logotipo operacional.pt

A DEMOCRATICIDADE NA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL

Por • 19 Mar , 2015 • Categoria: 02. OPINIÃO Print Print

Muito tem sido dito, comentado e escrito sobre as mediáticas operações “Labirinto” (vistos Gold) e “Marquês” (José Sócrates), levadas a cabo respectivamente, pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC), da Polícia Judiciária, no primeiro caso; e pelo DCIAP, Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) e Polícia de Segurança Pública (PSP).

Policias-PRT-1

… la dualité des forces de police est la garantie majeure de lꞌindépendence de lꞌautorité judiciaire…” (1)

 

Muito tem sido dito, comentado e escrito sobre as mediáticas operações “Labirinto” (vistos Gold) e “Marquês” (José Sócrates), levadas a cabo respectivamente, pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) e pela Unidade Nacional de Combate à Corrupção (UNCC), da Polícia Judiciária, no primeiro caso; e pelo DCIAP, Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) e Polícia de Segurança Pública (PSP), no segundo, o mesmo tendo sucedido com outras operações menos mediáticas, igualmente conduzidas pelo DCIAP e por estes ou outros órgãos de polícia criminal.

Contudo, não vi qualquer menção ao facto destas operações constituírem exemplos do que a doutrina designa por princípio da “democraticidade da investigação criminal”.

Este princípio, bastante estudado em França, diz-nos sinteticamente que o detentor da acção penal, o Ministério Público (MP), deve possuir o poder de, caso a caso, escolher o órgão de polícia criminal (OPC) mais adequado à circunstância concreta, para o coadjuvar na investigação.

Independentemente de haver crimes cuja investigação deverão por regra ser investigados por este ou aquele OPC, em razão da matéria, consequência de determinada especialização ou em razão da proximidade territorial, a norma legal que distribui a investigação criminal pelos OPC não deverá ser uma norma fechada e restrita, mas antes permitir sempre ao titular do inquérito escolher o OPC mais apropriado ao caso concreto, como os exemplos antes referidos bem elucidam.

A especialização ou não de um OPC para a investigação de um determinado tipo de crime não permite classifica-lo de primeira ou segunda categoria relativamente aos demais, nem, como por vezes parece decorrer de algum discurso, autoriza confundi-lo ou equipara-lo à magistratura do Ministério Pública, de quem, para efeitos do processo, todos os OPC estão igualmente dependentes funcionalmente.

Daqui resulta também outra ilação que é a de que o monismo policial, apenas existente num residual número de países, pode constituir-se numa concentração de poder perniciosa e de difícil controlo.

O sistema de equilíbrio de pesos e contra pesos típico das democracias, tem também neste âmbito plena aplicação.

Assim, e embora se considere haver no nosso país uma exagerada multiplicidade de órgãos de polícia criminal, também não deixa de ser positivo que a pluralidade dos mesmos permita a escolha por parte do MP, daquele ou daqueles que são os mais adequados para a investigação do caso concreto e para a consequente coadjuvação do detentor da acção penal, como os exemplos antes referidos bem demonstram, sobretudo quando as investigações possam recair sobre os próprios elementos de um ou outro órgão de polícia criminal.

Estes casos vieram também ilustrar de forma suficientemente clara, como seria prejudicial para a investigação criminal, concentrar todas as intercepções telefónicas ou qualquer outro meio de prova, numa única Polícia.

(1) Cristian Poncelete, presidente do Senado francês, 1999.

Lisboa, 16 de Março de 2015

Carlos Manuel Gervásio Branco, Coronel (Res)

 

"Tagged" como:

Comentários não disponíveis.