Depois de no artigo anterior sobre o exercício VALE DO KEVE 2014 das Forças Especiais da SADC, Southern African Development Community, a Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, termos falado de aspectos gerais e operacionais, hoje abordamos as inovações relativas à Logística, que não foram poucas, e apresentamos a nossa conclusão.
11 de Setembro de 2014. Cerimónia de encerramento no Campo Militar de Kisanga Kungo, junto a Waku-Kungo a 400km de Luanda. A bandeira da SADC, em segundo plano, seria aqui entregue às Forças Especiais do Zimbabwe, que organizarão a edição 2015 deste exercício.
A logística, factor determinante
Este exercício decorreu em Agosto e Setembro de 2014 e ocupou cerca de 44 dias – na Europa é raríssimo um exercício com esta duração – e mais tempo ainda para o pessoal do chamado “apoio real”. Pouco vulgar também a infra-estrutura que foi montada para o exercício e que significou um salto qualitativo enorme em Angola. Foi construído um aquartelamento de campanha, muito semelhante ao que seria para uma missão de manutenção de paz real, com todas as valências habitualmente instaladas nessas circunstâncias. Apenas com pouca protecção mas isso naturalmente tornaria a sua construção muito mais dispendiosa. O “Campo Militar de Kissanga Kungo” (nome da comuna nas imediações da cidade de Waku-Kungo, município de Cela), ocupou uma área de 800x1000m, junto ao aeroporto local e estava organizado em 6 áreas principais: porta-de-armas; direcção, posto de comando e estado-maior; força tarefa; apoio real; apoio logístico; enfermaria. E ainda outras como parque de viaturas, oficinas e combustíveis, reservatórios de água, apoio aeroportuário e parada. As principais infra-estruturas implantadas foram: iluminação; captação e tratamento de água (vinda do rio Keve); fossas para balneários e WC contentorizados; porta-de-armas, vedação periférica; montagem de mais de 50 “shelters” para diversas finalidades dos postos de comando, às camaratas, passando por refeitórios e enfermaria; instalação de contentores frigoríficos, padaria e lavandaria e cozinhas de campanha. Uma base para mais de 1.000 militares em permanência esteve assim a funcionar, com electricidade, alimentação e água sem problemas de maior, telefones e internet em alguns locais onde os sistemas de comando o controlo da operação o tornavam necessário.
Angola, como nação hospedeira, apoiou também os participantes no exercício durante toda a sua estadia no país, antes e depois do exercício propriamente dito e proporcionou mesmo, alguns momentos de turismo e visitas culturais em Luanda – por exemplo ao Museu Nacional de História Militar – e em vários outros locais. Quase todos os países vieram para o exercício via terrestre, sendo notória a grande capacidade logística de países como a África do Sul e a Namíbia, os quais dispunham de meios claramente adaptados a este tipo de actividade.
Porta-de-armas do Campo, guarnecida por elementos do Regimento de Policia Militar.
“Shelters” da Direcção do exercício e do Estado-Maior. Estes materiais, de origem USA, permitem boas condições de habitabilidade e podem estar montados grandes períodos de tempo. Desde que devidamente mantidos podem estar em serviço por muitos meses ou mesmo anos, sendo portanto adaptados a missões de longa duração.
O campo tornou-se uma autêntica “base militar”, com áreas bem definidas (ver fotos aéreas no final do artigo), e todas as condições necessárias a uma estadia prolongada. Aqui viveram em determinados períodos mais de 1.700 militares.
A enfermaria, felizmente pouco usada tinha área de tratamentos e de internamentos. Sendo depois do Estado-Maior e do refeitório principal, o maior “shelter” do campo.
Um refeitório, com condições exemplares para a finalidade a que se destinava…
…e onde as três refeições diárias eram servidas com profissionalismo.
Mais uma novidade nos exercícios militares em Angola: padaria. Todos os dias milhares de pães acabados de fazer eram fornecidos a todo o campo. Pizzas e bolos também foram confeccionados.
Contentores “casa de banho”, vindos de Portugal, para os quais, por questões ligadas com a protecção do meio ambiente e de bom funcionamento, levaram à construção de fossas.
