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INFORMAÇÕES E SEGURANÇA NACIONAL: A VERTENTE MILITAR

Por • 28 Mai , 2009 • Categoria: 02. OPINIÃO Print Print

A sensível área das Informações é aqui abordada, com frontalidade e grande liberdade intelectual, pelo Coronel (Reserva) Gil Prata, um  profundo conhecedor do assunto, com o qual lidou parte significativa da sua carreira, em vários níveis hierárquicos e em diferentes forças e serviços de segurança. Aqui ficam as suas fundamentadas opiniões sobre o papel das Forças Armadas nesta vertente da Segurança Nacional.

Tivemos oportunidade de assistir a um Colóquio versando o tema “Segurança Nacional e Direitos Fundamentais”, que decorreu nos dias 14 e 15 de Maio, no auditório novo da AR e promovido pela Faculdade de Direito da Universidade Nova de Lisboa.
Pela pertinência do tema e até pela qualidade dos oradores, o Colóquio prometia. Dividiu-se em quatro painéis: um dedicado às Forças Armadas e aos militares; outro dedicado às Forças de Segurança; um ainda dedicado à Investigação e Processo Penal; e por fim, um dedicado aos Serviços de Informações.
A generalidade das intervenções foi de excelente qualidade. No entanto, não podemos deixar de tecer alguns considerandos relativos à apresentação do sub tema “Forças Armadas, sua actividade de informações e segurança nacional” porque, do que se falou, pouco foi dito sobre as Forças Armadas e a sua actividade.

As Forças Armadas têm actividade relevante na área das informações

As Forças Armadas têm actividade relevante na área das informações, muito fruto da experiência do passado e dos contactos internacionais (na foto o Centro de Operações Conjunto do EMGFA).

Estranhámos o facto de não ver escolhido para essa intervenção, dada a importância do Colóquio, alguém reconhecidamente conhecedor do assunto, que facilmente seria encontrado de entre militares ou civis que se dedicam ao estudo desta temática.
Não estranharíamos a escolha de um civil, uma vez que Forças Armadas são um assunto que interessa a todo o Estado e não apenas aos seus elementos. No entanto, esperávamos um melhor esclarecimento sobre a importância da actividade de informações para cumprimento da missão das Forças Armadas, enquanto instrumento da segurança nacional. E isso não aconteceu.
No Colóquio ouvimos coisas que não esperaríamos ouvir. Referências que não correspondem à realidade, do tipo: as Forças Armadas operam numa lógica de corporativismo; a actualidade demonstrou que não precisa de respostas musculadas, pelo que o aparelho securitário responde às situações e de modo mais barato; e, ainda, que a Divisão de Informações Militares (DIMil) das Forças Armadas não está integrada no SIRP porque estas “só” precisam de informações que garantam a segurança militar e as necessárias ao cumprimento das suas missões específicas. Durante o Colóquio iríamos ainda ouvir referir a fragilidade de as Forças Armadas não possuírem um Quadro especial de informações, como se por isso perdessem importância na comunidade das informações.

Ora, todos estes comentários trouxeram-nos à memória a nossa discordância relativamente ao figurino adoptado em 2004 para o sistema de informações e à forma de participação nos trabalhos preparatórios da elaboração da Lei-quadro. Estas e outras razões levaram, aliás, o autor destas linhas a solicitar à tutela a cessação de funções de direcção que exercia num dos Serviços de Informações (SI’s).
Não vimos, em 2004, qualquer participação militar na elaboração da lei-quadro do SIRP. O projecto não nos foi facultado, talvez pela nossa qualidade de militar, apesar das funções que desempenhávamos. Ficámos com a nítida impressão que se pretendia confrontar os militares com uma situação consumada de exclusão na actividade de informações no âmbito do SIRP. Ouvimos, nessa altura, a “conhecedora e esclarecedora” afirmação de um alto responsável dos Serviços de que as informações das Forças Armadas se reduzem à contagem de espingardas do inimigo para comparar potencial. Era este, e parece que continua a ser, o conhecimento e opinião de “entendidos” sobre a actividade de informações militares no nosso País.
Torna-se assim pertinente, dada a falta de conhecimento sobre a actividade das Forças Armadas e das missões que lhe estão cometidas, esclarecer a importância das informações para o cumprimento daquelas.
Apesar da elevada qualidade técnica dos funcionários dos SI’s – que durante alguns anos tivemos a honrosa oportunidade de comprovar -, não reconhecemos actualmente, por força da alteração legal, capacidade nem conhecimento nestes Serviços para produzirem informações que sejam de utilidade para as Forças Armadas cumprirem as suas missões. De facto, estes mesmos Serviços parecem esquecer-se que as Forças Armadas têm sido nos últimos anos, que já não são poucos, um verdadeiro, se não o mais importante, instrumento da política externa nacional.

