RESPONSABILIDADE SOCIAL – OPERAÇÃO NA MADEIRA REFORÇA A IMAGEM DAS FORÇAS ARMADAS
Por Miguel Machado • 28 Mar , 2010 • Categoria: 02. OPINIÃO PrintA participação das Forças Armadas Portuguesas no apoio às autoridades da Região Autónoma da Madeira na sequência da calamidade que se abateu sobre parte da cidade do Funchal e da principal ilha do Arquipélago, é o pano de fundo de mais este artigo de Patrícia Marcelino. Volta a um tema que já abordou aqui no “Operacional”, o da Responsabilidade Social, ao mesmo tempo proporciona aos leitores uma visão do que foi o empenhamento militar nas terríveis horas e dias que a população da Madeira viveu. Patrícia Marcelino advoga ainda o reforço da comunicação institucional nestas circunstâncias e explica porquê.
RESPONSABILIDADE SOCIAL – OPERAÇÃO NA MADEIRA REFORÇA A IMAGEM DAS FORÇAS ARMADAS
Porque muita coisa foi escrita após o dia 20 de Fevereiro sobre o que se passou e está ainda a passar na Madeira, optámos por uma outra visão dos acontecimentos – o lado social e humano decorrente de mais uma missão e que se enquadra no conceito de Responsabilidade Social.
Uma das diversas concepções de Responsabilidade Social, que exprime toda a sua envolvente, é a do Instituto ETHOS (1) : «Responsabilidade Social Empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais que impulsionem o desenvolvimento sustentável da sociedade. Isso deve ser feito preservando recursos ambientais e culturais para as gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais».
No crescimento deste conceito, as empresas têm sido amplamente solicitadas a participar em acções concertadas de Responsabilidade Social. Quer pela pressão da opinião pública, quer pela dos próprios media, emerge uma necessidade que tem sido consubstanciada por uma tendência global das empresas e também dos organismos estatais em prosseguir com a manutenção da informação disponível ao cidadão sobre as políticas que elas próprias preconizam, envolvendo toda a componente externa numa responsabilidade comum nos resultados obtidos.
Após o fatídico temporal que assolou a Ilha da Madeira no passado dia 20 de Fevereiro e que culminou na perda de dezenas de vidas e de avultados danos materiais, os Portugueses têm vindo a assistir às mais diversas demonstrações de solidariedade para com a população desta Região Autónoma. Testemunhámos acções de recolha de bens essenciais para os desalojados, recolha de fundos para apoio à reconstrução das habitações, uma verdadeira comunhão entre a população da ilha que acorreu em ajuda aos vizinhos e familiares. Portugal testemunhou a sua união num momento de grande sofrimento e foi decretado luto nacional pelas vítimas desta monstruosa demonstração de poder na Natureza.
Face à gravidade da situação e na sequência do Conselho de Ministros extraordinário, que se realizou a 22 de Fevereiro, foi emitido um comunicado (2) onde se podia ler a determinação de “Assegurar a continuidade da prestação de auxílio através de meios de emergência, nomeadamente dos serviços de protecção civil e da defesa nacional, e manter em elevada prontidão os meios de reforço que, a solicitação do Governo Regional, poderão ainda vir a ser disponibilizados“.
Tornava-se indispensável esta mobilização de apoio às vítimas da tragédia no sentido de desenvolver esforços de reconstrução, para que a normalidade regressasse à ilha com a maior brevidade possível. Desde então, o sector da Defesa tem colaborado nas acções de prestação de auxílio à Região Autónoma da Madeira, nomeadamente na recuperação das infra-estruturas essenciais para o restabelecimento das actividades da população local, bem como no apoio à população mais afectada.
O trabalho a que temos vindo a assistir por parte das Forças Armadas enaltece todos os que dele têm feito parte e orgulha o povo português. Brilhante tem sido o empenho das diversas entidades desde o Ministério da Defesa Nacional ao Regimento de Guarnição nº 3. Os nossos parabéns pela coordenação de esforços entre o Governo Regional da Madeira e todos os operacionais que, no terreno, têm vindo a conseguir trabalhar como uma equipa una e funcional.
