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OS FLECHAS

Por • 25 Mar , 2017 • Categoria: 08. JÁ LEMOS E... Print Print

Os Flechas, a tropa secreta da PIDE/DGS na guerra de Angola”, aborda não só aspectos até agora nunca publicados em Portugal sobre estas forças de tipo militar como vai bem além disso, descreve grande parte da actividade desenvolvida pela PIDE/DGS na antiga África portuguesa no combate à subversão, e dá ainda importantes contributos para que se perceba o que são as “informações” em tempos de guerra.

O autor, Fernando Cavaleiro Ângelo, oficial da Marinha Portuguesa no activo, dá com esta sua obra um importante contributo para a história da guerra que Portugal travou em África nos anos 60 e 70 do século XX. Aborda uma área que estava até agora muito pouco explorada, a actividade da Polícia Internacional e de Defesa do Estado (1945-1969), mais tarde Direcção Geral de Segurança (1969-1974), no antigo Ultramar, falando-se aqui sobretudo do caso de Angola, mas também com referências a Moçambique e, menos, à Guiné Portuguesa.

Na realidade com a extinção da DGS em 1974 e dado o papel que esta instituição teve na repressão à oposição política ao Estado Novo, raríssimas pessoas se dedicaram no pós-25 de Abril de 1974 ao estudo da sua actividade com profissionalismo e isenção. Os vencedores da revolução e do período que se seguiu fizeram como sempre acontece nestas circunstâncias, a história à “sua maneira”, e o rótulo colado à PIDE/DGS, certamente muitas vezes com razão mas algumas sem ela, impediram um olhar descomprometido sobre esta polícia.

Por outro lado, se os ramos das Forças Armadas começaram a fazer, a escrever – cada um por si – a sua própria história da guerra no Ultramar, e se gradualmente começaram a disponibilizar os seus arquivos (e muito bem!) para investigadores privados – a maioria vindos das universidades onde a História do século XX é (era?) sobretudo estudada por “gente de esquerda”, com um olhar próprio sobre aquela guerra em particular – tudo o que não cabia nas actividades da Marinha, Exército e Força Aérea, apenas era marginalmente referido. Assim, quer por via institucional quer por via de privados, havia aqui uma área que estava muito deficientemente estudada.

Não deixa aliás de ser curioso, talvez a palavra certa até seja incrível,  que o primeiro livro especificamente sobre os Flechas tenha sido escrito e publicado no estrangeiro! (*)

Surge agora esta obra, fundamentada em investigação que está meticulosamente referida na bibliografia e, não menos, por via de entrevista com o criador dos Flechas, Inspector Óscar Cardoso, que aliás assina o Prefácio e é abundantemente citado no texto. O livro é no entanto, na nossa leitura, bem mais do que uma obra sobre os Flechas, é um trabalho abrangente sobre a PIDE/DGS na guerra do Ultramar, e os Flechas têm isso sim lugar de destaque.

Não se julgue que o autor vem aqui pura e simplesmente “defender” a PIDE/DGS, o que vai escrito, se por um lado é elogioso para os Flechas perante a actividade operacional que desenvolveram – e ela é referida quer de modo genérico ao longo do livro quer depois em casos concretos e com mais detalhe nos capítulos 4 e 5 – e até em muitos aspectos do trabalho dos funcionários da polícia política no apoio às operações militares, também tem em consideração opiniões negativas sobre a actividade da PIDE/DGS nesse mesmo apoio, e avaliações nem sempre simpáticas sobre questões organizacionais e de comando e controlo.

Mesmo que o impacto da actividade dos Flechas na conduta geral da guerra não seja de avaliação fácil, a realidade é que sendo desenvolvida por efectivos muito reduzidos, foi significativa em determinados momentos e locais. Por outro lado, não deixa de ser notável, do nosso ponto de vista, que não sendo a PIDE/DGS uma organização militar (mesmo que a generalidade dos seus membros tivessem passado pelas fileiras), os seus agentes e sobretudo alguns inspectores, conseguissem por de pé estas “unidades” e conduzissem os seus “militares” (habitantes locais, dotados de características muito especiais) naquele conflito, sem qualquer outra formação prévia que não a adquirida “fazendo”, no teatro de operações.

Uma pequena nota, que em nada desvaloriza a obra, é apenas uma opinião sobre um detalhe que até pode ter sido meramente “comercial”. A designação “tropa secreta” não nos parece muito adequada, afinal de contas os Flechas andavam fardados, sabia-se perfeitamente quem eram, onde estavam aquartelados, e participavam em paradas militares, públicas, com outras forças militares portuguesas, eram motivo de reportagem em revistas da época.

Estão de parabéns o autor Fernando Cavaleiro Ângelo e a editora Casa das Letras, “Os Flechas, a Tropa Secreta da PIDE/DGS na Guerra de Angola”, deram um excelente contributo para a história militar de Portugal em África.

Como é habitual nestes nossos comentários, deixamos aos leitores a ficha técnica da obra e o índice.

A edição é da Leya, Casa das Letras, ISBN 978-989-74-1657-6, lançada Fevereiro de 2017 e um preço no mercado de 17,00€.

(*) The Flechas: Insurgent Hunting in Eastern Angola, 1965-1974, de John P. Cann, Editora Helion & Company, Limited, série Africa@War, Reino Unido, 2013.

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