As Forças Armadas Portuguesas estão há quase duas décadas em missões internacionais, adquirindo conhecimento das realidades no terreno de muitas das regiões mais conturbadas do globo.

As Forças Armadas Portuguesas estão há quase duas décadas em missões internacionais, adquirindo conhecimento das realidades no terreno em muitas das regiões mais conturbadas do globo.

Passaram 16 anos desde o início da primeira missão das Forças Armadas portuguesas na contribuição nacional para a Paz, grande parte dessa contribuição em teatros de operações complexos como a ex-Jugoslávia, Kosovo, Timor, Afeganistão e Líbano. Este facto aumentou o prestígio de Portugal a nível internacional e levou à modernização das nossas Forças Armadas. Todas estas missões “musculadas” são próprias de forças militares pelo risco que acarretam, pelo perigo a que os seus elementos estão sujeitos e pela utilização da força, se e quando necessário. Por isso, não podem ser cometidas às polícias, como o orador parecia sugerir.
Ora, no Colóquio ficou a ideia de que a actividade de informações das Forças Armadas carece de relevância estratégica, tendo cariz eminentemente “táctico”. O que contraria a doutrina no conhecimento da Estratégia enquanto instrumento da Política.
As Forças Armadas não actuam somente em situação de conflito, mas igualmente em apoio à actividade de diplomacia como forma de resolução de conflitos. A actuação das Forças Armadas, e necessariamente a sua actividade de informações, não se exerce apenas ao nível táctico mas também operacional e estratégico, o que é elementar ou uma evidência lapalissada para qualquer militar ou interessado nesta matéria.
Para a produção da informação necessária ao cumprimento das missões das Forças Armadas, os órgãos de pesquisa e produção de informações mais adequados são os militares e as suas unidades, porque são esses que desde o início da sua carreira se especializam em informações, tratam informações, planeiam o esforço de pesquisa das informações necessárias, estudam a situação de informações, e depois aplicam e avaliam nos teatros de operações as informações produzidas.
Ao contrário do que também foi referido no Colóquio, os militares conhecem a actividade de informações. Para além de generalidades sobre informações, não se vê nas escolas ou faculdades nacionais formação nesta área mas, nas escolas de formação de graduados, nas Academias militares, no Instituto de Estudos Superiores Militares e nas Unidades militares, as Informações constituem matéria sempre presente em todas as acções de formação, em todo o planeamento militar e em todas as missões e exercícios em que participam as Forças Armadas.
Isto é, a actividade de informações é inerente à natureza e actividade do militar. Assim, aquelas, que têm por missão garantir a defesa militar do país, não podem dispensar o conhecimento completo e oportuno sobre actividades de potenciais ou confirmados agentes de ameaça, nomeadamente a sua capacidade militar, organização, dispositivo, possibilidades, intenções e probabilidades de agir. Este conhecimento está além da táctica, situando-se no âmbito da Estratégia. Logo, o planeamento militar para fazer face a estas ameaças situa-se no âmbito da estratégia: daí chamar-se planeamento estratégico.

Muitos meios das Forças Armadas têm capacidade comprovada de recolha de informações

Muitos meios das Forças Armadas têm capacidade comprovada de recolha de informações, muitas vezes usados em missões de cooperação militar e policial internacional.