Com efeito e porque, em termos legais, este apoio se processa através do Comando Operacional da Madeira e do Chefe do Estado-Maior-General das Forças Armadas, a 23 de Fevereiro podia-se ler no site do Ministério da Defesa Nacional (3) as primeiras movimentações que os Ramos das Forças Armadas estavam a efectuar no sentido de fornecer o referido apoio, nomeadamente com “Dois helicópteros EH-101 Merlin, um avião C-130, um Falcon, uma Fragata e dois autotanques para distribuição de água potável…“.
Muitos desenvolvimentos têm ocorrido ao longo destas semanas e os apoios na área da Defesa Nacional têm-se revelado muito diversos, mas todos eles de extrema importância para quem perdeu tudo.
Segundo informações do EMGFA (4), as Forças Armadas têm vindo a disponibilizar, entre outras coisas, equipas de remoção de escombros, equipas de transporte de pessoal, equipas de transporte de material, uma equipa para montagem de holofotes e gerador, alojamento e apoio médico no Regimento de Guarnição nº 3 (RG3), dois helicópteros EH-101, uma ponte militar TREADWAY com 20 metros de vão com a respectiva equipa técnica e dois auto-tanques para distribuição de água potável.
Ainda de acordo com os conteúdos disponibilizados no site do EMGFA, para além destes meios, têm estado em prontidão no Continente, uma fragata, um helicóptero, uma equipa médica, uma equipa de mergulhadores, duas secções de fuzileiros e o contentor DISTEX para apoio a situações de catástrofe e emergência, bem como dois C-130 para transporte de bombeiros.
Por seu lado, in loco, prosseguiam as diligências necessárias para que o plano “Auxílio” tivesse sucesso. Accionado a 20 de Fevereiro, este plano está a ser articulado entre o Comando Operacional da Madeira, em coordenação com o RG3, juntamente com a Protecção Civil e os Bombeiros da Ilha e tinha já sido previamente testado por estas autoridades, treino esse que possibilitou a rápida e eficaz disposição de meios e recursos humanos a que assistimos.
Os três Ramos das Forças Armadas foram chamados a intervir e a sua prontidão foi evidente. Sem qualquer tipo de desprimor para com os outros intervenientes, gostaríamos de destacar o papel do Exército, aqui representado pelo Regimento de Guarnição Nº. 3 que devido à sua localização, teve e continua a ter, um desempenho fundamental para o restabelecimento da normalidade possível para as vítimas do temporal.
Efectivamente, o RG3 não se poupou a esforços desde as primeiras horas deste trágico acontecimento, empenhando-se mesmo 24 horas por dia. Inicialmente num grande esforço na colaboração em actividades de busca e salvamento, depois no fornecimento de apoio logístico e sanitário aos desalojados e até agora numa tentativa de recuperação geral da normalidade das zonas afectadas.
Até ao dia 16 de Março, mais de 439 equipas foram já constituídas (perfazendo um total de 1.744 militares) para colaborar no transporte de pessoas, na remoção de escombros e no fornecimento de água potável. As viaturas empenhadas nesta missão contam com mais de 14.547 quilómetros percorridos neste precioso auxílio à população da Madeira. No que concerne ao acolhimento provisório de famílias desalojadas, o número chegou às 175 pessoas no dia 23 – entre elas 36 crianças, 8 das quais com idades inferiores a 2 anos. À data de 16 de Março, segundo informações do Comandante do RG3 apenas 30 pessoas continuavam ainda na unidade, número que inclui 6 crianças (3 em idade escolar).
Desde esse fatídico sábado, que o RG3 tem envidado todos os esforços em diversas frentes para apoiar a população madeirense. Quando dizemos diversas frentes, referimo-nos realmente às diferentes áreas de actuação em que os militares e civis deste Regimento se têm empenhado e não nos referimos apenas àqueles apoios decorrentes da inerência de uma Unidade Militar. Mencionamos também, e em especial, todo o empenho pessoal que tem sido demonstrado.
