar Báltico. Tem previsto participar em vários exercícios NATO, incluído o “Trident Juncture 15″…»
O exercício “Trident Juncture 2015” (TJ15) foi planeado antes da crise na Crimeia, no início de 2014, não tendo portanto ligação directa inicial com esses factos, agora, a sua realização vai acontecer nestes tempos que correm e não noutros, e tanto assim é que, a própria NATO refere na sua documentação de acesso público (em Setembro de 2014), sobre as designadas Connected Forces Initiative:
«…Na cimeira do País de Gales em 2014, tendo em vista a crise Rússia-Ucrânia e a crescente instabilidade e desafios à segurança em todo o Médio Oriente e Norte de África, os líderes aliados aprovaram o NATO Readiness Action Plan, para reforçar a defesa colectiva e garantir que a Aliança está pronta para lidar com qualquer desafio,… …das medidas aprovadas, inclui-se o exercício de alta visibilidade “Trident Juncture 2015”, um programa mais vasto de exercícios para 2016 e um Quartel-General de Operações Especiais projectável…»
“Trident Juncture 2015”
Tem como objectivo principal a avaliação e a certificação do Joint Forces Command Brunssum (Comando NATO aquartelado nesta cidade holandesa) das componentes da NATO Response Force 2016, tendo sido divulgados números entre os 24.000 e os 30.000 como os efectivos que irão participar, sendo por isso o maior exercício da Aliança Atlântica em muitos anos. As bases e campos de exercícios a utilizar localizam-se em Portugal, Espanha e Itália, e terá lugar entre os últimos dias de Setembro e os primeiros de Novembro próximos.
Segundo a NATO o TJ 15 servirá para «…treinar e testar as NRF, forças tecnologicamente avançadas, com componentes terrestres, navais, aéreas e de operações especiais, capazes de serem deslocadas rapidamente para vários pontos do globo. O exercício representa o passo final no processo de certificação de várias NRF que irão estar prontas em 2016…». Segundo o EMGFA em Lisboa o TJ 15 “…marca a alteração da postura da Aliança Atlântica das grandes operações no terreno para a contingência onde, aspectos como a sustentação e a interoperabilidade de Forças, passaram a ser os objectivos a atingir, representando no seu conjunto o maior teste de sempre para a NATO e para as suas NRF…»
Portugal e o “Trident Juncture 2015”
Facto nada habitual, revelador da enorme importância deste exercício, o TJ 15 levou mesmo à publicação em Diário da República de um despacho do primeiro-ministro (Despacho n.º 5472/2015 de 5 de Maio) a informar quais os objectivos para Portugal desta actividade de treino da NATO:
« a) Afirmar o papel de Portugal como parceiro responsável, no quadro de segurança cooperativa, para a defesa permanente dos nossos valores e interesses fundamentais e como coprodutor internacional de segurança;
b) Contribuir para melhorar a capacidade de prevenção e gestão de crises da OTAN e assegurar uma maior capacidade de resposta rápida e projeção de meios;
c) Sedimentar a imagem externa de Portugal e, no âmbito do Fórum da Indústria da OTAN que decorrerá em paralelo ao exercício, promover a internacionalização das empresas nacionais e criar um ambiente favorável à atração dos agentes económicos estrangeiros pelo mercado português…»
e a considerar que o Ministério da Defesa é a entidade responsável pela coordenação geral das atividades relacionadas com a participação nacional no TRJE 15, assegurando a articulação interministerial e os contactos com as demais entidades envolvidas:
«…O Ministério das Finanças, o Ministério dos Negócios Estrangeiros, o Ministério da Administração Interna, o Ministério da Justiça, o Ministério da Economia, o Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Energia, o Ministério da Saúde e a Secretária -Geral do Sistema de Segurança Interna, dentro das suas atribuições setoriais e atendendo aos objetivos do exercício, apoiam o Ministério da Defesa Nacional no âmbito das responsabilidades relacionadas com a participação nacional no TRJE 15, nomeando, para esse efeito, os respetivos representantes, no sentido de assegurar a permanente ligação com as estruturas responsáveis pelo planeamento, preparação e execução do exercício, a definir pelo Ministério da Defesa Nacional…»
A nível militar, trata-se de uma responsabilidade do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, planeado na parte nacional pelo Estado-Maior do Comando Conjunto para as Operações Militares do Estado-Maior-General das Forças Armada, envolvendo todos os ramos das Forças Armadas e os respectivos Comando Naval, Comando das Forças Terrestres e Comando Aéreo e as respectivas unidades subordinadas.
Nas diferentes fases de preparação do exercício já decorreram diversas actividades em Portugal, algumas de grande dimensão como uma reunião em Maio último de 291 representantes de 28 países, ou visitas a locais onde vão decorrer fases muito importantes do exercício, como Santa Margarida, em Março, com a participação de cerca de 150 militares dos países participantes.
Também nada habitual, o próprio governo português emitiu um comunicado sobre o exercício, em 02 de Julho, aliás bem mais completo que o emitido pelo Ministério da Defesa. Sobre a efectiva participação portuguesa, refere:
«…Além dos militares que participam diretamente no exercício (940 integrados na Força de Reação da NATO 2016 e 2220 nos meios complementares), Portugal disponibilizará ainda mais 3000 militares que funcionarão como forças de apoio, totalizando em cerca de 6000 os efetivos portugueses envolvidos neste exercício. Em Portugal, o exercício … … mobilizará mais de 10 mil efetivos de 14 países participantes. O exercício divide-se em duas partes, o exercício de postos de comando, que decorre entre 3 e 16 de outubro, e o exercício com forças no terreno, entre 21 de outubro e 6 de novembro…»
Forças a empenhar
Tanto quando é possível saber neste momento as Forças Armadas Portuguesas irão participar no TJ 15 com unidades nas forças “amigas” e nas “opositoras”. Assim de “ambos os lados” a Marinha empenhará, 1 fragata, 1 navio hidrográfico, fuzileiros, mergulhadores e ainda outras componentes; o Exército, que envolve o maior número de efectivos nacionais, participará com 1 batalhão de infantaria mecanizado (rodas), outras unidades de escalão companhia ou menores, nomeadamente de artilharia, engenharia, carros de combate, pára-quedistas, CIMIC e Defesa NBQ; a Força Aérea principalmente com aeronaves F-16.
A seu tempo se saberão mais detalhes do exercício, o qual vai trazer a Portugal uns milhares de militares estrangeiros, muita visibilidade internacional, sobretudo a nível militar mas também certamente das opiniões públicas europeias, norte-americana e do Canadá, o país que mais militares vai empenhar em território nacional, sendo sobre o seu comando que muitas unidades portuguesas irão actuar. A NATO está empenhada em “mostar” as suas capacidades e isso levará, estamos certos, a uma grande operação de relações públicas, apoiando muitos jornalistas estrangeiros nas suas deslocações a Portugal, Espanha e Itália.
Exigirá, quer a nível operacional quer logístico e também da informação pública, um grande esforço e empenhamento das Forças Armadas Portuguesas, mas constituirá não só mais uma excelente oportunidade de treino, ocasião para verificar até que ponto mantemos capacidade de operar em conjunto com forças aliadas e assinalar lacunas a nível dos equipamentos e armamentos. A nível de doutrina, técnicas, tácticas e procedimentos a experiência nacional está comprovada quer em operações reais nos vários teatros de operações onde actuamos quer em exercícios multinacionais, mas o treino operacional, especialmente numa “operação” desta dimensão e complexidade é sempre um “valor acrescentado” para qualquer força militar.
Miguel Machado é
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