Devem as Forças Armadas estar dependentes de outros Serviços que lhes forneçam este conhecimento? Nem em teoria, mas muito menos na prática, têm esses Serviços capacidade para o fazer. Só quem tem uma ideia mítica dos Serviços de informações existentes o poderá pensar.
Informação sobre composição geral das forças da ameaça, militares ou não, estruturas de comando, tipo de forças, capacidade tecnológica e electrónica, capacidade de produção ou de detenção de armas de destruição massiva, geografia militar (nomeadamente sobre áreas de desembarque marítimo ou aéreo, portos, aeroportos e aeródromos, eixos e vias de comunicações rodoviárias, ferroviárias e fluviais), de capacidade de transporte e de comunicações do agente da ameaça, bem como da capacidade produtiva existente ou latente para produção de armamento, é matéria de conhecimento imprescindível às Forças Armadas. Além do que ficou dito, para conhecer as intenções da vontade hostil, é necessário conhecer-se também a identidade e o perfil de quem detêm o poder de usar a força contra nós.

Os militares em operações internacionais usam muitas vezes tecnologia de ponta colocada à sua disposição pelas organizações internacionais onde estão inseridos

Os militares em missões internacionais de âmbito NATO usam muitas vezes tecnologia de ponta colocada à sua disposição pelas forças multinacionais onde estão inseridos.

As Forças Armadas são também parte activa na revolução das tecnologias de informação e das comunicações, na nova era digital. Têm de compreender e agir em ambiente estratégico de Guerra de Informação, pelo que têm de ser capazes de dominar a gestão da informação para anteciparem acções e protagonizarem a iniciativa. Não há ambiente operacional sem que haja capacidade de empreender actividades de guerra electrónica que garantam o uso do espectro electromagnético e dificultem o seu uso por forças adversas. Para isso é indispensável a existência e operacionalização de um sistema de informações militares.
Estão os teorizadores do actual paradigma de informações convencidos que as nossas Forças Armadas devem estar excluídas deste saber?
Este conhecimento não está no âmbito da táctica militar. Relembremos então algumas noções sobre o que é, doutrinariamente, a Estratégia.
Até ao último quartel do século XIX a distinção entre política e estratégia era relativamente clara, pois a política fixava os fins a atingir e a estratégia determinava os seus próprios objectivos com vista a alcançar os objectivos finais impostos por aquela. A política obtinha os meios destinados à coacção militar e a estratégia utilizava-os e conduzia a manobra. O objecto da estratégia era, então, a guerra.
O que veio tornar aquela distinção teórica menos clara foi a inclusão de outros meios de coacção – para além da coacção militar – e a extensão do seu objecto aos conflitos em geral, independentemente do seu tipo, e às situações de crise.
Assim, a Estratégia deixou de interessar unicamente às Forças Armadas, passando a dizer respeito, também, a praticamente todos os sectores da actividade governamental, cujos esforços contribuem para uma das várias componentes especializadas da Estratégia integral.
O desenvolvimento do Direito Internacional veio criar maior propensão dos actores da comunidade internacional para a utilização de meios alternativos à violência para resolução dos seus conflitos. A indisponibilidade dos Estados para assumirem e sustentarem pesados aparelhos militares, bem como uma opinião pública adversa à perda de vidas humanas em conflitos armados, tem provocado uma retracção na aplicação de estratégias militares. No entanto, seria utópico admitir o sucesso do emprego de meios diplomáticos sem a complementaridade de um instrumento militar credível.
Face a esta situação, é realista a afirmação de que o instrumento militar perdeu importância no âmbito das relações internacionais? Pensamos que não.
O encerramento do capítulo da Guerra Fria criou condições para a eclosão de tensões acumuladas, essencialmente sob a forma de radicalismos de natureza étnica e de fundamentalismos religiosos. A instabilidade resultante tem conduzido à emergência de crises que o diálogo e a cooperação não conseguem dirimir e para as quais se mostra muitas vezes necessária a intervenção da comunidade internacional. Esta intervenção traduz-se em acções, nomeadamente de natureza diplomática e militar, no sentido de evitar que tais crises degenerem em conflitos.

Os militares portugueses têm um bom conhecimento da realidade que se vive em muitos países onde Portugal mantám acções de cooperação

Os militares portugueses têm um bom conhecimento da realidade que se vive em muitos países onde Portugal mantém acções de cooperação técnico-militar.