Não se pretende, de forma alguma, personificar atitudes ou empenhamentos. O que se pretende é destacar um movimento, que por si só demonstra este espírito de solidariedade que é característico dos portugueses e ao qual, partindo de uma unidade militar, se pode enquadrar no que já foi falado noutro artigo – Responsabilidade Social promovida na área da Defesa e das Forças Armadas.
Ou seja, podemos olhar para estas actuações como um movimento que, apesar de fazer parte da missão da Defesa Nacional, se desviou para além das suas atribuições e demonstrou um sentido de responsabilidade, de amparo e de comprometimento para com a população que vive no seu ambiente envolvente. Efectivamente, o tempo e a dedicação que estes militares, de todos os Ramos, devotaram a esta causa, transcendeu a sua condição de militares.
Senão, vejamos o exemplo do RG3, onde, para lá da “missão” de acolher a população, foi posta em prática uma iniciativa exemplar de criação de uma cresce/infantário para ocupação das crianças acolhidas. De acordo com o Comandante desta Unidade, Coronel Batalha da Silva, “Desde o primeiro momento sentimos a necessidade de criar um espaço para as crianças“. Assim e com recurso aos conhecimentos e experiência de um dos Oficiais da Unidade, com Formação Superior na especialidade de Educador de Infância e ainda com o “saber feminino” de algumas Praças do RG3, bem como com o apoio da Caritas e do Centro de Segurança Social da Madeira constituiu-se uma equipa que tornou possível o funcionamento desta creche. O Comandante desta Unidade ressalta o empenhamento de algumas empresas que, de iniciativa própria e pronta, forneceram alguns dos materiais essenciais para que estas crianças se mantivessem ocupadas. Por exemplo, para as crianças mais crescidas, a ZON prontificou-se a instalar televisões e computadores para as manter activas e entretidas.
Uma nota de apreço para o empenhamento demonstrando pelos militares desta unidade que, através desta iniciativa singular, criaram este espaço improvisado, mantendo as crianças ocupadas por forma a minorar todo o transtorno e constrangimento pelo qual estas famílias tiveram que passar.
Outro exemplo de louvar é a criação, no RG3, de um depósito de géneros de primeira necessidade generosamente ofertados e que têm vindo a ser catalogados num esforço inexcedível de militares desta unidade e de civis voluntários e posteriormente distribuídos em viaturas militares pela Caritas. Podemos também adiantar que ainda existe muito material por distribuir, pois as demonstrações de solidariedade continuam mesmo passado um mês.
O trabalho de equipa tem sido a razão para o sucesso desta operação. Uma vasta equipa de peritos, das mais diversas áreas, tem tornado possível este esforço conjunto de recuperação. A Caritas tem-se revelado a impulsionadora de várias actividades essenciais como angariação de contribuições quer materiais, quer financeiras, assim como na criação de uma rede de voluntários para colaborar nas muitas tarefas necessárias e que incluiu desde a população local, aos Escuteiros, até a Psicólogos e Educadores de Infância – alguns vindos do Continente. Para ilustrar esta azáfama, o Coronel Batalha da Silva referiu que nos primeiros dias após a tragédia, chegaram a passar pelo Regimento um total de 400 voluntários/dia.
Nesta equipa multidisciplinar de profissionais envolvidos na gigantesca operação que foi criada para colaborar com a população madeirense, o Comandante do RG3 releva a presença essencial das várias Instituições e Organizações que, em conjunto com o Exército, continuam a levar a bom porto esta missão. Por um lado, a Caritas Diocesana e o Centro de Segurança Social da Madeira por outro a Câmara Municipal do Funchal e os Investimentos Habitacionais da Madeira. “A solidariedade e a cooperação entre o Exército e estas organizações foi fantástica!“, afirma.