Este tipo de equipamentos é especialmente adaptado para as missões de apoio à paz de longa duração, permitindo condições de vida iguais ou mesmo melhores que em alguns quartéis.
Outra instalação inédita nestas situações, a lavandaria. Como aliás noutros sectores do apoio real ao exercício, aqui trabalhavam, além de militares, civis contratados localmente.
A FAN projectou para o Waku-Kungo não só os meios aéreos mas também os componentes da logísticas necessários à sua operação por um longo período de tempo.
Conclusão
As FAA ficaram satisfeitas com o exercício, várias lições aprendidas foram recolhidas e é bem possível que muito tenha já sido interiorizada com vista ao empenhamento na Republica Centro Africana, num ambiente multinacional.
Certamente foi também muito útil para o exercício de forças especiais do próximo ano no Zimbabwe. Nos últimos anos o reequipamento das forças especiais angolanas tem sido uma realidade que está patente em novos fardamentos e equipamentos individuais que aliás os distinguem agora da generalidade dos outros militares angolanos, mas também a nível da logística, anteriormente muito incipiente.
A nível operacional duas grandes novidades, a capacidade de projecção de força e o comando e controlo. A introdução do pára-quedismo na BRIFE com cerca de 300 pára-quedistas já formados possibilitou a inclusão desta capacidade no exercício; o sistema de comando e controlo computorizado, sem dúvida mais uma enorme evolução nesta área crítica das operações.
Militar angolano (à esquerda) de uma unidade de elite não integrada na Direcção de Forças Especiais, e namibiano, ambos da componente de apoio médico do exercício.
Elemento das forças especiais da República Democrática do Congo que tem a particularidade de ter recebido formação em Cabo Ledo (Angola), na Escola de Formação de Forças Especiais. Muitos destes militares têm também formação na Republica Popular da China.
Sul-africano de ascendência portuguesa que estava integrado no contingente do seu país e servia também de tradutor. Viveu em Angola antes da descolonização e a sua vida foi objecto de curiosidade pelos OCS locais que o entrevistaram.
Pára-quedista da Tanzânia.
Instrutores de pára-quedismo da Brigada de Forças Especiais (BRIFE). O militar ao centro enverga uma “combinação de voo” da FAN que os militares da BRIFE têm usado quando em funções como largadores (como neste caso por isso o capacete) ou inspectores na área de embarque.
Alguns dos países participantes trouxeram os seus pára-quedas de abertura manual e efectuaram saltos de “queda-livre” para treino e na cerimónia final. Aqui um militar do Zimbabwe…
…e aqui um da Namíbia. Na BRIFE está previsto para 2015 o inicio da formação de um núcleo de saltadores operacionais com material de abertura manual.
As principais sub-unidades operacionais da BRIFE estiveram presentes, nomeadamente os 2 batalhões de comandos e o de operações especiais.
A Companhia de Guarda de Honra composta por comandos da Brigada de Forças Especiais.
O destacamento das Forças de Defesa Nacional da África do Sul, com a particularidade de não usarem o seu armamento regulamentar.
Pára-quedistas da Zâmbia.
Forças Especiais da Namíbia.
O Contingente Nacional do Zimbabwe, que já desfilou com a bandeira da SADC visto ser o próximo organizador deste exercício de forças especiais.
Militares da Policia Militar que zelavam pela segurança do campo mas também pela ordem e disciplina.
O Destacamento da Força Aérea Nacional vai partir para a sua base em Luanda e posa para uma foto final com o Chefe da Direcção de Forças Especiais do EMGFA e com o Comandante da BRIFE que se vieram despedir.
Chegou a hora da partida, este militar de operações especiais exibe o seu “Certificado de Participação”, assinado pelo CEMGFA de Angola. A nível de exercícios militares, em muitos aspectos há sem dúvida um antes e um depois do “Vale do Keve 2014”.
O Campo Militar fotografado no último dia do exercício. merece ser visto em detalhe!
Veja aqui a primeira parte deste artigo: ANGOLA: EXERCÍCIO DE FORÇAS ESPECIAIS, “VALE DO KEVE 2014” (I)