O aumento deste tipo de conflitualidade e a sua complexidade veio assim dar relevo à política da prevenção e da gestão de crises e às operações de apoio à paz, no sentido de prevenir a sua eclosão ou circunscrever a área do conflito e evitar a sua escalada.
Vários são os meios pacíficos que podem ser usados pelas partes ou por terceiros na resolução de conflitos. A melhor forma de levar a cabo uma acção de prevenção é no quadro do Capítulo VI da Carta. Neste sentido, os meios – negociações, investigação, mediação, conciliação, arbitragem, resolução por via judicial ou outros meios pacíficos – enunciados no Artigo 33º da Carta constituem os instrumentos da Diplomacia Preventiva. Há também que reconhecer que certas medidas tomadas ao abrigo do Capítulo VII da Carta, tal como as sanções, podem ter um importante efeito dissuasor.
No entanto, as acções de diplomacia preventiva e de estabelecimento da paz só terão alguma hipótese de sucesso se partirem do pressuposto de que haverá, sempre que necessário, a disponibilização de um instrumento militar credível. Esta credibilidade é proporcionada pela simples ameaça de recurso a aparelhos militares de Estados-membros, sem que seja necessário recorrer, em última instância, ao uso da força.
Esta postura da diplomacia conduz a uma estreita ligação entre a diplomacia e o instrumento militar. As nossas Forças Armadas têm apoiado a acção diplomática, com maior visibilidade desde 1992, no conjunto de iniciativas da política externa do Estado, em tempo de paz e fazendo face a conflitos, no âmbito das alianças político-militares de que Portugal é membro, no âmbito das Nações Unidas e no âmbito da cooperação técnico-militar com Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa.
Porém, o direito internacional não tem conseguido evitar os conflitos armados. Assim, apesar do desenvolvimento dos instrumentos diplomáticos e do reforço da sua importância na prevenção e resolução pacífica de conflitos, os instrumentos militares não perderam a sua importância no âmbito das relações e da política internacionais.
A diplomacia e a estratégia são dois dos instrumentos e técnicas utilizadas para a execução da política externa de um Estado. Na estratégia releva o recurso à coacção e esta resulta do emprego, ou ameaça de emprego, da força, podendo ser exercida por acção psicológica, acção diplomática, acção clandestina, acção económica e acção militar.
Segundo Raymond Aron, a distinção entre a diplomacia e a estratégia é relativa. Os dois termos denotam aspectos complementares da arte única da política – a arte de dirigir o intercâmbio com os outros Estados em benefício do interesse nacional. Na verdade, a estratégia, que por definição orienta as operações militares, não tem uma função fora do teatro militar; por sua vez, os meios militares, são um dos instrumentos também utilizados pela diplomacia.
Como meios violentos da política externa existem a dissuasão, a ameaça, a guerra económica, a pressão militar e, por último, a guerra. O tipo de meio violento da política externa por excelência é o uso da força militar de um Estado contra outro Estado, ou seja, a guerra.
A intervenção dos SI’s é necessária em todas as fases do estudo e resolução das ameaças, das crises e das agressões e também para o emprego de qualquer tipo de coacção. Desde logo, na percepção ou detecção daquelas colaborando na determinação das vulnerabilidades do Estado e, a partir destas, na avaliação dos riscos que tais vulnerabilidades representam. Levanta as possibilidades de acção que os agentes da ameaça possam empreender contra a segurança nacional e as suas prováveis intenções.
Os SI’s concebem os cenários de ameaças previsíveis e orientam depois o seu esforço de pesquisa no sentido de alertar ou detectar o mais cedo possível a eventual concretização da ameaça. Este trabalho é desenvolvido através da escolha de indicadores e da obtenção de indícios que, depois de interpretados, permitam definir o contorno da ameaça.
Configurada a ameaça os SI’s avaliam-na determinando o grau de perigo que representa a sua concretização e o grau de probabilidade disso acontecer. Conclui-se a avaliação com a estimativa do risco para a nossa segurança. Os SI’s colaboram ainda na elaboração de planos de contingência face às possibilidades enumeradas.