Esta cooperação e solidariedade para com a sociedade civil a que assistimos com exímio desempenho pelos três Ramos da Forças Armadas promovem a Imagem da Defesa Nacional e reforçam a credibilidade das Forças Armadas na opinião pública. Estas acções demonstram a vertente institucional de Responsabilidade Social que as Forças Armadas têm vindo a desenvolver, permitindo solidificar um caminho alinhado com as políticas praticadas internacionalmente no que respeita a este tipo de estratégias e promover o desenvolvimento sustentável.
Há que continuar e há que as divulgar! A Defesa deve comunicar, deve interagir com a sociedade, com a opinião pública na procura de uma reciprocidade, de uma cumplicidade para as suas decisões.
Não havendo ainda uma definição estabelecida, consensual, sobre o que significa ser uma Organização Socialmente Responsável, parece evidente a importância e necessidade do trabalho estratégico das Relações Públicas para a cristalização do conceito, bem como na sua disseminação por todos os públicos. Este artigo pretende também evidenciar a importância estratégica das Relações Públicas, quer ao nível interno da empresa, quer da empresa para o exterior, tendo sempre em atenção os stakeholders (5) e os conflitos de interesse que por vezes podem existir entre eles.
Urge a necessidade de comunicar eficazmente, transmitindo de modo assertivo a informação, de modo a influenciar positivamente os cidadãos para as políticas que se advogam. O apoio dos cidadãos é parte fulcral da comunicação governamental, que tem em vista a notoriedade e popularidade. É necessário comunicar e dar a conhecer os projectos e políticas que as instituições governamentais defendem.
Os governos que apregoam a democracia devem exercer o diálogo com a sociedade, devem interrogar os anseios e felicidades da população e com isso construir um caminho sustentado em políticas de interesse mútuo. As sondagens poderão servir de bitola para aferir esse grau de satisfação da opinião pública, bem como poderão ajudar a definir estratégias a implementar, mas para a promoção das políticas de cidadania que abarquem os desejos dos seus eleitores, tem que existir diálogo e comunicação.
O relacionamento transparente das empresas com a sociedade no seu todo, promoverá um melhor entendimento com as empresas concorrentes e os stakeholders promoverão um fluxo de imagem positiva se a sua política de Responsabilidade Social for correctamente implementada.
Ao nível dos públicos internos, a estratégia a implementar deverá seguir a linha da sensibilização para a participação. Cabe também à organização gerar condições que promovam a sustentabilidade. Ou seja, promover políticas de equilíbrio entre o trabalhador e a empresa através do acesso à saúde, à formação, etc. O simples facto de promover esse equilíbrio, é já de si, uma boa promoção da Responsabilidade Social.
Perdoem o arrojo de tanto elogiar os nossos militares, mas mesmo tendo em conta que muito do que se relatou faz parte da sua missão e condição militar e mesmo sabendo que deles não se espera outra que não seja a postura de alto profissionalismo que demonstraram, este discurso a que alguns poderão apelidar de laudatório, a nosso entender é-lhes merecido – sem qualquer excepção, seja qual for o seu posto, seja qual for seu o Ramo.
Aproveitemos sim, para enaltecer e reforçar o papel fundamental das Forças Armadas Portuguesas, sensibilizando a opinião pública e incrementando a imagem institucional da Defesa Nacional.
(1) Instituto Ethos
http://www1.ethos.org.br/EthosWeb/pt/31/o_instituto_ethos/o_instituto_ethos.aspx
(2) Comunicado do Conselho de Ministros
http://www.portugal.gov.pt/pt/GC18/Governo/ConselhoMinistros/ComunicadosCM/Pages/20100222.aspx
(3) MDN/Sala de Imprensa/Notícias
http://www.mdn.gov.pt/mdn/pt/Imprensa/noticias/20100223_FA_apoiam_Madeira.htm
(4) Comunicados do Estado-Maior-General das Forças Armadas
http://www.emgfa.pt/pt/comunicados/2010-02
(5) O conceito de stakeholder é repetidamente utilizado como sinónimo de público –
(Freeman, E. R. (1984), Strategic Management – a Stakeholder Approach, Pitman, Boston)
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