Ora, a tomada da decisão ao nível das chefias militares faz-se no âmbito da estratégia militar e, para o efeito, são necessárias informações militares estratégicas que permitam desenvolver esse processo de decisão. Isso foi entendido em 1984 por quem concebeu inicialmente o sistema de informações nacionais e apenas questões de conjuntura interna atrasaram essa implementação. Na altura a DINFO preenchia o vazio e continuava a exercer a actividade de informações, por razões que se prendem com a história recente, também na área da segurança interna.
Já depois da criação do serviço de informações externas, que abrangia teoricamente a recolha de informações também de natureza militar, verificou-se que esse Serviço não atingiu verdadeiramente essa capacidade, e nas saídas de oficiais de informações que se sucederam, eram essencial ou maioritariamente os militares que eram afastados, com consequentes reorganizações internas nesse sentido.
Quem poderá afirmar agora, em consciência, que as Forças Armadas e as forças de segurança podem ou devem estar afastadas deste estudo, precisamente se são estes os principais actores na resolução das ameaças e quem melhor as conhece?
Acresce, ainda, que os SI’s colaboram no desenvolvimento de actividades de contra-informação, procurando negar ao agente da ameaça o conhecimento das nossas vulnerabilidades, das nossas capacidades e das nossas intenções, criando-lhe a incerteza quanto às consequências da concretização da ameaça e do impacto dos seus efeitos. Se as ameaças passarem a agressão, os SI’s desempenharão um papel fundamental na definição da estratégia de resposta e na avaliação dos efeitos operacionais desta para reajustamento e reanálise das ameaças e dos planos de contingência.
Por tudo isto, as Forças Armadas, mas também as forças de segurança, têm um papel fundamental e imprescindível na actividade das informações e não se compreende que assim não tenha sido entendido quando se alterou o paradigma das informações nacionais.
A Lei-quadro do Sistema de Informações da República Portuguesa estabelece que, no que respeita a Informações militares, o disposto nessa lei não prejudica as actividades de informações levadas a cabo pelas Forças Armadas e necessárias ao cumprimento das suas missões específicas e à garantia da segurança militar.
A lei orgânica do EMGFA, estabelece que a Divisão de Informações Militares (DIMil) presta apoio de Estado-Maior no âmbito das informações e da segurança militares ao CEMGFA e que lhe compete a produção de informações necessárias à avaliação permanente das ameaças à segurança militar.
Ora, esta restrição da produção de informações à área da segurança militar constitui um constrangimento legal à produção das informações necessárias ao cumprimento da sua missão que, como já vimos, não se restringe apenas ao âmbito da táctica. E para cumprimento das suas missões específicas falta às Forças Armadas a valência da pesquisa de informações a qual, dada a natureza classificada da informação militar, não terá certamente a Internet como fonte privilegiada.

A formação nas mais diferentes áreas do conhecimento ligado às informações é uma constante

A formação nas mais diferentes áreas do conhecimento ligado às informações é uma constante nas Forças Armadas.

Há ainda quem afirme a vulnerabilidade técnica das Forças Armadas na área de informações alegando que aquelas não dispõem de técnicos com uma “carreira”de informações. A isso podemos responder que as Forças Armadas portuguesas não necessitam de um Quadro especial nos Ramos, constituído por oficiais e sargentos de informações, para garantir a produção de informações militares. Não necessitaram antes, nem durante os 13 anos de guerra em África combatendo em três Teatros de Operações, onde as informações foram fundamentais e em que os militares demonstraram a sua elevada competência técnica. Esta capacidade permitiu ainda que garantissem com exclusividade a recolha de informações internas e externas até à criação do SIRP, num período em que o país se debateu com acções de terrorismo doméstico. A actividade dos operacionais da divisão de informações militares foi fundamental no combate às forças que protagonizaram essas acções de terrorismo.
Assim, se fosse sentida a necessidade desse Quadro especial teriam sido as próprias Forças Armadas a providenciar pela sua criação, pois dispõem dos recursos e do “saber fazer” para o efeito. Verificamos que a ausência de um quadro especial de informações tem sido a regra comum às Forças Armadas dos diferentes Estados, com a excepção de um mínimo de Estados cuja importância da intervenção do aparelho militar na política externa o aconselha.
No entanto, enquanto que ao SIED e ao SIS, para cumprimento das suas atribuições, a lei estabelece que lhes cabe promover, por forma sistemática, a pesquisa, a análise e o processamento de notícias e a difusão e arquivo das informações produzidas, o mesmo já não sucede relativamente à produção de informações militares necessárias às atribuições das Forças Armadas, por exclusão destas do Sistema de informações nacionais. As necessidades próprias de um órgão de apoio de Estado-Maior aos Chefes militares no processo da tomada de decisão exigem uma estrutura capaz de lhe fornecer os elementos de informações necessários à elaboração de planos e ordens de operações, bem como aos estudos de situação e ao restante planeamento estratégico.
A Lei orgânica do SIED e do SIS estabelece que o SIED é o único organismo incumbido da produção de informações que contribuam para a salvaguarda da independência nacional, dos interesses nacionais e da segurança externa do Estado Português, e que o SIS é o único organismo incumbido da produção de informações destinadas a garantir a segurança interna.

As capacidades das Forças Armadas e das Forças de Segurança, sejam de "acção directa" seja na área das informações, estão cada vez menos dependentes de fronteiras

As capacidades das Forças Armadas e das Forças de Segurança, sejam de "acção directa" seja na área das informações, estão cada vez menos dependentes de fronteiras.

Ora, esta redacção demonstra, na nossa opinião, que esta conceptualização tornou o paradigma das informações nacionais desajustado da realidade, o que seria já previsível no momento dos trabalhos preparatórios à sua elaboração.
É que, atendendo ao conceito de segurança interna e na área abrangida por esta, não é apenas o SIS que produz informação necessária para a garantir e nem sequer a que produz é a mais relevante. Assim como, na área da defesa e segurança externas também não é o SIED quem está em melhor posição para produzir essa informação e é irrealista pensar-se que as Forças Armadas devem estar afastadas da produção dessa informação.
Na nossa opinião – alicerçada na experiência obtida no exercício de funções de direcção e chefia em repartições de informações em Unidades militares e também policiais, bem como nos dois serviços de informações nacionais -, a evolução que tem seguido o paradigma das nossas informações, já no início criado com algumas deficiências, é contrária ao que a realidade exigiria.
A tendência não deverá ser no sentido da sua concentração e reforço de instrumentos ou meios de difícil controlo e fiscalização, com elevado risco de atentarem contra os direitos fundamentais, mas sim de trazerem à actividade de informações os organismos com atribuições na área da segurança nacional e sobre cujas actividades e meios empregues é já exercido controlo adequado.
Ao contrário do que alguns dizem e escrevem, não há falta de controlo da actividade policial, até porque a sua actividade é também, no âmbito da investigação, tutelada funcionalmente pelas autoridades judiciárias (Ministério Público e Juiz de instrução criminal) e a sua validade está subordinada à Constituição e à lei. Pelo contrário, na nossa opinião, existe um risco de deficit de controlo da actividade dos SI’s, assim como na avaliação da mesma e dos seus resultados.

Será possível desperdiçar o manancial de conhecimento que os militares - cada vez mais, note-se! - têm sobre o que se passa onde Portugal tem interesses?

Será possível desperdiçar o manancial de conhecimento que os militares - cada vez mais, note-se! - têm sobre o que se passa onde Portugal tem interesses?

As Forças Armadas são quem em melhor situação se encontra para produzir informações externas que abranjam as actividades que legalmente se enquadram no conceito de defesa nacional. São elas que dispõem, pela natureza das suas missões, de recursos humanos e materiais, de conhecimento e da qualidade necessária. O que, como já dissemos, não significa que esta produção de informação deva ser exclusiva das mesmas.
Aliás, o conceito de exclusividade nasceu para separação das águas entre as actividades dos serviços de informações internas e os serviços de informações externas – o que até agora, diga-se, ainda não foi totalmente conseguido. Depois evoluiu no sentido de excluir outros Organismos dessa actividade.
Talvez seja altura para se reflectir nas palavras do antigo Ministro da Justiça e também antigo Provedor de Justiça, Dr. Meneres Pimentel, quando se pronunciou sobre a existência dos serviços de informações.
Na próxima oportunidade faremos uma nova reflexão, mas dessa vez relativa à actividade de informações na área da segurança interna.

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